A Constituição Federal de 1988 deferiu à União competência para autorizar e fiscalizar a produção e o comércio de material bélico. Eis o teor do art. 21, VI, da CF/88:

"Art. 21. Compete à União:

.........................................

VI - autorizar e fiscalizar a produção e o comércio de material bélico."

Portanto, a comercialização de materiais bélicos está sujeita unicamente ao controle federal. Neste sentido, estabelece o art. 13 da Lei nº 9.437/97 que "compete ao Ministério do Exército autorizar e fiscalizar a produção e o comércio de armas de fogo e demais produtos controlados, inclusive o registro e o porte de tráfego de arma de fogo de colecionadores, atiradores e caçadores".

Por outro lado, não se discute, dentre os juristas, que na expressão material bélico, consignada no supratranscrito art. 21, VI, da Constituição Federal, insere-se também o comércio de armas e munições, ainda que estas não se destinem a guerras externas. Assim é que, em seus comentários ao citado preceito da Lei Magna, assentou José Celso de Mello Filho:

"As atividades econômicas consistentes na produção e comercialização de materiais bélicos ficam sujeitos ao controle federal, que se materializa mediante atos de autorização de fiscalização. Tudo aquilo que se relacione à pesquisa, desenvolvimento e produção de armas, munições e equipamentos pertinentes, submete-se à atividade fiscalizadora da União. As empresas privadas, que se dediquem a tais atividades especializadas, dependem, para funcionar, de autorização do Governo Federal (Lei nº 6.404, de 15.12.1976, artigo 3000, c/c Decreto Federal nº 24.602, de 06.07.34). Material bélico: É definido pelo Decreto Federal nº 55.649, de 28 de janeiro de 1965, que estabelece o regulamento para o serviço de fiscalização da fabricação, recuperação, manutenção, utilização industrial, manuseio, exportação, importação, desembaraço alfandegário, armazenamento, comércio, e tráfico de armas, munições, petrechos, artigos pirotécnicos, pólvora, explosivos e seus elementos e acessórios (espoletas, estopins, cordéis, detonantes), produtos químicos básicos e opressivos" (José Celso de Mello Filho, Constituição Federal Anotada, págs. 31/32)

Também Crettela Júnior, ao interpretar o dispositivo constitucional em causa, é incisivo:

"A expressão material bélico, lato sensu, como empregada na Constituição, designa todo e qualquer tipo de objeto ou instrumento (metralhadora, canhão, revólver, dinamite, bomba, granada) aparelho (avião), carros blindados, navios, submarinos, utilizados pelas forças armadas quando em conflito externo ou na manutenção da ordem interna. Comércio e a operação mercantil de compra e venda. A Lei fala também em fiscalização e esta se insere no poder de polícia do Estado. Só a União é competente para autorizar a produção e o comércio de material bélico". (Crettela Júnior, Comentários à Constituição de 1988, vol. III, p. 1.357)

Outro preceito constitucional que deve ser levado em consideração é o inscrito no art. 24, inciso V e parágrafos, da Constituição Federal, onde se estabelece a competência da União, dos Estados e do Distrito Federal para legislar, concorrentemente, sobre produção e consumo.

Como se sabe, no âmbito da legislação concorrente a competência da União limitar-se-á a estabelecer normas gerais (art. 24, § 1º, da CF/88), competindo aos Estados e ao Distrito Federal exercer a competência legislativa plena, para atender a suas peculiaridades, unicamente quando inexistir lei federal sobre normas gerais (art. 24, § 3º, da CF/88).

Nessa ordem de idéias, a já diversas vezes mencionada Lei nº 9.437/97 institui o "Sistema Nacional de Armas" e deferiu competência ao então denominado Ministério do Exército para autorizar e fiscalizar a produção e o comércio de armas de fogo.

Destarte, leis estaduais que pretendam proibir a produção e comercialização de armas de fogo e munições revelar-se-ão contrárias à disposição de norma federal editada no uso da competência da União para estabelecer normas gerais sobre produção e consumo, razão pela qual padecerão de inconstitucionalidade por violação ao art. 24, V e § 1º, da Constituição Federal.

Foram estes argumentos que levaram o Plenário do Supremo Tribunal Federal a deferir medida cautelar para suspender, até decisão final da Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 2.035-8/RJ, a eficácia da Lei nº 3.219, de 04 de junho de 1999, do Estado do Rio de Janeiro, norma que proibia a comercialização de armas de fogo, peças avulsas, acessórios, munições e afins em todo o território do Estado do Rio de Janeiro.

(Data de Confecção: setembro de 2003)

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Como citar o texto:

PINTO JÚNIOR, Paulo Roberto Fernandes..A impossibilidade de edição de leis estaduais para regular a produção e o comércio de armas de fogo e munições. Boletim Jurídico, Uberaba/MG, a. 2, nº 112. Disponível em https://www.boletimjuridico.com.br/artigos/direito-constitucional/459/a-impossibilidade-edicao-leis-estaduais-regular-producao-comercio-armas-fogo-municoes. Acesso em 29 jan. 2005.

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