A pequena propriedade rural familiar possui o respaldo legal da impenhorabilidade, em se tratar de propriedade, de até quatro módulos fiscais e seja local de moradia e subsistência da família. A presente proteção visa garantir que mesmo em casos de dificuldade financeira possam ter respaldado o mínimo de qualidade de vida em sua casa, porém para que pequena propriedade rural esteja respaldada pela legislação ela deve atender a função social da propriedade sendo o disposto no artigo 170 da Constituição Federal, devendo a propriedade devidamente utilizada de forma racional e adequada, visando o bem-estar da família ali residente e produtora, sendo o local de moradia e subsistência da família. Necessário se faz destacar que ao analisar os julgados dos Tribunais Superiores os mesmos têm se atentado a aplicar de fato o que o que está disposto em Lei, concedendo a garantia de direitos aos que os tem.

INTRODUÇÃO

De início, importante destacar que a pequena propriedade rural tem função primordial para a sobrevivência das famílias que retiram seu sustento da agricultura e, ainda, muitas delas abastecem o mercado interno do país, o que beneficia outras famílias. O objetivo buscado no presente trabalho é demonstrar de forma clara e de fácil compreensão aos leitores, o porquê da outorga aos pequenos produtores rurais a impenhorabilidade de sua pequena propriedade rural, desde que atendidos dois requisitos estabelecidos pela lei, construção doutrinária e precedente dos Tribunais Superiores.

Dentre as garantias constitucionais que resguarda a impenhorabilidade da pequena propriedade rural e a mais valiosa de todos, é o princípio da dignidade da pessoa humana, que tem como escopo garantir as condições mínimas de sobrevivência para o ser humano, dentre elas: alimentação, saúde, educação e moradia. A pequena propriedade rural, para que receba o amparo legal de impenhorabilidade, deve estar atrelada a dois requisitos basilares, que são: “a definição de pequena propriedade rural” e “desde que trabalhada pela família”, pois visa dar subsídios para que as famílias do campo permaneçam em atividade produtiva de subsistência.

 A impenhorabilidade da pequena propriedade rural é garantia constitucional pouco conhecida pelos produtores rurais que laboram juntamente com a família como meio de sobrevivência, sendo que a maioria não possui conhecimento sobre seus direitos e acabam entregando suas propriedades para as grandes empresas ou bancos.

Importante destacar que a Constituição Federal de 1988 introduziu no seu texto o artigo 5º inciso XXVI a impenhorabilidade da pequena propriedade rural, definida em lei, trabalhada pela família a sua impenhorabilidade como direitos e garantias fundamentais. Tais direitos e garantias fundamentais visam dar efetividade ao princípio da dignidade da pessoa humana daqueles que laboram no campo para obter subsistência própria e de sua família e de manter o patrimônio mínimo. Para fins de aplicação da impenhorabilidade da pequena propriedade rural é necessário destacar que a lei impõe outro requisito que é a limitação de até 4 (quatro) módulos rurais de cada região, independentemente se forem áreas continuas.

 

1 DA PROPRIEDADE 

Para melhor e de fato compreender quais são as garantias e direitos que a propriedade possui, é necessária uma análise geral, principalmente, tendo em vista as várias transformações sofridas ao longo do tempo e evolução da legislação.

Antes de adentrar em qualquer tema abordado em pesquisas, é de suma importância conhecer a origem histórica, principalmente quando toda a construção legal e doutrinária tem como princípios basilares os direitos e garantias individuais, atrelados ao contexto social da época. 

No Brasil, o direito a propriedade passou a ter amparo legal na Constituição Federal de 1988, mais precisamente em seu artigo 5º, inciso XXIII, previsto como direitos e garantias fundamentais do indivíduo. Mais adiante, o texto constitucional cuidou de dar obrigações a esse direito, passando a regulamentar a destinação da propriedade rural como política agrícola e fundiária e reforma agrária, conforme rezam os artigos 184 a 191.

A origem mais remota sobre a propriedade, como registram doutos doutrinadores, segundo (MARQUES, 2015 p.36) foi o filósofo grego Aristóteles, que assim entendia: 

[...] que aos bens se devia dar uma destinação social, para o que, a seu pensar, seria necessária a apropriação pessoal. Esta justificaria aquela, vale dizer, o homem tinha o direito de possuir bens e deles retirar a sua própria manutenção, mas também deveria satisfazer os outros

Tal posicionamento do filósofo somente ganhou força com a valorosa pregação da Igreja Católica, tendo como propulsor Santo Tómas de Aquino, com a sua “Summa Theológica”, que passou então a disseminar o sentido de bem como. “Para ele, o homem tinha o direito natural de adquirir bens materiais, até para manter a própria sobrevivência. Mas não podia abstrair o dever do “bem comum””. (MARQUES, 2015, p.37)

A partir disso, o estudioso e professor francês Duguit, calcado nos posicionamentos positivista de Comte, despiu o caráter subjetivista sobre o direito de propriedade, passando a conceitua-la como uma função social, em si. Em continuidade ao contexto histórico, leciona o doutrinador Benedito Ferreira Marques (2015, p.36): 

Para o grande jurista francês, que era Professor de Direito Constitucional da Faculdade de Direito de Bordéus, na França, a propriedade não era um direito subjetivo, mas a subordinação da utilidade de um bem a um determinado fim, conforme do direito objetivo. O grande impulso da doutrina da função social, portanto, deveu-se a Duguit, a partir de vigorosa palestra que proferiu, em 1911, na Faculdade de Direito de Buenos Aires, na Argentina

Com a evolução da sociedade europeia, a propriedade ganhou caráter absoluto no Código de Napoleão, que entrou em vigor em 21 de março de 1804, o qual influenciou inclusive o antigo Código Civil de nosso país. Atualmente, pelo Código Civil Brasileiro, o art. 1228[4] e seus parágrafos, definem os direitos do proprietário sobre o imóvel, bem como o exercício do direito de propriedade previamente estabelecidas.

