Resumo: Verifica-se, em decorrência da promulgação do Texto Constitucional, em 1988, que o patrimônio genético passou a usufruir de tratamento jurídico, sendo que a contemporânea ótica adotada buscou salientar a necessidade de preservar não apenas a diversidade e a integridade do supramencionado patrimônio, como também estabelecer determinação, em relação ao Poder Pública, para promover fiscalização as entidades que se dedicam à pesquisa e à manipulação de material genético. Desta feita, emerge a autorização constitucional com os limites estatuídos na própria redação da Carta de Outubro, com o escopo de dispensar tutela jurídica à produção e à comercialização, tal como emprego de técnicas, métodos e substâncias que abarquem risco para a vida, a qualidade de vida e o meio ambiente. Cuida anotar que a Lei de Biossegurança objetivou destacar no plano jurídico ambiental a tutela jurídica concernente ao patrimônio genético da pessoa humana, assegurando em sede infraconstitucional tanto a tutela jurídica individual das pessoas humanas (como o direito às informações determinantes dos caracteres hereditários transmissíveis à descendência), em especial os referentes ao povo brasileiro, atento para a sua dimensão metaindividual.

Palavras-chaves: Patrimônio Genético. Direito de Quarta Dimensão. Tutela Jurídica. Princípio da Precaução.

Sumário: 1 Apontamentos Introdutórios: Primeiros Comentários à Construção Histórica dos Direitos Humanos; 2 A Edificação dos Direitos de Liberdade: A Concreção dos Direitos de Primeira Dimensão; 3 Os Anseios Sociais enquanto Vetores de Inspiração dos Direitos Humanos de Segunda Dimensão; 4 Os Aspectos Transindividuais enquanto sedimento de Orientação dos Direitos Humanos de Terceira Dimensão; 5 Os Direitos de Quarta Dimensão: As Inovações Biotecnológicas enquanto Elementos de Alargamento dos Direitos Humanos; 6 A Tutela Jurídica do Patrimônio Genético na Constituição Federal: A Construção do Biodireito como Direitos Humanos de Quarta Geração; 7 Breves Comentários ao Princípio da Precaução ou Princípio da Avaliação Prévia na Experimentação e Pesquisa com Material Genético Humano

1 Apontamentos Introdutórios: Primeiros Comentários à Construção Histórica dos Direitos Humanos

Em sede de ponderações inaugurais, imperioso se faz versar, com enfoque, acerca da evolução dos direitos humanos, os quais deram azo ao manancial de direitos e garantias fundamentais consagrados em diversos textos constitucionais, a exemplo da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. À sombra do pontuado, sobreleva salientar que os direitos humanos decorrem de uma construção gradativa e paulatina, consistindo em uma afirmação e consolidação em determinado período histórico da humanidade. “A evolução histórica dos direitos inerentes à pessoa humana também é lenta e gradual. Não são reconhecidos ou construídos todos de uma vez, mas sim conforme a própria experiência da vida humana em sociedade[2], como bem observam Silveira e Piccirillo. Quadra evidenciar que aludida construção não se encontra finalizada; ao reverso, a marcha evolutiva rumo à conquista de direitos encontra-se em franco desenvolvimento, fomentado pela difusão das informações propiciada pelos atuais meios de tecnologia, os quais permitem o florescimento de novos direitos, alargando, com bastante substância a rubrica dos temas associados aos direitos humanos.

Nesta perspectiva, ao se estruturar uma análise histórica sobre a construção dos direitos humanos, em especial ao seu latente núcleo germinativo, é possível fazer menção ao terceiro milênio antes de Cristo, no Egito e Mesopotâmia, nos quais eram difundidos instrumentos que objetivavam a proteção individual em relação ao Estado. Em que pese sua acepção originária, uma verdadeira célula embrionária, é possível identificar os primeiros instrumentos que atuaram como sedimento dos direitos humanos. “O Código de Hammurabi (1690 a.C.) talvez seja a primeira codificação a consagrar um rol de direitos comuns a todos os homens, tais como a vida, a propriedade, a honra, a dignidade, a família, prevendo, igualmente, a supremacia das leis em relação aos governantes”, como bem afiança Alexandre de Moraes[3]. Em mesma visão, proclama Rúbia Zanotelli de Alvarenga, ao abordar o tema, que:

 

Na antiguidade, o Código de Hamurabi (na Babilônia) foi a primeira codificação a relatar os direitos comuns aos homens e a mencionar leis de proteção aos mais fracos. O rei Hamurabi (1792 a 1750 a.C.), há mais de 3.800 anos, ao mandar redigir o famoso Código de Hamurabi, já fazia constar alguns Direitos Humanos, tais como o direito à vida, à família, à honra, à dignidade, proteção especial aos órfãos e aos mais fracos. O Código de Hamurabi também limitava o poder por um monarca absoluto. Nas disposições finais do Código, fez constar que aos súditos era proporcionada moradia, justiça, habitação adequada, segurança contra os perturbadores, saúde e paz[4].

 

 

Ainda nesta toada, nas polis gregas, notadamente na cidade-Estado de Atenas, é denotável, também, a estruturação e o reconhecimento de direitos basilares ao cidadão, dentre os quais sobressai a liberdade e igualdade dos homens. Deste modo, é observável o surgimento, na Grécia, da concepção de um direito natural, superior ao direito positivo, “pela distinção entre lei particular sendo aquela que cada povo da a si mesmo e lei comum que consiste na possibilidade de distinguir entre o que é justo e o que é injusto pela própria natureza humana[5], consoante evidenciam Siqueira e Piccirillo. Prima assinalar, doutra maneira, que os direitos reconhecidos não eram estendidos aos escravos e às mulheres, pois eram dotes destinados, exclusivamente, aos cidadãos homens[6], cuja acepção, na visão adotada, excluía aqueles. “É na Grécia antiga que surgem os primeiros resquícios do que passou a ser chamado Direito Natural, através da ideia de que os homens seriam possuidores de alguns direitos básicos à sua sobrevivência”[7], sendo que estes direitos seriam revestidos por inviolabilidade e constituiriam os seres humanos, a partir do momento que nascessem com vida.

O período medieval, por sua vez, foi caracterizado pela maciça descentralização política, isto é, a coexistência de múltiplos centros de poder, influenciados pelo cristianismo e pelo modelo estrutural do feudalismo, motivado pela dificuldade de práticas atividade comercial. Subsiste, neste período, o esfacelamento do poder político e econômico. A sociedade, no medievo, estava dividida em três estamentos, quais sejam: o clero, cuja função primordial estava assentada na oração e pregação; os nobres, a quem incumbiam à proteção dos territórios; e, os servos, com a obrigação de trabalhar para o sustento de todos. “Durante a Idade Média, apesar da organização feudal e da rígida separação de classes, com a consequente relação de subordinação entre o suserano e os vassalos, diversos documentos jurídicos reconheciam a existência dos direitos humanos[8], tendo como traço característico a limitação do poder estatal.

Neste período, é observável a difusão de documentos escritos reconhecendo direitos a determinados estamentos, mormente por meio de forais ou cartas de franquia, tendo seus textos limitados à região em que vigiam. Dentre estes documentos, é possível mencionar a Magna Charta Libertati (Carta Magna), outorgada, na Inglaterra, por João Sem Terra, em 15 de junho de 1215, decorrente das pressões exercidas pelos barões em razão do aumento de exações fiscais para financiar a estruturação de campanhas bélicas, como bem explicita Comparato[9]. A Carta de João sem Terra acampou uma série de restrições ao poder do Estado, conferindo direitos e liberdades ao cidadão, como, por exemplo, restrições tributárias, proporcionalidade entre a pena e o delito, devido processo legal, acesso à Justiça, liberdade de locomoção e livre entrada e saída do país.

