Resumo: O presente artigo visa esclarecer os aspectos gerais da ação de inconstitucionalidade por omissão (ADO) com intuito de tornar acessível o tema para aqueles que o buscam pela primeira vez bem como para sanar eventuais dúvidas daqueles que já o conhecem.

Palavras-Chaves: ADO, Inconstitucionalidade, Omissão, Direito Constitucional.

INTRODUÇÃO

            Trataremos aqui aquele que é considerado por Gilmar Mendes "um dos mais fascinantes temas do direito constitucional modernos" (MENDES, 2012), a ação direta de inconstitucionalidade por omissão, ou ADO, instrumento do controle de constitucionalidade concentrado, cuja competência para julgamento, no nosso ordenamento jurídico, é exclusiva do STF .

            Com fim de dar uma definição simples do assunto, para ilustrar ou relembrar o leitor acerca do tema tratado neste artigo, nos valeremos das palavras de Leo Van Holth "a inconstitucionalidade por omissão ocorre quando a Constituição exige a edição de ato normativo para o exercício de um direito constitucional e o órgão legislativo competente mantêm-se inerte." (HOLTH, 2009). Cumpre citar também José Afonso da Silva para dirimir eventuais dúvida, aduz o autor que a inconstitucionalidade por omissão "Verifica-se nos casos em que não sejam praticados atos legislativos ou administrativos requeridos para tornar plenamente aplicáveis normas constitucionais

            A ADO trata-se de inovação introduzida em nosso ordenamento jurídico pela Constituição de 1988 (CF-88, como será tratada a partir deste momento), podemos ver na Constituição portuguesa sua inspiração direta, observe o art. 283, que possui a seguinte redação:

"Artigo 283, Inconstitucionalidade por omissão:

1. A requerimento do Presidente da República, do Provedor de Justiça ou, com fundamento em violação de direitos das regiões autônomas, dos presidentes das Assembleias Legislativas das regiões autônomas, o Tribunal Constitucional aprecia e verifica o não cumprimento da Constituição por omissão das medidas legislativas necessárias para tornar exequíveis as normas constitucionais.

2. Quando o Tribunal Constitucional verificar a existência de inconstitucionalidade por omissão, dará disso conhecimento ao órgão legislativo competente."

 

            Percebemos uma grande semelhança com art. 103, § 2º da nossa CF-88 que prescreve:

"Declarada a inconstitucionalidade por omissão de medida para tornar efetiva norma constitucional, será dada ciência ao Poder competente para a adoção das providências necessárias e, em se tratando de órgão administrativo, para fazê-lo em trinta dias."

 

            Além da inspiração portuguesa podemos nos remeter, também, à jurisprudência da Corte Constitucional alemã. Afirma Gilmar Mendes que, o estudo sistemático da teoria da omissão constitucional constituía,“até muito pouco tempo, monopólio da dogmática constitucional alemã” (MENDES,2012). Percebemos assim que a omissão constitucional é tema recente no mundo jurídico, constituindo um grande avanço a sua inserção na ordem jurídica brasileira por meio da CF-88.

OBJETO E OBJETIVO

            A ADO é uma forma de combater a chamada "síndrome de inefetividade das normas constitucionais" (LENZA, 2012), a CF-88 aduz, em diversas normas, a necessidade da edição de leis que regulamente aquilo que prescreve seus dispositivos de eficácia limitada, bom exemplo é o art. 37, VII, que prevê a necessidade de edição de lei

específica que regulamente o exercício do direito de greve do servidor público, cabe mencionar aqui que tal matéria foi objeto de vários Mandados de Injunção, como o MI 708 onde se determinou que, por analogia, aplica-se à greve dos serviços públicos as mesmas regras dos particulares, importante ressaltar que o Mandado de Injunção é também uma espécie de ação que busca suprimir uma omissão legislativa, uma grande diferença entre esta e a ADO é que, aquela se exerce pela via incidental, e esta, pela via principal.

            Ora, apenas o texto Constitucional não contém toda a regulamentação necessária para o funcionamento estatal, fazendo-se mister a edição de normas infraconstitucionais que complementem suas lacunas, em outras palavras Gilmar Mendes nos diz que "a concretização da ordem fundamental estabelecida na Constituição de 1988 carece, nas linhas essenciais, de lei. Compete às instâncias políticas e, precipuamente, ao legislador, a tarefa de construção do Estado constitucional." (MENDES, 2012). Observando o mesmo autor que a realização das normas constitucionais de eficácia limitada são dotadas de uma complexidade muito maior que uma mera formalidade, pois

"Ela é fundamental sobretudo para a concretização da Constituição como um todo, isto é, para a realização do próprio Estado de Direito democrático, fundado na soberania, na cidadania, na dignidade da pessoa humana, nos valores sociais do trabalho, da iniciativa privada, e no pluralismo político, tal como estabelecido no art. 1º da Carta Magna." (MENDES, 2012).