Podemos conceituar a propriedade, valendo-nos do art. 1.228 do CC, como um direito complexo decorrente de uma garantia fundamental do homem, assegurando ao seu titular o poder de usar, fruir e dispor da coisa, podendo, ainda, reavê-la de quem quer que injustamente a possua ou tenha, em consonância e nos limites da função econômica e social. (KUMPEL, 2008, p. 79)

No Brasil, a concepção de função social da propriedade não é recente, vindo desde a época das Sesmarias, no período colonial, que já se preocupavam com o cumprimento da função social, na qual inseria cultivar a terra e dar-lhe sentido de proveito econômico para a família e para a sociedade. Em 1964, pelo Estatuto da Terra, o acesso à propriedade da terra foi condicionado a sua função social, na forma prevista no art. 2º, simultaneamente. 

Doutrinariamente, Rosalina Pinto da Costa Rodrigues Pereira (apud MARQUES, 2015, p.41) pontua os requisitos necessários para a configuração da função social da terra, sendo eles: “(a) econômica; (b) social; e (c) ecológica. A primeira refere-se ao requisito da “produtividade”, ou seja, aproveitamento racional e adequado, já analisado. É o único que a Lei nº 8.629/93 exige para a identificação da “Propriedade Produtiva” (art. 6º). A segunda abraça, a um só tempo, dois requisitos: a observância das disposições que regulam as relações de trabalho e o favorecimento do bem-estar dos proprietários e dos trabalhadores rurais. A terceira cuida dos requisitos relativos à utilização dos recursos naturais e à preservação do meio ambiente”.

 

1.1 Evolução e conceito da propriedade na legislação brasileira

A partir do descobrimento do Brasil até o primeiro Código Civil Brasileiro, que se deu em 1916, as leis que vigoravam no país eram as ordenações do reino, por isso diversos costumes de Portugal foram incorporados na colônia e adaptados à realidade da mesma.

A primeira constituição brasileira em que expressamente legislava sobre a propriedade foi a 1824, que instituiu a plenitude da inviolabilidade da propriedade, com exceção quando da necessidade do Ente Público, mediante prévia indenização.

A presente Constituição garantiu como um todo a plenitude do direito à propriedade, nos mesmos moldes da Declaração dos Direitos do Homem em 1789 e do Código de Napoleão (CAVEDON, 2003)

Já na Constituição de 1891 em seu artigo 72 garantiu o direito à propriedade com traços do individualismo:

Art 72 - A Constituição assegura a brasileiros e a estrangeiros residentes no País a inviolabilidade dos direitos concernentes à liberdade, à segurança individual e à propriedade, nos termos seguintes:

[...]

§ 17 - O direito de propriedade mantém-se em toda a sua plenitude, salva a desapropriação por necessidade ou utilidade pública, mediante indenização prévia. As minas pertencem aos proprietários do solo, salvas as limitações que forem estabelecidas por lei a bem da exploração deste ramo de indústria.

O legislador visou garantir que a plenitude do direito à propriedade e utilização por parte do seu proprietário, deixando espaço para intervenção do Ente Público, caso necessário.

Com a promulgação da Constituição de 1934 surgiu e reconheceu o direito individual da propriedade, mas ao mesmo tempo exigiu que o direito coletivo sobreponha ao direito individual. Já a Constituição Federal de 1937 não teve nenhuma alteração do direito à propriedade no ponto de vista social (CHEMERIS, 2003, p. 59).

Em caminho contrário a Constituição de 1937, a de 1946 em seu artigo 147 estabeleceu que:

Art 147 - O uso da propriedade será condicionado ao bem-estar social. A lei poderá, com observância do disposto no art. 141, § 16, promover a justa distribuição da propriedade, com igual oportunidade para todos (BRASIL, 1937).

A maior inovação da presente Constituição foi de estabelecer a desapropriação para atender ao interesse social, e garantir a justa distribuição e igual oportunidade ao acesso a propriedade.

Já a Constituição de 1967 promulgada no regime militar, elevou a função social da mesma, mas como incentivo para que o proprietário a utilizasse de forma mais proveitosa possível para ele e para a sociedade (WALD, p. 104)

Por fim a Constituição de 1988 preconiza o direito à propriedade, garantindo expressamente que a função social deve ser exercida fielmente, principalmente no exposto dos artigos 5º e 170º

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

XXII - é garantido o direito de propriedade;

XXIII - a propriedade atenderá a sua função social;

XXIV - a lei estabelecerá o procedimento para desapropriação por necessidade ou utilidade pública, ou por interesse social, mediante justa e prévia indenização em dinheiro, ressalvados os casos previstos nesta Constituição;

XXV - no caso de iminente perigo público, a autoridade competente poderá usar de propriedade particular, assegurada ao proprietário indenização ulterior, se houver dano;

XXVI - a pequena propriedade rural, assim definida em lei, desde que trabalhada pela família, não será objeto de penhora para pagamento de débitos decorrentes de sua atividade produtiva, dispondo a lei sobre os meios de financiar o seu desenvolvimento;

 Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios:

[...]