Na Inglaterra, durante a Idade Moderna, outros documentos, com clara feição humanista, foram promulgados, dentre os quais é possível mencionar o Petition of Right, de 1628, que estabelecia limitações ao poder de instituir e cobrar tributos do Estado, tal como o julgamento pelos pares para a privação da liberdade e a proibição de detenções arbitrárias[10], reafirmando, deste modo, os princípios estruturadores do devido processo legal. Com efeito, o diploma em comento foi confeccionado pelo Parlamento Inglês e buscava que o monarca reconhecesse o sucedâneo de direitos e liberdades insculpidos na Carta de João Sem Terra, os quais não eram, até então, respeitados. Cuida evidenciar, ainda, que o texto de 1.215 só passou a ser observado com o fortalecimento e afirmação das instituições parlamentares e judiciais, cenário no qual o absolutismo desmedido passa a ceder diante das imposições democráticas que floresciam.

Outro exemplo a ser citado, o Habeas Corpus Act, de 1679, lei que criou o habeas corpus, afixava que um indivíduo que estivesse preso poderia obter a liberdade por meio de um documento escrito que seria encaminhado ao lorde-chanceler ou ao juiz que lhe concederia a liberdade provisória, ficando o acusado, apenas, comprometido a apresentar-se em juízo quando solicitado. Prima pontuar que aludida norma foi considerada como axioma inspirador para maciça parte dos ordenamentos jurídicos contemporâneos, como bem enfoca Comparato[11]. Enfim, diversos foram os documentos surgidos no velho continente que trouxeram o refulgir de novos dias, estabelecendo, aos poucos, os marcos de uma transição entre o autoritarismo e o absolutismo estatal para uma época de reconhecimento dos direitos humanos fundamentais[12].

As treze colônias inglesas, instaladas no recém-descoberto continente americano, em busca de liberdade religiosa, organizaram-se e desenvolveram-se social, econômica e politicamente. Neste cenário, foram elaborados diversos textos que objetivavam definir os direitos pertencentes aos colonos, dentre os quais é possível realçar a Declaração do Bom Povo da Virgínia, de 1776. O mencionado texto é farto em estabelecer direitos e liberdade, pois limitou o poder estatal, reafirmou o poderio do povo, como seu verdadeiro detentor, e trouxe certas particularidades como a liberdade de impressa, por exemplo. Como bem destaca Comparato[13], a Declaração de Direitos do Bom Povo da Virgínia afirmava que os seres humanos são livres e independentes, possuindo direitos inatos, tais como a vida, a liberdade, a propriedade, a felicidade e a segurança, registrando o início do nascimento dos direitos humanos na história. “Basicamente, a Declaração se preocupa com a estrutura de um governo democrático, com um sistema de limitação de poderes[14], como bem anota José Afonso da Silva.

Diferente dos textos ingleses, que, até aquele momento preocupavam-se, essencialmente, em limitar o poder do soberano, proteger os indivíduos e exaltar a superioridade do Parlamento, esse documento, trouxe avanço e progresso marcante, pois estabeleceu a viés a ser alcançada naquele futuro, qual seja, a democracia.  Em 1791, foi ratificada a Constituição dos Estados Unidos da América. Inicialmente, o documento não mencionava os direitos fundamentais, todavia, para que fosse aprovado, o texto necessitava da ratificação de, pelo menos, nove das treze colônias. Estas concordaram em abnegar de sua soberania, cedendo-a para formação da Federação, desde que constasse, no texto constitucional, a divisão e a limitação do poder e os direitos humanos fundamentais. Assim, surgiram as primeiras dez emendas ao texto, acrescentando-se a ele os seguintes direitos fundamentais: igualdade, liberdade, propriedade, segurança, resistência à opressão, associação política, princípio da legalidade, princípio da reserva legal e anterioridade em matéria penal, princípio da presunção da inocência, da liberdade religiosa, da livre manifestação do pensamento.

2 A Edificação dos Direitos de Liberdade: A Concreção dos Direitos de Primeira Dimensão

Em meados de 1789, em meio a um cenário caótico de insatisfação por parte das classes sociais exploradas, notadamente para manterem os interesses dos detentores do poder, implode a Revolução Francesa, que culminou com a queda da Bastilha e a tomada do poder pelos revoltosos, os quais estabeleceram, pouco tempo depois, a Assembleia Nacional Constituinte. Esta suprimiu os direitos das minorias, as imunidades estatais e proclamou a Declaração dos Direitos dos Homens e Cidadão que, ao contrário da Declaração do Bom Povo da Virgínia, que tinha um enfoque regionalista, voltado, exclusivamente aos interesses de seu povo, foi tida com abstrata[15] e, por isso, universalista. Ressalta-se que a Declaração Francesa possuía três características: intelectualismo, mundialismo e individualismo.

A primeira pressupunha que as garantias de direito dos homens e a entrega do poder nas mãos da população era obra e graça do intelecto humano; a segunda característica referia-se ao alcance dos direitos conquistados, pois, apenas, eles não salvaguardariam o povo francês, mas se estenderiam a todos os povos. Por derradeiro, a terceira característica referia-se ao seu caráter, iminentemente individual, não se preocupando com direitos de natureza coletiva, tais como as liberdades associativas ou de reunião. No bojo da declaração, emergidos nos seus dezessete artigos, estão proclamados os corolários e cânones da liberdade, da igualdade, da propriedade, da legalidade e as demais garantias individuais. Ao lado disso, é denotável que o diploma em comento consagrou os princípios fundantes do direito penal, dentre os quais sobreleva destacar princípio da legalidade, da reserva legal e anterioridade em matéria penal, da presunção de inocência, tal como liberdade religiosa e livre manifestação de pensamento.

Os direitos de primeira dimensão compreendem os direitos de liberdade, tal como os direitos civis e políticos, estando acampados em sua rubrica os direitos à vida, liberdade, segurança, não discriminação racial, propriedade privada, privacidade e sigilo de comunicações, ao devido processo legal, ao asilo em decorrência de perseguições políticas, bem como as liberdades de culto, crença, consciência, opinião, expressão, associação e reunião pacíficas, locomoção, residência, participação política, diretamente ou por meio de eleições. “Os direitos de primeira geração ou direitos de liberdade têm por titular o indivíduo, são oponíveis ao Estado, traduzem-se como faculdades ou atributos da pessoa e ostentam subjetividade[16],  aspecto este que passa a ser característico da dimensão em comento. Com realce, são direitos de resistência ou de oposição perante o Estado, refletindo um ideário de afastamento daquele das relações individuais e sociais.

3 Os Anseios Sociais enquanto Vetores de Inspiração dos Direitos Humanos de Segunda Dimensão

Com o advento da Revolução Industrial, é verificável no continente europeu, precipuamente, a instalação de um cenário pautado na exploração do proletariado. O contingente de trabalhadores não estava restrito apenas a adultos, mas sim alcançava até mesmo crianças, os quais eram expostos a condições degradantes, em fábricas sem nenhuma, ou quase nenhuma, higiene, mal iluminadas e úmidas. Salienta-se que, além dessa conjuntura, os trabalhadores eram submetidos a cargas horárias extenuantes, compensadas, unicamente, por um salário miserável. O Estado Liberal absteve-se de se imiscuir na economia e, com o beneplácito de sua omissão, assistiu a classe burguesa explorar e “coisificar” a massa trabalhadora, reduzindo seres humanos a meros objetos sujeitos a lei da oferta e procura. O Capitalismo selvagem, que operava, nessa essa época, enriqueceu uns poucos, mas subjugou a maioria[17]. A massa de trabalhadores e desempregados vivia em situação de robusta penúria, ao passo que os burgueses ostentavam desmedida opulência.

