Introdução

 

Auto de resistência foi criado na ditadura a fim de justificar a prisão em flagrante de policiais autores de homicídio. Esta figura não é presente na lei, não existe auto de resistência no Código penal Brasileiro, quando é tipificado como auto de resistência não é registrado o homicídio e o grau de fiscalização ainda é baixo, prevalecendo à versão final dos policiais.

Para reduzir esse dano é necessário criar metas de redução da letalidade policial e investigar todos os casos de mortes em ações policiais.

Resistência no Código penal Brasileiro, o artigo 329 do Código penal Brasileiro, reproduz: “opor-se à execução de ato legal, mediante violência ou ameaça a funcionário competente para executá-lo ou a quem lhe esteja prestando auxílio.

Pena – detenção, de dois meses a dois anos.

§ 1º Se o ato, em razão da resistência, não se executa:

Pena – reclusão, de um a três anos.

§ 2º As penas deste artigo são aplicáveis sem prejuízo das correspondências à violência.

É essencial para configuração do crime que o agente use violência física ou ameaça.

Se o guardião da lei não excedendo o limite do indispensável, está praticando o fato em estrito cumprimento do dever legal, que constitui excludente de ilicitude requerida em lei.

O comércio de entorpecentes é uma das atividades econômicas mais complexas e lucrativas do mundo capitalista atualmente, uma característica forte a sua alienação do trabalho produz, mão de obra totalmente adaptada sem seus funcionários possuam a menor idéia do montante do lucro da empresa, quase totalmente formada por jovens que encontra nas armas e nas facções o sentido da vida e o reconhecimento necessário.

Ao entrar em comunidades onde o Estado não se faz presente, observa-se que o crime organizado é exatamente onde existe o menor grau de organização. Os grandes traficantes muitas vezes nunca saíram das favelas e possuem baixo nível escolar. O forte grau de violência e inconseqüência produzido pela insegurança dos jovens compartilha com criminalidade e organização onde a linha entre a vida e morte é tênue, imperceptível tornando-se falsa quando grandes criminosos seriam violentos, lógica apresentada na política penitenciária do Estado.

Os conglomerados urbanos do Rio de janeiro são vitimados por um tráfico opressor e violento onde o Estado só comparece nos conglomerados urbanos com a polícia, nestes conglomerados não se encontra a presença do Estado. A desigualdade de direitos pode ser observada na criminalização da pobreza, a obstrução do princípio da legalidade atua nos conglomerados como motor do poder local no tráfico. Não existe poder paralelo e sim absoluto, com ausência do Estado qualquer questão é resolvida dentro da lógica local.

Demonstrado nos auto de resistência, os laudos elaborados por peritos forense do Rio de janeiro, calcula que 70% dos casos de auto de resistência apresentam tiros na nuca e disparos a curta distância. Existiria por trás dos registros a prática das execuções sumárias?

Uma realidade que atinge diretamente os jovens de conglomerados urbanos e provoca a inversão do ônus da prova, pois do auto de resistência, cabe a família provar que o parente é inocente. A consolida criminalização da pobreza é clara quando os mandados de busca genéricos ou coletivos não especificam endereços ou pessoas e abrange todo conglomerado urbano.

Durante o regime militar, o discurso de segurança pública volta para ameaça comunista e subversismo, no decorrer das décadas verifica-se um forte processo de criminalização dos setores que sobravam da sociedade de mercado. A busca do lucro se faz na esfera da especulação financeira e não no setor produtivo da economia, esse modelo produz a capacidade de romper o poder dos sindicados e no controle do dinheiro. Torna-se forte indício quando há redução de impostos mais altos e restauração de taxas naturais faz da desigualdade social um dinamizador de nossa economia. Conforme afirma Zigmund Bauman, “a pobreza não é mais um exército de reserva de mão de obra, torna-se uma pobreza sem destino, precisando ser isolada, neutralizada destituída de poder”.