II - propriedade privada;

III - função social da propriedade; (BRASIL, 1988).

A partir de então a propriedade está amparada como direito fundamental, desde que a mesma cumpra a sua função social, por essa razão de ser de tutela e garantia da propriedade privada.

Segundo FIUZA, FREIRE DE SÁ, NAVES (2009, p.455) “a ordem constitucional jurídica reconheceu o exercício da propriedade no interesse do titular e também no interesse coletivo da sociedade, afastando-se da visão individualista e patrimonialista”.

Faz-se interessante notar que a Constituição reservou à função social da propriedade a natureza de princípio próprio e autônomo, criando um parâmetro interpretativo do ordenamento jurídico, completa CHEMERIS:

No sistema jurídico contemporâneo, a propriedade resta positivada entre os direitos e garantias do cidadão, enquanto princípio jurídico de garantia de propriedade privada, e se relativiza diretamente por outro princípio jurídico, igualmente positivado, que é o da sua função social (2003, p. 61).

Como se vê, ainda que de forma singela à época, o direito à propriedade sempre esteve atrelado a desempenhar sua função social para a sobrevivência do ser humano, contudo, veio ganhando total relevância na sociedade civil após a promulgação da Constituição Federal da República de 1988.

 

1.2 Princípios do Direito Agrário aplicáveis a propriedade

1.2.1 Princípio da Função Social da propriedade

O primeiro princípio a ser destacado é o princípio da função social da propriedade, constante na Constituição Federal de 1988 no art. 5º, XXIII e também no art. 186) assegura o direito à propriedade desde que a propriedade cumpra a sua função social.

Ressalta-se que em um primeiro momento da história as terras não eram propriedade individual, segunda explana Carvalho, Fidelis e Maciel (2018), mas sim para sua exploração e produção, a ideia de usar e gozar da propriedade em desfavor do interesse social é considerado recente na história, de certa forma uma base para o capitalismo, explicado por Dávila:

Assim, serviu o desenvolvimento do princípio da função social da propriedade a dois propósitos distintos e aparentemente contraditórios, quais sejam, criticar o caráter absolutista da propriedade, e reafirmá-la enquanto direito, tornando possível a sua sustentação num mundo que em os bens, ainda que privados, devem apresentar alguma utilidade social (apud apud Carvalho, Fideles e Maciel (2018, p. 40)

Vale destacar o que já foi mencionado anteriormente as Constituições brasileiras já asseguravam o direito de propriedade, mas em sua plenitude, apenas na Constituição de 1934 que esse direito passou a ter a necessidade de ter o exercício do interesse social e coletivo.

Porém de fato, segundo Carvalho, Fideles e Maciel:

Foi, contudo, com o Estatuto de Terra (Lei nº 4.504/64) que o princípio da função social da propriedade foi efetivamente instituído na legislação brasileira, nos termos do seu art. 2º. Assegurou o Estatuto a oportunidade a todos de acesso à propriedade da terra, que seria condicionada pela sua função social, cujo desempenho se daria quando a propriedade simultaneamente: a) favorecer o bem-estar dos proprietários e dos trabalhadores que nela labutam, assim como de suas famílias; b) manter níveis satisfatórios de produtividade; c) assegurar a conservação dos recursos naturais; e d) observar as disposições legais que regulam as justas relações de trabalho entre os que possuem e a cultivam (2018, p. 41, grifo do autor).

Em determinadas situações tem sido confundido o direito a função social com a defesa do meio ambiente, considerando o aspecto público da terra, porém as duas são cumulativas e não apenas atender a função social em razão da defesa ao meio ambiente nela contido.

Quando o proprietário não utilizado que não promova o seu adequado aproveitamento, segundo o artigo 186º da Constituição Federal de 1988 estará sob pena de aplicação de três sanções:

Art. 186. A função social é cumprida quando a propriedade rural atende, simultaneamente, segundo critérios e graus de exigência estabelecidos em lei, aos seguintes requisitos:

I - aproveitamento racional e adequado;

II - utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e preservação do meio ambiente;

III - observância das disposições que regulam as relações de trabalho;

IV - exploração que favoreça o bem-estar dos proprietários e dos trabalhadores. (BRASIL, 1988)

Como é possível observar o Legislador primou para o cumprimento da função social da propriedade, tornando esse um direito fundamental.

A função social da propriedade rural tem o caráter econômico e ambiental do uso da terra, primando para o bem-estar social, segundo o artigo 2º, §1º do Estatuto da Terra (Lei nº 4.504/64) e o artigo acima citado da Constituição Federal.

Portanto, a existência de um sujeito detentor de diretos também passa a ser detentor de deveres, assim não existe a possibilidade de considerar o princípio da função social da propriedade e não considerar a propriedade privada, como sendo detentora de direitos e deveres.

Não é possível deixar de reconhecer que a função social da propriedade é um princípio basilar no que tange a esse tema, pois garante que os seus proprietários de fato exerçam os seus direitos sem se afastar do cumprimento de seus deveres.