Na vereda rumo à conquista dos direitos fundamentais, econômicos e sociais, surgiram alguns textos de grande relevância, os quais combatiam a exploração desmedida propiciada pelo capitalismo. É possível citar, em um primeiro momento, como proeminente documento elaborado durante este período, a Declaração de Direitos da Constituição Francesa de 1848, que apresentou uma ampliação em termos de direitos humanos fundamentais. “Além dos direitos humanos tradicionais, em seu art. 13 previa, como direitos dos cidadãos garantidos pela Constituição, a liberdade do trabalho e da indústria, a assistência aos desempregados[18]. Posteriormente, em 1917, a Constituição Mexicana[19], refletindo os ideários decorrentes da consolidação dos direitos de segunda dimensão, em seu texto consagrou direitos individuais com maciça tendência social, a exemplo da limitação da carga horária diária do trabalho e disposições acerca dos contratos de trabalho, além de estabelecer a obrigatoriedade da educação primária básica, bem como gratuidade da educação prestada pelo Ente Estatal.

A Constituição Alemã de Weimar, datada de 1919, trouxe grandes avanços nos direitos socioeconômicos, pois previu a proteção do Estado ao trabalho, à liberdade de associação, melhores condições de trabalho e de vida e o sistema de seguridade social para a conservação da saúde, capacidade para o trabalho e para a proteção à maternidade.  Além dos direitos sociais expressamente insculpidos, a Constituição de Weimar apresentou robusta moldura no que concerne à defesa dos direitos dos trabalhadores, primacialmente “ao instituir que o Império procuraria obter uma regulamentação internacional da situação jurídica dos trabalhadores que assegurasse ao conjunto da classe operária da humanidade, um mínimo de direitos sociais[20], tal como estabelecer que os operários e empregados seriam chamados a colaborar com os patrões, na regulamentação dos salários e das condições de trabalho, bem como no desenvolvimento das forças produtivas.

Nota-se, assim, que, aos poucos, o Estado saiu da apatia e envolveu-se nas relações de natureza econômica, a fim de garantir a efetivação dos direitos fundamentais econômicos e sociais. Sendo assim, o Estado adota uma postura de Estado-social, ou seja, tem como fito primordial assegurar aos indivíduos que o integram as condições materiais tidas por seus defensores como imprescindíveis para que, desta feita, possam ter o pleno gozo dos direitos oriundos da primeira geração. E, portanto, desenvolvem uma tendência de exigir do Ente Estatal intervenções na órbita social, mediante critérios de justiça distributiva. Opondo-se diretamente a posição de Estado liberal, isto é, o ente estatal alheio à vida da sociedade e que, por consequência, não intervinha na sociedade. Incluem os direitos a segurança social, ao trabalho e proteção contra o desemprego, ao repouso e ao lazer, incluindo férias remuneradas, a um padrão de vida que assegure a saúde e o bem-estar individual e da família, à educação, à propriedade intelectual, bem como as liberdades de escolha profissional e de sindicalização.

Bonavides, ao tratar do tema, destaca que os direitos de segunda dimensão “são os direitos sociais, culturais e econômicos bem como os direitos coletivos ou de coletividades, introduzidos no constitucionalismo das distintas formas do Estado social, depois que germinaram por ora de ideologia e da reflexão antiliberal[21]. Os direitos alcançados pela rubrica em comento florescem umbilicalmente atrelados ao corolário da igualdade. Como se percebe, a marcha dos direitos humanos fundamentais rumo às sendas da História é paulatina e constante. Ademais, a doutrina dos direitos fundamentais apresenta uma ampla capacidade de incorporar desafios, refletindo os anseios e temas sensíveis da sociedade. “Sua primeira geração enfrentou problemas do arbítrio governamental, com as liberdades públicas, a segunda, o dos extremos desníveis sociais, com os direitos econômicos e sociais[22], como bem evidencia Manoel Gonçalves Ferreira Filho.

4 Os Aspectos Transindividuais enquanto sedimento de Orientação dos Direitos Humanos de Terceira Dimensão

Conforme fora visto no tópico anterior, os direitos humanos originaram-se ao longo da História e permanecem em constante evolução, haja vista o surgimento de novos interesses e carências da sociedade. Por esta razão, alguns doutrinadores, dentre eles Bobbio[23], os consideram direitos históricos, sendo divididos, tradicionalmente, em três gerações ou dimensões. A nomeada terceira dimensão encontra como fundamento o ideal da fraternidade (solidariedade) e tem como exemplos o direito ao meio ambiente equilibrado, à saudável qualidade de vida, ao progresso, à paz, à autodeterminação dos povos, a proteção e defesa do consumidor, além de outros direitos considerados como difusos. “Dotados de altíssimo teor de humanismo e universalidade, os direitos de terceira geração tendem a cristalizar-se no fim do século XX enquanto direitos que não se destinam especificamente à proteção dos interesses de um indivíduo, de um grupo[24] ou mesmo de um Ente Estatal especificamente.

Ainda nesta esteira, é possível verificar que a construção dos direitos encampados sob a rubrica de terceira dimensão tende a identificar a existência de valores concernentes a uma determinada categoria de pessoas, consideradas enquanto unidade, não mais prosperando a típica fragmentação individual de seus componentes de maneira isolada, tal como ocorria em momento pretérito. Os direitos de terceira dimensão são considerados como difusos, porquanto não têm titular individual, sendo que o liame entre os seus vários titulares decorre de mera circunstância factual. Com o escopo de ilustrar, de maneira pertinente as ponderações vertidas, insta trazer à colação o robusto entendimento explicitado pelo Ministro Celso de Mello, ao apreciar a Ação Direta de Inconstitucionalidade N°. 1.856/RJ, em especial quando destaca:

Cabe assinalar, Senhor Presidente, que os direitos de terceira geração (ou de novíssima dimensão), que materializam poderes de titularidade coletiva atribuídos, genericamente, e de modo difuso, a todos os integrantes dos agrupamentos sociais, consagram o princípio da solidariedade e constituem, por isso mesmo, ao lado dos denominados direitos de quarta geração (como o direito ao desenvolvimento e o direito à paz), um momento importante no processo de expansão e reconhecimento dos direitos humanos, qualificados estes, enquanto valores fundamentais indisponíveis, como prerrogativas impregnadas de uma natureza essencialmente inexaurível[25].

Nesta feita, importa acrescentar que os direitos de terceira dimensão possuem caráter transindividual, o que os faz abranger a toda a coletividade, sem quaisquer restrições a grupos específicos. Neste sentido, pautaram-se Motta e Motta e Barchet, ao afirmarem, em suas ponderações, que “os direitos de terceira geração possuem natureza essencialmente transindividual, porquanto não possuem destinatários especificados, como os de primeira e segunda geração, abrangendo a coletividade como um todo[26]. Desta feita, são direitos de titularidade difusa ou coletiva, alcançando destinatários indeterminados ou, ainda, de difícil determinação. Os direitos em comento estão vinculados a valores de fraternidade ou solidariedade, sendo traduzidos de um ideal intergeracional, que liga as gerações presentes às futuras, a partir da percepção de que a qualidade de vida destas depende sobremaneira do modo de vida daquelas.

Dos ensinamentos dos célebres doutrinadores, percebe-se que o caráter difuso de tais direitos permite a abrangência às gerações futuras, razão pela qual, a valorização destes é de extrema relevância. “Têm primeiro por destinatários o gênero humano mesmo, num momento expressivo de sua afirmação como valor supremo em termos de existencialidade concreta[27]. A respeito do assunto, Motta e Barchet[28] ensinam que os direitos de terceira dimensão surgiram como “soluções” à degradação das liberdades, à deterioração dos direitos fundamentais em virtude do uso prejudicial das modernas tecnologias e desigualdade socioeconômica vigente entre as diferentes nações.