            Por fim, cabe mencionar que apenas as omissões normativas estaduais e federais poderão ser impugnadas por ADO, “bem como as omissões do Distrito Federal concernentes a suas competências estaduais” (PAULO,ALEXANDRINO, 2010).

ESPÉCIES

            Podemos falar na existência de omissão total ou parcial. A definição dada por Gilmar Mendes é simples, porém, completa, e merece transcrição:

"Tem-se omissão absoluta quando o legislador não empreende a providência legislativa reclamada. Constatam-se semelhanças com a omissão total ou absoluta nos casos em que existe um ato normativo, que, todavia, atende parcialmente a vontade constitucional. Trata-se de omissão parcial." (MENDES, 2012)

            Trataremos aqui, também, de um tema interessante, que poderá, no futuro, configurar uma nova espécie de ADO. O poder legislativo detém suas peculiaridades, demandando tempo para a análise de suas questões fazendo com que projetos legislativos tramitem por dias, meses e, até mesmo, anos, tais peculiaridades são conhecidas, e, em alguns casos, justificáveis (como quando da edição de novo Código, cuja análise não pode ser feita de forma afoita.), mas há também casos de mera desídia do legislador, onde este prolonga por anos a fio a tramitação de um projeto injustificadamente. Surge então a duvida, pode-se falar em omissão legislativa após a deflagração do processo legislativo? Tratando do julgamento da ADI 3.682, Gilmar Mendes faz a seguinte constatação

"a inertia deliberandi (discussão e votação) também poderia configurar omissão passível de vir a ser reputada inconstitucional, no caso de os órgãos legislativos não deliberarem dentro de um prazo razoável sobre o projeto de lei em tramitação."

 

            Ou seja, o posicionamento do STF de que não há inconstitucionalidade por omissão após deflagração do processo está sendo relativizado, passa-se a ser objeto de análise, também, a morosidade injustificada do poder legislativo, e isso deve ser objeto de nossa atenção pois configura uma importante novidade na Ordem jurídica de nosso país.

CURIOSIDADE

            A ADO passou a ter seu processo regulado pela lei 12.063 de 27 de outubro de 2009, que acrescentou o Capítulo II-A à lei 9.868 de 10 de novembro de 1999. surge o seguinte questionamento, passaram-se 21 anos desde o nascimento da CF-88 até a concepção da lei 12.063, um interstício demasiado longo em se tratando de norma que regula o processo legal de um instrumento de controle de constitucionalidade, ora, nesse caso era de se pensar, enquanto se estivesse nesse hiato, na possibilidade de uma ação para suprir essa omissão do legislador, sendo que, em tal situação, caberia a própria ADO, ou seja, poderia ocorrer um fenômeno bastante peculiar, a existência de uma ação direta de inconstitucionalidade por omissão buscando solucionar a falta de previsão legal para o processo da ação direta de inconstitucionalidade por omissão.

REFERÊNCIAS

BARROSO, Luís Roberto. O controle de constitucionalidade no direito brasileiro: exposição sistemática da doutrina e análise crítica da jurisprudência. 6. ed. - São Paulo  : Saraiva, 2012.

HOLTHE, Leo Van. Direito Constitucional. 5. ed. Salvador : Editora Juspodivm

LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado. 16. ed. São Paulo : Saraiva, 2012

MENDES, Gilmar Ferreira. BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de direito constitucional. 7. ed. - São Paulo : Saraiva, 2012.

PAULO, Vicente. ALEXANDRINO, Marcelo. Resumo de direito constitucional descomplicado. 3. ed. Rio de Janeiro : Forense ; São Paulo : MÉTODO, 2010

SILVA, José Afonso Da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 25. ed. São Paulo : Malheiros Editores, 2005

 

 

Elaborado em setembro/2014

 

Como citar o texto:

MAIA, Felipe Martins..Aspectos gerais da ação de inconstitucionalidade por omissão: História, Espécies, Objetos e Objetivos. Boletim Jurídico, Uberaba/MG, a. 23, nº 1197. Disponível em https://www.boletimjuridico.com.br/artigos/direito-constitucional/3230/aspectos-gerais-acao-inconstitucionalidade-omissao-historia-especies-objetos-objetivos. Acesso em 24 set. 2014.

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