 

1.2.2 Princípio do Progresso Socioeconômico 

O objetivo primordial do direito agrário é o crescimento e progresso econômico em si, o crescimento das produções e vendas do que produz, objetivando o enriquecimento da comunidade rural. 

Conforme Carvalho, Fideles e Maciel expõe que “que a finalidade da política de reforma agrária é promover a melhor distribuição de terra, de modo a atender aos princípios da justiça social e ao aumento da produtividade (2018, p. 45).”

É possível atentar que o direito agrário em si visa o crescimento econômico e distribuição de oportunidade a todos os que tem esse intuito.

 

1.2.3 Princípio da Proteção à propriedade ou posse rural familiar 

O presente princípio tem por intuito garantir a proteção do proprietário que cultive na terra, esse princípio está presente no parágrafo 3º do artigo 2º do Estatuto da Terra, que diz:

Art. 2° É assegurada a todos a oportunidade de acesso à propriedade da terra, condicionada pela sua função social, na forma prevista nesta Lei.

[...]

 § 3º A todo agricultor assiste o direito de permanecer na terra que cultive, dentro dos termos e limitações desta Lei, observadas sempre que for o caso, as normas dos contratos de trabalho. (BRASIL, 1964).

Além do acima citado está presente na Constituição Federal de 1988, que garante ao proprietário que trabalha na terra e possui sua subsistência por meio dela não terá sua propriedade como objeto de penhora para quitação de débitos, mas que a Lei deverá dispor meios para pagamentos dos débitos, como financiamentos especiais, dentre outras condições (Carvalho, Fideles e Maciel, 2018).

 

2 PEQUENA PROPRIEDADE RURAL E SUA PROTEÇÃO

Aprofundando um pouco mais sobre o tema proposto, se faz necessário consignar a definição de pequena propriedade rural na legislação brasileira e seu conceito doutrinário.

Em 1964, com a promulgação do então Estatuto da Terra, preocupou-se em definir o que é imóvel rural, o que prescreve o art. 4º - Para os efeitos desta lei, definem-se: I – Imóvel rural, o prédio rústico, de área contínua, qualquer que seja a sua localização, que se destine a exploração extrativa agrícola, pecuária ou agroindustrial, quer através de planos públicos de valorização, quer através da iniciativa privada.

O Estatuto da Terra previu também a classificação do imóvel rural como: propriedade familiar, minifúndio, latifúndio e empresa rural, os quais estão descritos nos incisos II, IV, V e VI. Vejamos:

Art. 4º.

[...]

II - "Propriedade Familiar", o imóvel rural que, direta e pessoalmente explorado pelo agricultor e sua família, lhes absorva toda a força de trabalho, garantindo-lhes a subsistência e o progresso social e econômico, com área máxima fixada para cada região e tipo de exploração, e eventualmente trabalho com a ajuda de terceiros;

[...]

IV - "Minifúndio", o imóvel rural de área e possibilidades inferiores às da propriedade familiar;

V - "Latifúndio", o imóvel rural que:

a) exceda a dimensão máxima fixada na forma do artigo 46, § 1°, alínea b, desta Lei, tendo-se em vista as condições ecológicas, sistemas agrícolas regionais e o fim a que se destine;

b) não excedendo o limite referido na alínea anterior, e tendo área igual ou superior à dimensão do módulo de propriedade rural, seja mantido inexplorado em relação às possibilidades físicas, econômicas e sociais do meio, com fins especulativos, ou seja, deficiente ou inadequadamente explorado, de modo a vedar-lhe a inclusão no conceito de empresa rural;

VI - "Empresa Rural" é o empreendimento de pessoa física ou jurídica, pública ou privada, que explore econômica e racionalmente imóvel rural, dentro de condição de rendimento econômico ...Vetado... da região em que se situe e que explore área mínima agricultável do imóvel segundo padrões fixados, pública e previamente, pelo Poder Executivo. Para esse fim, equiparam-se às áreas cultivadas, as pastagens, as matas naturais e artificiais e as áreas ocupadas com benfeitorias; (BRASIL, Estatuto da Terra, 1964)

Embora o artigo 4º tenha se encarregado de estabelecer o que é propriedade familiar em seu inciso II, não definiu o que seria módulo rural, apenas se resumindo a conceituar da seguinte forma: III – Módulo Rural, a área fixada nos termos do inciso anterior. Logo, remete-se ao inciso II, no qual menciona a sobrevivência, o progresso social e econômico, com área máxima definida para tipo de exploração e região.

No intuito de regulamentar o inciso III do art. 4º, do Estatuto da Terra, editou-se o Decreto 55.891, de 31 de março de 1965, que estabelece a finalidade do módulo rural, sem, contudo, fixar-lhe a unidade de medida exata em termos de extensão territorial. Vejamos:

Art. 11. O módulo rural, definido no inciso III do art. 4o, do Estatuto da Terra, tem como finalidade primordial estabelecer uma unidade de medida que exprima a interdependência entre a dimensão, a situação geográfica dos imóveis rurais e a forma e condições do seu aproveitamento econômico (BRASIL, Decreto nº 55.891, Estatuto da Terra, 1965).