5 Os Direitos de Quarta Dimensão: As Inovações Biotecnológicas enquanto Elementos de Alargamento dos Direitos Humanos

É de amplo conhecimento que a sociedade atual tem, como algumas de suas principais características, o avanço tecnológico e científico, a difusão e o desenvolvimento da cibernética, consequências do processo de globalização. Ocorre que tais perspectivas trouxeram situações inovadoras e que não correspondem aos fundamentos das gerações mencionadas anteriormente. Trata-se de um cenário dotado de maciça difusão de conhecimento e informações, bem como fluída alteração de paradigmas, notadamente os relacionados ao desenvolvimento científico e biológico. Em meio a esse contexto, para a regularização das situações decorrentes das transformações sociais, surgiram os Direitos de Quarta e Quinta Dimensão, os quais serão estudados doravante. Particularmente à Quarta Dimensão de Direitos, um dos seus principais idealizadores foi Bonavides[29], para o qual “são direitos da quarta geração o direito à democracia, o direito à informação e o direito ao pluralismo. Deles depende a concretização da sociedade aberta para o futuro, em sua dimensão de máxima universalidade [...]”.

Com o passar do tempo, conforme bem salientou Serraglio[30], as descobertas científicas proporcionaram, dentre muitos avanços, o aumento na expectativa de vida humana, vez que, ao homem, tornou-se possível alterar os mecanismos de nascimento e morte de seus pares. Sendo assim, a proteção à vida e ao patrimônio genético foi incluída na categoria dos direitos de quarta dimensão. Em consonância com Motta e Barchet[31], atualmente, tais direitos referem-se à manipulação genética, à biotecnologia e à bioengenharia, e envolvem, sobretudo, as discussões sobre a vida e morte, sempre pautadas nos preceitos éticos. É fato que o fenômeno globalizante foi responsável por conferir um robusto desencadeamento de difusão de informações e tecnologias, sendo responsável pelo surgimento de questões dotadas de proeminente complexidade, os quais oscilam desde os benefícios apresentados para a sociedade até a modificação do olhar analítico acerca de temas polêmicos, propiciando uma renovação nos valores e costumes adotados pela coletividade.

Como bem destaca Lima Neto[32], o florescimento dos direitos humanos acampados pela quarta dimensão só foi possível em decorrência do sucedâneo de inovações tecnológicas que deram azo ao surgimento de problemas que, até então, não foram enfrentados pelo Direito, notadamente os relacionados ao campo da pesquisa com o genoma humano. Para tanto, carecido se fez a estruturação de limites e regulamentos que norteassem o desenvolvimento das pesquisas, tal como a utilização dos dados obtidas, com o escopo de preservar o patrimônio genético da espécie humana. Dentre os documentos legais que se dedicam à regulamentação das pesquisas científicas relacionadas à vida humana, cumpre-se mencionar, primeiramente, a Declaração dos Direitos do Homem e do Genoma Humano, criada pela Assembleia Geral da Unesco em 1997.

No direito pátrio, como exemplos da consolidação dos direitos de quarta dimensão, podem ser destacadas a Lei de Biossegurança (Lei n.º 11.105/2005) e a Lei de Transplantes (Lei n.º 9.434/1997). Conforme esclarece Motta e Barchet[33], é necessário consolidar os direitos de quarta geração, pois assim serão delineados os fundamentos jurídicos para as pesquisas científicas, no sentido de impor limites a estas e de garantir que o Direito não fique apartado dos avanços da Ciência. Vieira complementa esse entendimento, ao afirmar que: “a lei deve assegurar o princípio da primazia da pessoa aliando-se às exigências legítimas do progresso de conhecimento científico e da proteção da saúde pública”[34].  Diante da inexistência de lei específica, diante de um caso concreto, o magistrado deverá buscar, nos princípios gerais do Direito, os limites a serem impostos nos procedimentos científicos.

Além do alavancar da Ciência, as inovações tecnológicas foram responsáveis, também, pela difusão da cibernética. Ressalta-se que, como desenvolvimento da internet, surgiu a necessidade de tutelar, juridicamente, os fatos e bens advindos das relações virtuais. Em meio a essa conjuntura, emergiu a Quinta Dimensão de Direitos. Nesse sentido pautou-se a maioria dos doutrinadores, dentre os quais, pode-se destacar Motta e Barchet[35]. Este salienta que os direitos inerentes a essa categoria decorrem da realidade virtual e demonstram a preocupação do ordenamento jurídico com o avanço exacerbado da cibernética. Isso porque, por meio desta podem ser maculados valores que priorizam o princípio da dignidade da pessoa humana, tais como a honra e a imagem. Além disso, pelo fato da internet romper os limites territoriais, torna-se um meio para se alcançar a destruição da cultura do Oriente e do Ocidente e, por outro lado, para impor os padrões de vida norte-americanos nos demais países.

6 A Tutela Jurídica do Patrimônio Genético na Constituição Federal: A Construção do Biodireito como Direitos Humanos de Quarta Geração

Verifica-se, em decorrência da promulgação do Texto Constitucional, em 1988, que o patrimônio genético passou a usufruir de tratamento jurídico, sendo que a contemporânea ótica adotada buscou salientar a necessidade de preservar não apenas a diversidade e a integridade do supramencionado patrimônio, como também estabelecer determinação, em relação ao Poder Pública, para promover fiscalização as entidades que se dedicam à pesquisa e à manipulação de material genético. Desta feita, emerge a autorização constitucional com os limites estatuídos na própria redação da Carta de Outubro, com o escopo de dispensar tutela jurídica à produção e à comercialização, tal como emprego de técnicas, métodos e substâncias que abarquem risco para a vida, a qualidade de vida e o meio ambiente.

Neste passo, a tutela jurídica do patrimônio genético da pessoa humana encontra proteção ambiental constitucional, sendo imperiosa a observância dos incisos II, IV e V do §1º do artigo 225[36], sendo cediço que, em sede infraconstitucional, a Lei Nº 11.105, de 24 de Março de 2005[37], que regulamenta os incisos II, IV e V do § 1o do art. 225 da Constituição Federal, estabelece normas de segurança e mecanismos de fiscalização de atividades que envolvam organismos geneticamente modificados – OGM e seus derivados, cria o Conselho Nacional de Biossegurança – CNBS, reestrutura a Comissão Técnica Nacional de Biossegurança – CTNBio, dispõe sobre a Política Nacional de Biossegurança – PNB, revoga a Lei no 8.974, de 5 de janeiro de 1995, e a Medida Provisória no 2.191-9, de 23 de agosto de 2001, e os arts. 5o, 6o, 7o, 8o, 9o, 10 e 16 da Lei no 10.814, de 15 de dezembro de 2003, e dá outras providências, foi responsável por estabelecer as normas de segurança, tal como mecanismos de fiscalização de atividades que envolvam os organismos geneticamente modificados.

Cuida anotar que a Lei de Biossegurança objetivou destacar no plano jurídico ambiental a tutela jurídica concernente ao patrimônio genético da pessoa humana, “assegurando em sede infraconstitucional tanto a tutela jurídica individual das pessoas humanas (como o direito às informações determinantes dos caracteres hereditários transmissíveis à descendência)”[38], em especial os referentes ao povo brasileiro, atento, porém, para a sua dimensão metaindividual. Quadra salientar que o diploma legislativo em comento afixou sanções para apenar a responsabilidade civil, administrativa e criminal em decorrência de possíveis condutas ou mesmo atividades consideradas lesivas ao patrimônio genético da pessoa humana.