O sistema penitenciário atual e sua complexidade revelam a totalidade de nossos presos excluídos economicamente, culturalmente e socialmente refletindo um reflexo da sociedade que o produz, um espelho das nossas contradições, a falta de política para o sistema penitenciário e ausência de gestão Forman exclusão profunda. Investir na capacitação dos profissionais de segurança e técnicos em trabalhos para os detentos, escolas dentro das prisões ou na classificação do preso conforme determina a lei, não são prioridades vistas como medidas que contribuem com a segurança da unidade penal. O crescimento da população carcerária é acompanhado do absoluto caos administrativo.

RESISTÊNCIA

A fuga do não preso é equiparada a fuga do preso, a lei permite o emprego de força para vencer a resistência ou desobediência. A lei relata que não é permitido o emprego da força, a não ser na hipótese explicitamente configurada em lei. A permissão de uma força pressupõe que se trate de prisão legal, na essência e na forma.

A resistência ao ato particular é criminosa, porque importa em resistência à lei e o particular é executor da lei do mesmo modo como autoridade. Exercendo uma função social repressiva qualquer do povo tem o direito de prender o delinqüente em flagrante delito, podendo valer-se com força em direito.

A lei de Execução Penal é uma das leis mais avançadas, apesar de ter sido elaborada em 1984 e necessitando complementações é também a lei mais descumprida de nossa legislação, onde 70% dos Estados da Federação separam os presos por facções criminosas e excluem formas de inserção, as prisões consolidam como instrumentos de solidificação da exclusão executando o preso a pena de morte social.

As facções representam o elo entre conglomerados urbanos e as prisões, diante da ausência do Estado, esses grupos exercem o poder local violência e tensão permanente. Compostos por jovens que nunca conheceram uma realidade diferente daquela oferecida. A inserção das formas nos grupos criminosos representa somente a possibilidade de uma vida mais viável economicamente.

Dentro das prisões estas facções são fortalecidas e continuam mantendo o controle absoluto.

RELAÇÃO ENTRE HOMICÍDIO RENDA E DESIGUALDADE

No Brasil, Paixão (1988) questiona a influência da renda sobre o crime, com base no fato de que a melhoria dos indicadores sociais no País ao longo dos anos tem sido acompanhada por um aumento da criminalidade. Na mesma linha, Beato & Reis (2000) mantêm que o vinculo entre pobreza e criminalidade continua a receber apoio na comunidade das Ciências Sociais do Brasil, apesar de suas “expressivas inconsistências teóricas e insuficiência empírica”. No entanto, sua própria pesquisa, comparando municipalidades no estado de Minas Gerais com uma técnica de “bootstrapping”, mostra uma significativa correlação negativa entre a taxa de “crimes contra pessoas” e o índice de desenvolvimento humano (IDH) das Nações Unidas (constituído por renda, expectativa de vida ou moralidade infantil e educação).

Há duas fontes principais de dados relativos a homicídios, o Ministério da Saúde, utiliza os atestados de óbito e a policia baseia suas informações no Boletim ou Registro de Ocorrência Policial. Ambas as fontes de dados apresentam problemas próprios que seguem baseados em critérios jurídicos ou policiais. Se há uma morte intencional não recebe o nome de homicídio, não será incluída nos totais agregados. Por outro lado, o Ministério da Saúde incluíra qualquer morte intencional independente de sua definição legal.

MÍDIA E CONFORMAÇÃO IDEOLÓGICA DO SISTEMA PENAL

O papel dos meios de comunicações como legitimadores e mantenedores da crença popular na funcionalidade do sistema penal é vital ao questionar qual é exatamente a relação que permeia a estreita ligação entre manutenção do poder, mídia e Direito penal em tempos de globalização neoliberal?