Com o advento da Constituição Federal de 1988, foram introduzidas outras 03 (três) categorias no ordenamento jurídico, que são elas: pequena propriedade, média propriedade e propriedade produtiva, que posteriormente, foram regulamentadas pela Lei 8.629 de 1993.

A Lei regente nº 8.629 promulgada em 1993, que dispõe sobre a regulamentação dos dispositivos constitucionais relativos à reforma agrária, previstos no Capítulo III, Título VII, da Constituição Federal, ao definir a pequena propriedade rural, limitou-a entre 01(um) a 04 (quatro) módulos fiscais. 

Considerando que a referida Lei já estava ultrapassada, pois decorridos aproximadamente 14 (quatorze) anos, houve a necessidade de alterar alguns dispositivos da Lei 8.629/93, assim como, várias outras normas jurídicas infraconstitucionais. 

Para isso foi promulgada a Lei nº 13.465 de 11 de julho de 2017, que dispõe sobre a regularização fundiária rural e urbana entre outras medidas importantes para instituir mecanismos mais céleres e eficientes para alavancar e subsidiar a agricultura brasileira, em especial as pequenas propriedades rurais que destinam suas terras ao grupo familiar como meio de sobrevivência socioeconômica. 

Assim, o art. 4º, inciso II, “a”, ganhou nova roupagem na definição de pequena propriedade rural, passando a limitá-la em até 04 (quatro) módulos fiscais, respeitada a fração mínima de parcelamento.[5]

Importante destacar que, o Estatuto da Terra de 1964, utiliza-se da definição “módulo rural”, ao passo que, a Lei regulamentadora nomina de “módulo fiscal”, o que não se pode confundir.

Segundo o magistério de LARANJEIRA, (1984, p.36) tem-se: 

O módulo é uma medida de área, diretamente afeita à eficácia desta, no meio rurígena. A sua finalidade precípua está em evitar a existência de glebas cujo tamanho, em regra, não se ache suscetível de render o suficiente para o progresso econômico-social do agricultor brasileiro.

Embora similitude entre as duas definições estabelecidas pelas Leis vigentes, é de fundamental importância entender a diferença entre módulo rural e módulo fiscal, pois é ela que confere a proteção constitucional de impenhorabilidade da pequena propriedade rural.

Tem-se por módulo rural a menor parcela de fracionamento do solo rural, levando-se em consideração critérios objetivos que permitiriam ao trabalhador dali extrair o seu sustento e de sua família, levando em consideração a produtividade e os custos de produção de cada região do país. 

Por sua vez o módulo fiscal veio definido sua aferição através do Decreto nº 84685, de 06.05.1980, em seu artigo 4º, com observância dos seguintes requisitos: 

Art. 4º - O módulo fiscal de cada Município, expresso em hectares, será fixado pelo INCRA, através de Instrução Especial, levando-se em conta os seguintes fatores:

a) o tipo de exploração predominante no Município:

I - hortifrutigranjeira;

II - cultura permanente;

III - cultura temporária;

IV - pecuária;

V - florestal;

b) a renda obtida no tipo de exploração predominante;

c) outras explorações existentes no Município que, embora não predominantes, sejam expressivas em função da renda ou da área utilizada;

d) o conceito de "propriedade familiar" constante do art. 4º, item II, da Lei nº 4.504, de 30 de novembro de 1964.

§ 1º - Na determinação do módulo fiscal de cada Município, o INCRA aplicará metodologia, aprovada pelo Ministro da Agricultura, que considere os fatores estabelecidos neste artigo, utilizando-se dos dados constantes do Sistema Nacional de Cadastro Rural.

§ 2º - O modulo fiscal fixado na forma deste artigo, será revisto sempre que ocorrerem mudanças na estrutura produtiva, utilizando-se os dados atualizados do Sistema Nacional de Cadastro Rural.

Art. 5º - O número de módulos fiscais de cada imóvel rural será obtido dividindo-se sua área aproveitável total pelo módulo fiscal do Município.

Parágrafo único - No caso de imóvel rural situado em mais de um Município, o número de módulos fiscais será calculado com base no módulo fiscal estabelecido para o Município onde estiver cadastrado o imóvel, segundo critérios baseados para o cadastramento (BRASIL, Decreto nº 84.685, 1980).

Nota-se que ambas as leis deixaram a cargo do INCRA (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária) estabelecer a quantidade de área rural expressa em hectares, seja para fins socioeconômicos quanto para fins tributários, no caso, a incidência do ITR. A distinção é relevante entre módulo rural e módulo fiscal em razão da extensão de área rural para cada uma delas. 

Entretanto, o objetivo único do estudo proposto é o enquadramento em módulo rural, para fins de auferir se a propriedade rural se trata de pequena propriedade rural e sua destinação atende a função social daqueles que laboram no campo juntamente com os demais integrantes do grupo familiar.

 

2.1. Pequena propriedade rural e o bem de família

Concomitantemente com o a pequena propriedade rural impenhorável está o bem de família, que diga-se de passagem pode ser definido como o local de proteção e residência de uma família, conforme explica Azevedo:

O bem de família é um meio de garantir um asilo à família, tornando-se o imóvel onde a mesma se instala domicílio impenhorável e inalienável, enquanto forem vivos os cônjuges e até que os filhos completem sua maioridade (2002, p. 93).