Neste passo, ainda, cuida rememorar que a Lei de Biossegurança não está adstrita ao patrimônio genético humano, mas compreende também à informação de origem genética contida em amostras de todo ou de parte de espécime vegetal, fúngico, microbiano ou animal, na forma de moléculas e substâncias oriundas do metabolismo desses seres vivos e de extratos colhidos desses organismos vivos ou mortos. Ao lado disso, é possível assinalar, ainda, que as referidas amostras podem ser obtidas in situ, tal como os domesticados ou mantidos em coleções ex situ, desde que coletados, porém, em condições in situ no território brasileiro, na plataforma continental ou na zona econômica exclusiva. Com efeito, a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988[39] possibilitou que as entidades dedicadas à pesquisa e manipulação de material genético desenvolvessem atividades destinadas, maiormente, para a solução dos problemas brasileiros, sensíveis não apenas à preservação da diversidade e integridade do patrimônio genético para as presentes e futuras gerações, tal como os fundamentos elencados no artigo 1º do texto constitucional.

Ementa: Direito constitucional. Direito administrativo. Direito processual civil. Agravo retido prejudicado. Algodão. OGM. Meio ambiente. Produção de espécie não autorizada. Necessidade do parecer favorável da CTNbio. Infringência à Lei Nº. 11.105/205. Auto de infração. Multa. Termo de fiscalização. Termo de suspensão da comercialização. Fundamentação e motivação presentes. Legalidade dos atos administrativos. Portaria nº. 437/2005. Interpretação. Sentença mantida. [...] 2. A impetrante insurgiu-se contra auto de infração e termos de fiscalização e suspensão de comercialização de algodão tido como transgênico, pugnando pela sua anulação, uma vez que a pluma do algodão não se enquadraria no conceito de organismo geneticamente modificado (OGM), autorizando a sua comercialização e beneficiamento ou, ao menos, o beneficiamento, ou, ainda, a redução do valor da multa aplicada. 3. Ora, não se deve olvidar que o caso em tela envolve interesses sociais relevantes, tutelados pela Constituição Federal de 1988, pois, de um lado, nos termos do artigo 225, todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, devendo ser preservado para as gerações presentes e futuras. [...] 5. Resta evidente a preocupação do legislador constituinte em conciliar os direitos que inscreveu na Carta Magna, surgindo, porém, inequívoca a qualificação do meio ambiente como direito fundamental, devendo o Poder Público exigir estudos de impacto ambiental para autorizar a exploração de variedades oriundas de organismos geneticamente modificados, ou para a instalação de obra ou outra atividade qualquer, sempre com a finalidade de evitar degradação ambiental. 6. A impetrante cultivou espécie de algodão com presença de OGM não autorizado, o que ensejou a autuação e suspensão de sua  comercialização, conquanto a cultura foi feita sem a devida liberação e parecer favorável da CTNBio, órgão que delibera a respeito da segurança dos produtos que contenham organismos geneticamente modificados - OGM, sendo que o seu parecer técnico favorável é exigência imposta por lei, a teor do artigo 6º, inciso VI, da Lei nº. 11.105.2005. [...] 11. Nesse contexto e considerando as circunstâncias do caso concreto, de um lado, o parecer técnico favorável da CTNBio constitui exigência inafastável para o cultivo de organismos geneticamente modificados, e de outro, nem se cogita que o Poder Judiciário está autorizado a liberar a comercialização da produção do algodão objeto de  autuação legítima, por se tratar de variedade de OGM cujo cultivo não foi liberado. 12. Agravo retido prejudicado e apelação a que se nega provimento. (Tribunal Regional Federal da Terceira Região – Terceira Turma/ AMS 0002621-46.2007.4.03.6000/ Relator: Juiz Convocado Valdeci dos Santos/ Julgado em 18.03.2010/ Publicado em 30.03.2010, p. 560).

Denota-se, desta sorte, que a Lei de Biossegurança apoia e estimula as empresas que invistam em pesquisa e criação de tecnologias adequadas ao Brasil dentro de orientação constitucional voltada maciçamente para a solução de problemas nacionais, assim como para o desenvolvimento do sistema produtivo nacional e regional. O mencionado diploma legislativo viabilizou, no plano infraconstitucional a contemporânea visão adotada Carta de 1988, que já buscava realçar no final do século passado a necessidade de preservar não apenas a diversidade como a integridade de referido patrimônio genético brasileiro. “A norma aludida não se esqueceu de também determinar em referido plano jurídico de que forma a incumbência constitucional destinada ao Poder Público, no sentido de fiscalizar as entidades que se dedicam à pesquisa[40], consoante bem observa Fiorillo, tal como manipulação do direito material genético, deverá ser realizada concretamente.

Ao lado disso, a autorização constitucional com os limites estabelecidos no Texto Constitucional passa a ser regulamentar pela Lei de Biossegurança, objetivada conferir viabilidade jurídica à produção e comercialização, tal como a utilização de técnicas, métodos e substâncias que ofereçam risco para a vida, a qualidade de via e o meio ambiente. Assim, como a produção e a comercialização, tal como o emprego de técnicas, métodos e substâncias que comportem riscos para a vida, a qualidade de vida e o meio ambiente serão controladas carecidamente pelo Poder Público, notadamente em razão da existência de atividades que pelo menos potencialmente possam causar significativa degradação ambiental. Para tanto, destaque-se, é imperiosa a estruturação do Estudo Prévio de Impacto Ambiental a que se dará sempre publicidade. Desta feita, o Poder Público deverá exigir, na forma da lei, o EIA sempre que ocorrer iniciativa destinada a instalar obra ou mesmo atividade potencialmente causadora de significativa degradação ambiental.

7 Breves Comentários ao Princípio da Precaução ou Princípio da Avaliação Prévia na Experimentação e Pesquisa com Material Genético Humano

Quadra assinalar, em um primeiro momento, em harmonia com os feixes originalmente emanados pelo corolário em debate, que o princípio da vulnerabilidade preconiza, em sede de experimentação e pesquisa com o genoma humano, que antes da realização de qualquer pesquisa, tratamento ou diagnóstico no patrimônio genético humano, deve ser realizada uma prévia avaliação dos potenciais riscos e benefícios a serem incorridos, além de atender às determinações legais vigentes no território nacional. É possível salientar que o corolário da precaução se apresenta como uma garantia contra os riscos potenciais que, em harmonia com o estado atual de conhecimento, não são passíveis, ainda, de identificação. É desfraldada como flâmula pelo preceito da precaução que, em havendo ausência de certeza científica formal, existência de um dano robusto ou mesmo irreversível reclama a estruturação de medidas e instrumentos que possam minimizar e/ou evitar este dano. Neste passo, sobreleva salientar que o dogma em apreço encontra seu sedimento de estruturação no princípio quinze da Declaração da Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, também conhecida como Declaração do Rio/92, que em seu princípio quinze estabelece que:

Com o fim de proteger o meio ambiente, o princípio da precaução deverá ser amplamente observado pelos Estados, de acordo com suas capacidades. Quando houver ameaça de danos graves ou irreversíveis, a ausência de certeza científica absoluta não será utilizada como razão para o adiamento de medidas economicamente viáveis para prevenir a degradação ambiental[41].