Não poderá ser respondido sem que se aborde o papel dos meios de comunicação no processo globalizado como instrumento efetivo e eficaz no objetivo imprescindível, no âmbito das políticas neoliberais, de moldar a opinião das massas. Batista (2002, p.273) adverte:

“O compromisso da imprensa cujos órgãos informativos se inscrevem, de regra, em grupos econômicos exploram os bons negócios das telecomunicações como o empreendimento neoliberal é a chave de compreensão dessa especial vinculação mídia – sistema penal, incondicionalmente legitimante. Tal legitimação explica a constante abordagem de algumas crenças e um silêncio sorridente sobre informações que as desmintam. O novo credo criminológico da mídia tem seu núcleo irradiador na própria idéia de pena: Antes de tudo crêem na pena como rito sagrado de solução dos conflitos”.

O controle da opinião pública, suposta imprescindível para produção do consenso que teoricamente, derivaria do consentimento social, obtido para prática de determinadas políticas públicas é o escopo maior dos meios de comunicação.

“Cria-se a convicção de que a democracia não consegue sobreviver sem as técnicas modernas de gerenciamento invisível da sociedade maior”. (Mattelart, 2000,p.68).

 

CONGLOMERADO URBANO E DESLOCAMENTO

Os reconhecimentos das dinâmicas sociais das periferias gravitavam em torno das categorias de trabalho. Industrial, família, migração e religião embebidas na promessa de assalariamento.

Os impactos da constituição de um proletariado urbano e suas implicações metropolitanas idiossincrasias da família operária, bem como transformações na religiosidade católica e ambiente urbano, revelam a questão de favelas, as alternativas de infra-instrutoras urbanas e o déficit habitacional das metrópoles revelam as mobilizações desses territórios criando debates para o tema dos movimentos sociais urbanos e sua reflexão sobre a construção democrática na participação das políticas públicas. A perspectiva de integração dessas massas constituiu a dinâmica social desses territórios, a coesão social das periferias acompanha as transformações empíricas que passam a ser identificadas como crise. A sociabilidade das periferias permanece tendo o trabalho categoria central, as crises de desempregos estruturais e flexibilização da acumulação deslocaram para ascensão social da família, na expectativa de melhorar de vida.

Cidadania e dignidade da pessoa humana são valores da Constituição Federativa do Brasil, indispensável a todas as garantias constitucionais que visam proteger esses valores, o respeito às garantias constitucionais e as convenções de direitos humanos nas práticas policiais, na investigação criminal e na justiça criminal aparece como um passo adiante na construção de um processo penal garantidor de cidadão contra arbítrio do Estado.

Todos os dispositivos legais que poderiam contrariar as novas disposições da Carta Magma não foram automaticamente recepcionados.

CONCLUSÃO

Ao legitimar auto de resistência e transformá-lo numa excludente de ilicitude, a lei Processual Penal Brasileira colabora para prática de ações policiais violentas em conglomerados urbanos, afastando-se com esse instrumento a proteção aos Direitos Humanos na medida em que se defende que está é uma maneira de proteção de um bem maior. O Estado por ter o monopólio da maneira que lhe aprovou. Conforme explica Clouck (2001).

O Estado cria uma regulamentação Processual penal a partir dos valores políticos dominantes, que por certos não é algo hermeticamente julgado, mais sim fruto de um determinado processo histórico que apresenta confronto com respeito às liberdades individuais, criando quadro conflituoso.

Os mecanismos utilizados pela cultura e disciplina se mostram no Princípio da Segurança Social e produzem uma falsa impressão de que são inerentes ao Estado de Direito.

Segurança Individual e Segurança Social interagem num processo dialético, deixando o Sistema Penal pautar-se pela tutela de ambos.

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9 - KANT DE LIMA, R. . "Direitos Civis e Direitos Humanos: uma tradição pré-republicana?". In: São

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Criminal no Brasil: Uma Bibliografia. BIB, Rio de Janeiro, nº. 50, 2º Semestre de 2000, pp. 45-123.

 

 

Data de elaboração: outubro/2011

 

Como citar o texto:

SILVA, Mario Bezerra da..Auto de resistência. Boletim Jurídico, Uberaba/MG, a. 14, nº 752. Disponível em https://www.boletimjuridico.com.br/artigos/direito-processual-penal/2388/auto-resistencia. Acesso em 12 dez. 2011.

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