O bem de família nada mais é do que o local acolhedor da família, local que é o domicilio, podendo ser urbano ou rural, mas ambos totalmente protegidos pelo Estado.

O artigo 1º da Lei nº 8.009/90 estabelece que:

Art. 1º O imóvel residencial próprio do casal, ou da entidade familiar, é impenhorável e não responderá por qualquer tipo de dívida civil, comercial, fiscal, previdenciária ou de outra natureza, contraída pelos cônjuges ou pelos pais e filhos que sejam seus proprietários e nele residam, salvo nas hipóteses previstas nesta Lei.

Parágrafo único: A impenhorabilidade compreende o imóvel sobre o qual se assentam a construção, as plantações, as benfeitorias de qualquer natureza e todos os equipamentos, inclusive os de uso profissional, ou móveis que guarnecem a casa, desde que quitados. (BRAISL, 1990).

A presente lei visou garantir a proteção do imóvel familiar como um todo, compreendendo também as propriedades rurais familiares, visando garantir que mesmo em casos de dificuldade financeira possam ter respaldado o mínimo de qualidade de vida em sua casa.

O direito à moradia é um direito social e fundamental resguardado pela Constituição Federal e pela Lei de Impenhorabilidade, elucidado por MORAES:

Os direitos sociais caracterizam-se como verdadeiras liberdades positivas, de observância obrigatória em um Estado social de direito, tendo como finalidade a melhoria das condições de vida dos hipossuficientes, visando à concretização da igualdade social, que configura em dos fundamentos de nosso Estado democrático (2012, p. 09)

 

O direto à moradia resguarda a integridade familiar, de certa forma também ao direito à vida, a inviolabilidade do domicílio, intimidade, honra, vários outros direitos e garantias protegidos pela legislação.

 

2.2. Garantia da Impenhorabilidade da pequena propriedade rural 

Fato é que a pequena propriedade rural, em que uma família trabalha e reside, possui proteção especial pela legislação brasileira, com a finalidade de resguardar, pelo menos o direito à moradia e a subsistência de uma família.

A Constituição Federal em seu artigo 5º, XXVI, garante expressamente:

Art. 5º [...] a pequena propriedade rural, assim definida em lei, desde que trabalhada pela família, não será objeto de penhora para pagamento de débitos decorrentes de sua atividade produtiva, dispondo a lei sobre os meios de financiar o seu desenvolvimento (BRASIL, 1988).

O pagamento dos débitos de uma propriedade rural familiar vem originar da produção que nela realizam, caso seja objeto de penhora, não existe a possibilidade dos membros da família arrumarem formas para seu crescimento e elevação financeira.

Ao que tange o disposto no Estatuto de Terras em seu artigo 4º, II, estabelece o seguinte:

No inc. II, consta: “Propriedade família”, o imóvel rural que, direta e pessoalmente explorado pelo agricultor e sua família, lhes absorva toda  força de trabalho, garantindo-lhes a subsistência e o progresso social e econômico, com área máxima fixada para cada região e tipo de exploração, e eventualmente trabalho com a ajuda de terceiros. (RIZZARDO,2015, p.601)

Observa-se que a proteção da propriedade rural familiar visa garantir o reestabelecimento da família, como forma de não haver empecilhos para que esse desenvolvimento ocorra. 

O Código de Processo Civil em seu artigo 833 é expresso na proteção da penhorabilidade da pequena propriedade rural:

Art. 833. São impenhoráveis:

[...] 

VIII - a pequena propriedade rural, assim definida em lei, desde que trabalhada pela família (BRASIL, 2015);

A condição imposta pela Lei para visar a proteção da penhorabilidade está em que a mesma seja trabalhada pela família, ou seja, atenda a sua função social, conforme explica do doutrinador:

A proteção da pequena propriedade rural depende da condição de estar sendo trabalhada pela família. Não há a impenhorabilidade se alugada a propriedade, ou se não utilizada para a produção rural. Na eventualidade de incluída com outros imóveis no cultivo se limita ao equivalente da pequena propriedade, admitindo-se a penhora no restante do patrimônio (RIZZARDO, 2015, p. 603).

Assim sendo para que que a pequena propriedade rural esteja respaldada pela legislação ela deve atender a função social da propriedade sendo o disposto no artigo 170 da Constituição Federal, devendo a propriedade devidamente utilizada de forma racional e adequada, visando o bem-estar da família ali residente e produtora.

A Lei º 8.009/90, que dispõe sobre a impenhorabilidade do bem de família, no §4º do artigo 2º estabelece que:

Art. 4º Não se beneficiará do disposto nesta lei aquele que, sabendo-se insolvente, adquire de má-fé imóvel mais valioso para transferir a residência familiar, desfazendo-se ou não da moradia antiga.

§ 2º Quando a residência familiar constituir-se em imóvel rural, a impenhorabilidade restringir-se-á à sede de moradia, com os respectivos bens móveis, e, nos casos do art. 5º, inciso XXVI, da Constituição, à área limitada como pequena propriedade rural. (BRASIL, 1990).

Assim sendo elucidado a proteção da residência familiar se dá a todos os bens que possuem na sede de moradia, bem como a área delimita como pequena propriedade rural, ou seja, até quatro módulos fiscais.