Quadra destacar, nesta toada, que a ausência de certeza científica absoluta não deve subsidiar pretexto para postergação do emprego de medidas efetivas que objetivem evitar a degradação ambiental. “Vale dizer, a incerteza científica milita em favor do ambiente, carregando-se ao interessado o ônus de provar que as intervenções pretendidas não são perigosas e/ou poluentes[42], como bem anota Romeu Thomé. Neste sentido, inclusive, o Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, ao relatoriar o Agravo Regimental no  Agravo no Recurso Especial Nº 206.748/SP, salientou, com bastante pertinência, a dimensão do princípio da precaução, explicitando que “pressupõe a inversão do ônus probatório, transferindo para a concessionária o encargo de provar que sua conduta não ensejou riscos para o meio ambiente e, por consequência, aos pescadores da região[43]. Sobre o tema em comento, cuida salientar que o princípio da precaução, ou princípio da avaliação prévia, foi, de maneira expressa, em uma órbita internacional, entalhado na Declaração Universal do Genoma Humano e dos Direitos do Homem:

Artigo 19

a) No quadro da cooperação internacional com os países em desenvolvimento, os Estados devem procurar encorajar:

1. que seja garantida a avaliação dos riscos e benefícios das pesquisas com o genoma humano, e que sejam impedidos dos abusos;

2. que seja desenvolvida e fortalecida a capacidade dos países em desenvolvimento de promover pesquisas sobre biologia e genética humana, levando em consideração os problemas específicos desses países;

3. que os países em desenvolvimento possam se beneficiar das conquistas da pesquisa científica e tecnológica, para que sua utilização em favor do progresso econômico e social possa ser feita de modo a beneficiar todos;

4. que seja promovido o livre intercâmbio de conhecimentos e informações científicas nas áreas de biologia, genética e medicina[44].

Ao lado disso, pontuar faz-se carecido que a Declaração Ibero-Americana sobre Ética e Genoma, também conhecida como Declaração de Manzanillo[45], em seu artigo 5º, consagra o corolário em comento que, em algumas aplicações da genética humana, é imprescindível uma adequada e completa regulamentação jurídica, estabelecendo responsabilidade em relação aos profissionais da saúde. O axioma em realce, neste cenário, constitui no principal norteador da pesquisa e experimentação do material genético, à medida que este se reporta à função primordial de evitar os riscos e a ocorrência dos danos a serem produzidos. Em decorrência da proeminência assumida pelo preceito da precaução, salta aos olhos que é robusto orientador da pesquisa e experimentação com o genoma humano, estabelecendo a imprescindível observância, sobretudo com o escopo de afixar os possíveis riscos e benefícios a serem produzidos com o procedimento. Entalhou o princípio da precaução a Declaração de Wingspread de 1998, que “quando uma atividade representa ameaças de danos ao meio-ambiente ou à saúde humana, medidas de precaução devem ser tomadas, mesmo de algumas relações de causa e efeito não forem plenamente estabelecidas cientificamente[46]. Os Tribunais Pátrios já se manifestaram quanto à aplicabilidade do princípio em comento, consoante, podendo, inclusive ser interpretado extensivamente ao tema em debate:

Ementa: Direito Ambiental - Ação Popular - Área de Proteção Ambiental - Extração Mineral - Degradação do Meio Ambiente - Região de Mananciais - Inexistência de direito adquirido contra a proteção ambiental - Princípio da Precaução. 1. O meio ambiente consiste em bem de uso comum do povo, essencial à sua qualidade de vida, impondo ao poder público e à própria coletividade o dever de protegê-lo e preservá-lo, visando assegurar a sua fruição pelas futuras gerações. Inteligência do art. 225 da Constituição Federal. 2. A atividade de pesquisa e posterior exploração mineral na região, tal como prevista nos atos impugnados, não pode ser conciliada com a proteção ambiental dispensada (APA), sobretudo por suas repercussões em bacia hidrográfica relevante. Situação agravada pela exploração já empreendida, independentemente de autorização dos órgãos competentes e sem qualquer fiscalização. 3. Inexiste direito adquirido oponível à proteção do meio ambiente. Precedente do C. STJ. 4. A ausência de certeza científica formal acerca da existência de risco de dano sério ou irreversível requer a implementação de medidas que possam assegurar a sua prevenção. Princípio da Precaução. 5. Apelação a que se nega provimento. (Tribunal Regional Federal da Terceira Região – Sexta Turma/ AC 0006575-57.1999.4.03.6105/ Relator: Desembargador Federal Mairan Maia/ Julgado em 27.01.2011/ Publicado no e-DJF3 Judicial 1 em 02.02.2011, p. 193).

 

Segundo Colombo[47], no direito positivo pátrio, é possível verificar a substancialização do princípio da precaução nos incisos I e IV do artigo 4º da Lei Nº. 6.938, de 31 de Agosto de 1981[48], que dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, seus fins e mecanismos de formulação e aplicação, e dá outras providências, que, de forma clarividente, expressa a imperiosidade de existir um equilíbrio entre o desenvolvimento econômico e a utilização, de maneira racional, dos recursos naturais, sem olvidar da imprescindível avaliação do impacto ambiental. “Este princípio tem sido muito utilizado em ações civis públicas, seja requerendo a paralisação de obras, seja requerendo a proibição de explorações que possam causar, ainda hipoteticamente, danos ao meio ambiente[49]. Reconhecendo a faceta assumida pelo princípio em comento, o Superior Tribunal de Justiça alicerçou entendimento que:

Ementa: Pedido de suspensão de medida liminar. Licença ambiental. Audiências públicas. Princípio da precaução. Em matéria de meio ambiente vigora o princípio da precaução que, em situação como a dos autos, recomenda a realização de audiências públicas com a participação da população local. Agravo regimental não provido. (Superior Tribunal de Justiça – Corte Especial/ AgRg na SLS 1.552/BA/ Relator: Ministro Ari Pargendler/ Julgado em 16.05.2012/ Publicado no DJe em 06.06.2012).

 

Ementa: Pedido de Suspensão. Meio Ambiente. Princípio da Precaução. Em matéria de meio ambiente vigora o princípio da precaução. Esse princípio deve ser observado pela Administração Pública, e também pelos empreendedores. A segurança dos investimentos constitui, também e principalmente, responsabilidade de quem os faz. À luz desse pressuposto, surpreende na espécie a circunstância de que empreendimento de tamanho vulto tenha sido iniciado, e continuado, sem que seus responsáveis tenham se munido da cautela de consultar o órgão federal incumbido de preservar o meio ambiente a respeito de sua viabilidade. Agravo regimental não provido. (Superior Tribunal de Justiça – Corte Especial/ AgRg na SLS 1.564/MA/ Relator: Ministro Ari Pargendler/ Julgado em 16.05.2012/ Publicado no DJe em 06.06.2012).

 

Lançando mão das ponderações apresentadas por Colombo[50], o vocábulo precaução apresenta similitude idiomática com cuidado, logo, é imperioso, em razão do feixe irradiado pelo dogma em análise, o afastamento de perigo e manutenção da segurança das gerações futuras. Verifica-se que o preceito em testilha é a concreção da busca pela proteção da existência humana, seja pela proteção de seu ambiente como também pelo asseguramento da integridade da vida humana. Desta premissa, insta sustar que imperioso faz=se considerar não somente o risco eminente de uma específica atividade, mas também os riscos futuros advindos de empreendimentos humanos, os quais, devido à compreensão e ao atual estágio desenvolvimento da ciência, não consegue captar toda densidade. “A aplicação do princípio da precaução deve ainda limitar-se aos casos de ‘ética do cuidado’, que não se satisfaz apenas com a ausência de certeza dos malefícios, mas privilegia a conduta humana que menos agrida, ainda que eventualmente, o meio natural[51].