 

2.3. Do direito corretamente aplicado

Anteriormente foi destacado os requisitos legais para não haver a penhora de uma pequena propriedade rural familiar, quando, de fato uma família possui uma propriedade de até quatro módulos fiscais e a sua subsistência é proveniente da produção daquela propriedade, o proprietário e sua família possui a garantia de não haver penhora para quitação de débitos.

Mas quando a propriedade não se enquadra nos parâmetros, será bem analisado pelo julgador e aplicado o que é de fato necessário, como no entendimento do Tribuna de Justiça de Minas Gerais, não concedeu a impenhorabilidade da pequena propriedade rural, em razão da mesma não atender aos requisitos dispostos em Lei, conforme segue:

No caso em tela, não há nos autos qualquer prova no sentido de que o imóvel penhorado seja utilizado pelo apelado e por sua família como moradia, que seja ele pequeno produtor rural, tirando de referido imóvel sua sobrevivência, trabalhando em referida propriedade com esse fim.

O que os autos estão a demonstrar é exatamente o contrário. O apelado foi citado e intimado em Santa Luzia, na Av. Brasília, nº 3400 (fls. 53-v e 99-apenso), sendo que o bem objeto de constrição judicial se encontra no município de Resende Costa (fls. 83-apenso). Não comprovou ele que resida no imóvel em questão juntamente com sua família, não havendo nos autos qualquer indício neste sentido.

Na certidão cartorária de fls. 74 (apenso), o apelado é qualificado como administrador de empresas, o mesmo constando da petição inicial dos presentes embargos do devedor.

Na reportagem de fls. 34, o apelado é chamado de ‘empreendedor’ e ‘empresário’, atuando no ramo de piscinas.

Ou seja, o que os autos demonstram é que o apelado não se trata de pequeno produtor rural e nem reside no imóvel rural objeto de penhora, muito menos tira dele sua subsistência e de sua família sendo, na verdade, administrador de empresas (conforme ele próprio constou na peça de ingresso da presente ação de embargos do devedor).

Não tendo o apelado comprovado os requisitos para que se considere o imóvel em questão impenhorável, não se pode acolher a afirmação neste sentido, merecendo reforma a sentença que considerou insubsistente a penhora.

Logo não se há de falar em impenhorabilidade com base no art. 649, inciso X do CPC’” (fls. 77/78).

No caso em tela o julgador se baseou na legislação processual e requisitos constantes nela e também em todo conjunto comprobatório, ou seja, não é por sem uma pequena propriedade rural que já se tenha a garantia da impenhorabilidade, mas sim desde que seja produtiva, seja familiar e sua residência.

Nessa seara o Superior Tribunal de Justiça entende como:

RECURSO ESPECIAL. EMBARGOS À EXECUÇÃO. ALEGAÇÃO DE IMPENHORABILIDADE DE PEQUENA PROPRIEDADE RURAL, DEFINIDA EM LEI E TRABALHADA PELA ENTIDADE FAMILIAR, COM ESCOPO DE GARANTIR A SUA SUBSISTÊNCIA. REJEIÇÃO, PELAS INSTÂNCIAS ORDINÁRIAS, SOB O FUNDAMENTO DE QUE O EXECUTADO NÃO RESIDE NO IMÓVEL E DE QUE O DÉBITO NÃO SE RELACIONA À ATIVIDADE PRODUTIVA. IRRELEVÂNCIA. RECONHECIMENTO. NECESSIDADE DE SE AFERIR, TÃO SOMENTE, SE O BEM INDICADO À CONSTRIÇÃO JUDICIAL CONSTITUI PEQUENA PROPRIEDADE RURAL, NOS TERMOS DA LEI DE REGÊNCIA, E SE A ENTIDADE FAMILIAR ALI DESENVOLVE ATIVIDADE AGRÍCOLA PARA O SEU SUSTENTO. RECURSO ESPECIAL PROVIDO. 1. Tomando-se por base o fundamento que orienta a impenhorabilidade da pequena propriedade rural (assegurar o acesso aos meios geradores de renda mínima à subsistência do agricultor e de sua família), não se afigura exigível, segundo o regramento pertinente, que o débito exequendo seja oriundo do atividade produtiva, tampouco que o imóvel sirva de moradia ao executado e de sua família. 2. Considerada a relevância da pequena propriedade rural trabalhada pela entidade familiar, a propiciar a sua subsistência, bem como promover o almejado atendimento à função sócioeconômica, afigurou-se indispensável conferir-lhe ampla proteção. 2.1 O art. 649, VIII, do CPC/1973 (com redação similar, o art. 833, CPC/2015), ao simplesmente reconhecer a impenhorabilidade da pequena propriedade rural, sem especificar a natureza da dívida, acabou por explicitar a exata extensão do comando constitucional em comento, interpretado segundo o princípio hermenêutico da máxima efetividade. 2.2 Se o dispositivo constitucional não admite que se efetive a penhora da pequena propriedade rural para assegurar o pagamento de dívida oriunda da atividade agrícola, ainda que dada em garantia hipotecária (ut REsp 1.368.404/SP, Relatora Ministra Maria Isabel Gallotti, Quarta Turma, julgado em 13/10/2015, DJe 23/11/2015), com mais razão há que reconhecer a impossibilidade de débitos de outra natureza viabilizar a constrição judicial de bem do qual é extraída a subsistência do agricultor e de sua família. 3. O fundamento que orienta a impenhorabilidade do bem de família (rural) não se confunde com aquele que norteia a da pequena propriedade rural, ainda que ambos sejam corolários do princípio maior da dignidade da pessoa humana, sob a vertente da garantia do patrimônio mínimo. O primeiro, destina-se a garantir o direito fundamental à moradia; o segundo, visa assegurar o direito, também fundamental, de acesso aos meios geradores de renda, no caso, o imóvel rural, de onde a família do trabalhador rural, por meio do labor agrícola, obtém seu sustento. 3.1 As normas constitucional e infralegal já citadas estabelecem como requisitos únicos para obstar a constrição judicial sobre a pequena propriedade rural: i) que a dimensão da área seja qualificada como pequena, nos termos da lei de regência; e ii) que a propriedade seja trabalhada pelo agricultor e sua família. Assim, para o reconhecimento da impenhorabilidade da pequena propriedade rural, não se exige que o imóvel seja a moradia do executado, impõe-se, sim, que o bem seja o meio de sustento do executado e de sua família, que ali desenvolverá a atividade agrícola. 3.2 O tratamento legal dispensado à impenhorabilidade da pequena propriedade rural, objeto da presente controvérsia, afigura-se totalmente harmônico com aquele conferido à impenhorabilidade do bem de família (rural). O art. 4º, § 2º, da Lei n. 9.008/1990, que disciplina a impenhorabilidade do bem de família, põe a salvo de eventual contrição judicial a sede da moradia, e, em se tratando de pequena propriedade rural, a área a ela referente. 4. Recurso especial provido.