É denotável, deste modo, que a consagração do corolário da precaução se apresenta como robusto instrumento que estabelece a adoção de uma nova postura em relação à experimentação e à pesquisa com genoma humano, afixando, por via de consequência, a estruturação de medidas, tanto por parte do Estado quanto pela sociedade em geral, que obstem a instalação e desenvolvimento de atividade que tenha potencial lesivo. No que se referem às indústrias já instaladas, o princípio da precaução assume uma feição que busque cessar o dano já concretizado, minimizando os efeitos danosos provocados. “A leitura atenta do acórdão combatido revela que seu fundamento de decidir foi o princípio da precaução, considerando que, na dúvida, impõe-se a sustação dos licenciamentos e a realização de estudos de impacto ambiental, sob pena de o dano consumar-se[52], como o Ministro Mauro Campbell Marques explicitou, com clareza solar, ao relatoriar o Recurso Especial N° 1.163.939/RS.

A partir dos arestos coligidos, salta aos olhos que o princípio da vulnerabilidade, no cenário brasileiro, passou a gozar de proeminência, afigurando-se, inclusive, como bastião a embasar a construção de entendimentos jurisprudenciais sensíveis aos aspectos caracterizadores da pesquisa e experimentação com o genoma humano, sobretudo em decorrência dos aspectos contemporâneos que ofertam tutela jurídica ao tema em debate. Ora, em um ordenamento jurídico no qual restou devidamente consagrada a salvaguarda do patrimônio genético, dotado de acepção humanística de direito de quinta dimensão, bem como de solidariedade intergeracional, denota-se que o princípio em comento passa a figurar como mecanismo que visa assegurar a incolumidade do direito em destaque, notadamente em razão de encerrar o núcleo sensível de desenvolvimento do indivíduo, permitindo, em uma de suas facetas, a concreção da dignidade da pessoa humana.

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[2] SIQUEIRA, Dirceu Pereira; PICCIRILLO, Miguel Belinati. Direitos fundamentais: a evolução histórica dos direitos humanos, um longo caminho. In: Âmbito Jurídico, Rio Grande, XII, n. 61, fev. 2009. Disponível em: . Acesso em 15 jun. 2014.

[3] MORAES, Alexandre de. Direitos Humanos Fundamentais, Teoria Geral, Comentário dos art. 1º ao 5º da Constituição da Republica Federativa do Brasil de 1988, Doutrina e Jurisprudência. 9 ed. São Paulo: Editora Atlas, 2011, p. 06.

[4] ALVARENGA, Rúbia Zanotelli de. Os Direitos Humanos na perspectiva social do trabalho. Disponível em: . Acesso em 15 jun. 2014, p. 01.

[5] SIQUEIRA; PICCIRILLO, 2009. Acesso em 15 jun. 2014.

[6] MORAES, 2011, p. 06.

[7] CAMARGO, Caroline Leite de. Direitos humanos em face à história da humanidade. Revista Jus Vigilantibus. Disponível em: . Acesso em 15 jun. 2014.

[8] MORAES, 2011, p. 06.

[9] COMPARATO, Fábio Konder. A Afirmação Histórica dos Direitos Humanos. 3 ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2003, p.71-72.

[10] FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves, Direitos Humanos Fundamentais. 6 ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2004, p. 12.

[11] COMPARATO, 2003, p. 89-90.

[12] MORAES, 2011, p. 08-09.

[13] COMPARATO, 2003, p. 49.

[14] SILVA, 2004, p.155.

[15] SILVA, 2004, p. 157.

[16] BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 21 ed. atual. São Paulo: Editora Malheiros Ltda., 2007, p. 563.

[17] COTRIM, 2010, p. 160.

[18] SANTOS, Enoque Ribeiro dos. O papel dos direitos humanos na valorização do direito coletivo do trabalho. Jus Navigandi, Teresina, ano 8, n. 157, 10 dez. 2003. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/4609>. Acesso em: 15 jun. 2014.

[19] MORAES, 2011, p. 11.

[20] SANTOS, 2003. Acesso em: 15 jun. 2014.

[21] BONAVIDES, 2007, p. 564.

[22] FERREIRA FILHO, 2004, p. 47.

[23] BOBBIO, Norberto. A era dos direitos. Rio de Janeiro: Editora Campus, 1997, p. 03.

[24] BONAVIDES, 2007, p. 569.

[25] BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Acórdão proferido em Ação Direta de Inconstitucionalidade N° 1.856/RJ. Ação Direta De Inconstitucionalidade - Briga de galos (Lei Fluminense Nº 2.895/98) - Legislação Estadual que, pertinente a exposições e a competições entre aves das raças combatentes, favorece essa prática criminosa - Diploma Legislativo que estimula o cometimento de atos de crueldade contra galos de briga - Crime Ambiental (Lei Nº 9.605/98, art. 32) - Meio Ambiente - Direito à preservação de sua integridade (CF, Art. 225) - Prerrogativa qualificada por seu caráter de metaindividualidade - Direito de terceira geração (ou de novíssima dimensão) que consagra o postulado da solidariedade - Proteção constitucional da fauna (CF, Art. 225, § 1º, VII) - Descaracterização da briga de galo como manifestação cultural - Reconhecimento da inconstitucionalidade da Lei Estadual impugnada - Ação Direta procedente. Legislação Estadual que autoriza a realização de exposições e competições entre aves das raças combatentes - Norma que institucionaliza a prática de crueldade contra a fauna – Inconstitucionalidade. . Órgão Julgador: Tribunal Pleno. Relator: Ministro Celso de Mello. Julgado em 26 mai. 2011. Disponível em: . Acesso em 15 jun. 2014.

[26] MOTTA, Sylvio; BARCHET, Gustavo. Curso de Direito Constitucional. Rio de Janeiro: Editora Elsevier, 2007, p. 152.

[27] BONAVIDES, 2007, p. 569.

[28] MOTTA; BARCHET, 2007, p. 153. “[...] Duas são as origens básicas desses direitos: a degradação das liberdades ou a deterioração dos demais direitos fundamentais em virtude do uso nocivo das modernas tecnologias e o nível de desigualdade social e econômica existente entre as diferentes nações. A fim de superar tais realidades, que afetam a humanidade como um todo, impõe-se o reconhecimento de direitos que também tenham tal abrangência – a humanidade como um todo -, partindo-se da ideia de que não há como se solucionar problemas globais a não ser através de soluções também globais. Tais “soluções” são os direitos de terceira geração. [...]”

[29] BONAVIDES, 2007, p. 571.

[30] SERRAGLIO, 2008, p. 04.

[31] MOTTA; BARCHET, 2007, p. 153.

[32] LIMA NETO, Francisco Vieira. Direitos Humanos de 4ª Geração. Disponível em: . Acesso em: 15 jun. 2014.

[33] MOTTA; BARCHET, 2007, p. 153.

[34] VIEIRA, Tereza Rodrigues. Bioética e Direito. São Paulo: Editora Jurídica Brasileira, 1999, p. 18.

[35] MOTTA; BARCHET, 2007, p. 153.

[36] BRASIL. Constituição (1988). Constituição (da) República Federativa do Brasil. Brasília: Senado Federal, 1988. Disponível em: . Acesso em 15 jun. 2014: “Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá- lo para as presentes e futuras gerações. §1º - Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público: I - preservar e restaurar os processos ecológicos essenciais e prover o manejo ecológico das espécies e ecossistemas; [...] IV - exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente, estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará publicidade;  V - controlar a produção, a comercialização e o emprego de técnicas, métodos e substâncias que comportem risco para a vida, a qualidade de vida e o meio ambiente”.

[37] BRASIL. Lei Nº 11.105, de 24 de Março de 2005. Regulamenta os incisos II, IV e V do § 1o do art. 225 da Constituição Federal, estabelece normas de segurança e mecanismos de fiscalização de atividades que envolvam organismos geneticamente modificados – OGM e seus derivados, cria o Conselho Nacional de Biossegurança – CNBS, reestrutura a Comissão Técnica Nacional de Biossegurança – CTNBio, dispõe sobre a Política Nacional de Biossegurança – PNB, revoga a Lei no 8.974, de 5 de janeiro de 1995, e a Medida Provisória no 2.191-9, de 23 de agosto de 2001, e os arts. 5o, 6o, 7o, 8o, 9o, 10 e 16 da Lei no 10.814, de 15 de dezembro de 2003, e dá outras providências. Disponível em: . Acesso em 15 jun. 2014.