Não existe controvérsia no entendimento da proteção da impenhorabilidade da pequena propriedade rural familiar, desde que de fato seja uma, conforme decisão acima, o julgador visa sempre garantir a aplicação da Lei de fato e a subsistência da família produtora rural.

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O presente trabalho teve por objetivo primordial evidenciar que a pequena propriedade rural familiar, atendendo aos requisitos legais e a sua função social é impenhorável, tanto quanto qualquer outro bem de família, que deve ser resguardado contra qualquer instabilidade econômica que porventura possa acontecer.

Essa garantia que a legislação concede a garantia de diminuição dos impactos econômicos que a população como um todo sofre nos dias atuais, a sociedade agrária brasileira, tem uma contribuição muito grande para a economia e alimentação da população brasileira.

Mas os conflitos que o campo sofre são incalculáveis, problemas com o clima, pragas, dentre outros que podem prejudicar o cultivo e consequentemente diminuição das entradas financeiras da unidade familiar, além das políticas públicas que resguardam os pequenos produtores (o que não é objeto do presente estudo) resguardar a não penhorabilidade da propriedade rural familiar é uma segurança a mais e é imprescindível para retorno dos seus rendimentos e pagamento de suas dívidas.

Fato é que a pequena propriedade rural, em que uma família trabalha e reside, possui proteção especial pela legislação brasileira, com a finalidade de resguardar, pelo menos o direito à moradia e a subsistência de uma família.

O pagamento dos débitos de uma propriedade rural familiar vem origina da produção que nela realizam, caso seja objeto de penhora, não existe a possibilidade dos membros da família arrumarem formas para seu crescimento e elevação financeira.

Assim sendo para que que a pequena propriedade rural esteja respaldada pela legislação ela deve atender a função social da propriedade sendo o disposto no artigo 170 da Constituição Federal, deve a propriedade devidamente utilizada de forma racional e adequada, visando o bem-estar da família ali residente e produtora.

Portanto ao estabelecer que a pequena propriedade rural não poderá ser objeto de penhora, ou seja, tomada como pagamento de dívida, a Constituição Federal oferece amparo à agricultura familiar e reconhece a importância do vínculo entre o produtor e a terra.

 

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NOTAS

[4]Art. 1.228. O proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o direito de reavê-la do poder de quem quer que injustamente a possua ou detenha. 

§ 1 o O direito de propriedade deve ser exercido em consonância com as suas finalidades econômicas e sociais e de modo que sejam preservados, de conformidade com o estabelecido em lei especial, a flora, a fauna, as belezas naturais, o equilíbrio ecológico e o patrimônio histórico e artístico, bem como evitada a poluição do ar e das águas. 

[5] Art. 4º Para os efeitos desta lei, conceituam-se: ... II - Pequena Propriedade - o imóvel rural: a) de área até quatro módulos fiscais, respeitada a fração mínima de parcelamento (Redação dará pela Lei nº 13.465, de 2017)

Data da conclusão/última revisão: 24/09/2020

 

Como citar o texto:

SANTOS, Marcela Theodoro..A impenhorabilidade da pequena propriedade rural. Boletim Jurídico, Uberaba/MG, a. 19, nº 1009. Disponível em https://www.boletimjuridico.com.br/artigos/direito-agrario/10771/a-impenhorabilidade-pequena-propriedade-rural. Acesso em 16 dez. 2020.

Importante:

As opiniões retratadas neste artigo são expressões pessoais dos seus respectivos autores e não refletem a posição dos órgãos públicos ou demais instituições aos quais estejam ligados, tampouco do próprio BOLETIM JURÍDICO. As expressões baseiam-se no exercício do direito à manifestação do pensamento e de expressão, tendo por primordial função o fomento de atividades didáticas e acadêmicas, com vistas à produção e à disseminação do conhecimento jurídico.