[38] FIORILLO, Celso Antônio Pacheco. Curso de Direito Ambiental Brasileiro. 13 ed., rev., atual e ampl. São Paulo: Editora Saraiva, 2012, p. 409.

[39] BRASIL. Constituição (1988). Constituição (da) República Federativa do Brasil. Brasília: Senado Federal, 1988. Disponível em: . Acesso em 15 jun. 2014.

[40] FIORILLO, 2012, p. 414.

[41] ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS. Declaração da Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento. Disponível em: . Acesso em 15 jun. 2014.

[42] THOMÉ, 2012, p. 69.

[43] BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Acórdão proferido em Agravo Regimental no Agravo em Recurso Especial Nº. 206.748/SP. Agravo Regimental em Agravo em Recurso Especial. Processual Civil. Direito Civil e Direito Ambiental. Construção de usina hidrelétrica. Redução da produção pesqueira. Súmula nº 7/STJ. Não cabimento. Dissídio notório. Responsabilidade objetiva. Dano inconteste. Nexo causal. Princípio da precaução. Inversão do ônus da prova. Cabimento. Precedentes. 1. Não há falar, na espécie, no óbice contido na Súmula nº 7/STJ, haja vista que os fatos já restaram delimitados nas instâncias ordinárias, devendo ser revista nesta instância somente a interpretação dada ao direito para a resolução da controvérsia. Precedentes. 2. Tratando-se de dissídio notório, admite-se, excepcionalmente, a mitigação dos requisitos exigidos para a interposição do recurso pela alínea "c" "quando os elementos contidos no recurso são suficientes para se concluir que os julgados confrontados conferiram tratamento jurídico distinto à similar situação fática" (AgRg nos EAg 1.328.641/RJ, Rel. Min. Castro Meira, DJe 14/10/11). 3. A Lei nº 6.938/81 adotou a sistemática da responsabilidade objetiva, que foi integralmente recepcionada pela ordem jurídica atual, de sorte que é irrelevante, na espécie, a discussão da conduta do agente (culpa ou dolo) para atribuição do dever de reparação do dano causado, que, no caso, é inconteste. 4. O princípio da precaução, aplicável à hipótese, pressupõe a inversão do ônus probatório, transferindo para a concessionária o encargo de provar que sua conduta não ensejou riscos para o meio ambiente e, por consequência, aos pescadores da região. 5. Agravo regimental provido para, conhecendo do agravo, dar provimento ao recurso especial a fim de determinar o retorno dos autos à origem para que, promovendo-se a inversão do ônus da prova, proceda-se a novo julgamento. Órgão Julgador: Terceira Turma. Relator: Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva. Julgado em 21.02.2013. Publicado no DJe em 27.02.2013. Disponível em: . Acesso em 15 jun. 2014.

[44] ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS. Declaração Universal do Genoma Humano e dos Direitos do Homem. Disponível em: . Acesso em 15 jun. 2014.

[45] RIO GRANDE DO SUL (ESTADO). Declaração Ibero-Americana sobre Ética e Genoma. Disponível em: . Acesso em 15 jun. 2014.

[46] MELIM, Lucia A. Princípio da Precaução: Uma Maneira Sensata de Proteger a Saúde Pública e o Meio-Ambiente. Disponível em: . Acesso em 15 jun. 2014.

[47] COLOMBO, Silvana Brendler. O princípio da precaução no Direito Ambiental. Revista Jus Navigandi, Teresina, ano 9, n. 488, 7 nov. 2004. Disponível no site: . Acesso em 15 jun. 2014.

[48] BRASIL. Lei Nº. 6.938, de 31 de Agosto de 1981. Dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, seus fins e mecanismos de formulação e aplicação, e dá outras providências. Disponível em: . Acesso em 15 jun. 2014: “Art. 4º - A Política Nacional do Meio Ambiente visará: I - à compatibilização do desenvolvimento econômico-social com a preservação da qualidade do meio ambiente e do equilíbrio ecológico; [omissis] IV - ao desenvolvimento de pesquisas e de tecnologias nacionais orientadas para o uso racional de recursos ambientais”.

[49] THOMÉ, 2012, p. 69-70.

[50] COLOMBO, 2004.

[51] THOMÉ, 2012, p. 70.

[52] BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Acórdão proferido em Recurso Especial N° 1.163.939/RS Processual civil. Violação ao art. 535 do CPC. Alegações genéricas. Incidência da súmula n. 284 do STF, por analogia.  Fundamentos adotados pela origem não combatidos na integralidade pelo especial. Súmula n. 283 do STF, por analogia. Razões recursais incompatíveis com a realidade dos autos. Não-indicação de dispositivos infraconstitucionais violados ou sobre os quais recaem a divergência jurisprudencial. Aplicação da súmula n. 284 do STF, por analogia. 1. Nas razões recursais, sustenta a parte recorrente ter havido violação aos arts. 535 do Código de Processo Civil (CPC), ao argumento de que o acórdão não debateu matéria constitucional, e 4º e 6º da Lei de Introdução do Código Civil - LICC e 126 do CPC, porque não existe fundamento legal para exigir regulamentação do conceito de "estrada-parque". Alega, ainda, violação ao princípio da proporcionalidade. 2. Não se pode conhecer da apontada violação ao art. 535 do CPC pois as alegações que fundamentaram a pretensa ofensa são genéricas, sem discriminação dos pontos efetivamente omissos, contraditórios ou obscuros ou sobre os quais tenha ocorrido erro material. Incide, no caso, a Súmula n. 284 do Supremo Tribunal Federal (STF), por analogia. 3. A leitura atenta do acórdão combatido revela que seu fundamento de decidir foi o princípio da precaução, considerando que, na dúvida, impõe-se a sustação dos licenciamentos e a realização de estudos de impacto ambiental, sob pena de o dano consumar-se. Não houve combate a esta tese no recurso especial, razão pela qual aplica-se analogicamente a Súmula n. 283 do STF. 4. As razões recursais revelam-se incompatíveis com a realidade dos autos, porque a definição legal do conceito de estrada-parque não foi o argumento do voto condutor do acórdão recorrido, o que atrai a incidência da Súmula . 284 do STF, por analogia. 5. Ainda por cima de tudo, dos dispositivos indicados não se tira a tese recursal, novamente atraindo analogicamente a Súmula n. 284 do STF. 6. Em relação à ofensa ao princípio da proporcionalidade, a parte recorrente não apontou dispositivo de legislação infraconstitucional a permitir o conhecimento do especial seja pela alínea "a", seja pela alínea "c" do permissivo constitucional. 7. Recurso especial não conhecido. Órgão Julgador: Segunda Turma. Relator: Ministro Mauro Campbell Marques. Julgado em 14.12.2010. Publicado no DJe em 08.02.2011. Disponível em: . Acesso em 15 jun. 2014.

 

 

Elaborado em junho/2014

 

Como citar o texto:

RANGEL, Tauã Lima Verdan..Notas ao Reconhecimento do Princípio do Respeito à Dignidade Humana em sede de Patrimônio Genético. Boletim Jurídico, Uberaba/MG, a. 22, nº 1175. Disponível em https://www.boletimjuridico.com.br/artigos/direito-constitucional/3128/notas-ao-reconhecimento-principio-respeito-dignidade-humana-sede-patrimonio-genetico. Acesso em 28 jun. 2014.

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