O Direito Ambiental, enquanto ciência de origem recente, encontra como um dos maiores obstáculos para seu estudo sistemático, a legislação esparsa que trata da proteção do meio ambiente. Apesar desta dificuldade, verifica-se claramente no ordenamento jurídico nacional a existência de inúmeros princípios que conferem autonomia científica a esse ramo do Direito[1].
Dentre os vários princípios norteadores do tema, destaca-se o princípio da prevenção do dano ambiental. Tal direcionamento fundamental consiste no comportamento efetuado com o intuito de afastar o risco ambiental. Antecipam-se medidas para evitar agressões ao meio ambiente.
Este preceito encontra-se previsto no artigo 225, caput, da Constituição Federal, quando se incumbe ao Poder Público e à coletividade o dever de proteger e preservar o meio ambiente às presentes e futuras gerações.
Ao se mencionar a idéia de proteção, esta engloba tanto atividades de reparação, como de prevenção. Consoante ensina Marcelo Abelha Rodrigues sobre o princípio da prevenção:
“Sua importância está diretamente relacionada ao fato de que, se ocorrido o dano ambiental, a sua reconstituição é praticamente impossível. O mesmo ecossistema jamais pode ser revivido. Uma espécie extinta é um dano irreparável. Uma floresta desmatada causa uma lesão irreversível, pela impossibilidade de reconstituição da fauna e da flora e de todos os componentes ambientais em profundo e incessante processo de equilíbrio, como antes se apresentavam”[2].
Para que sejam tomados os procedimentos adequados à proteção do meio ambiente, torna-se necessário existir permanente sistema de informação e séria pesquisa para resolver os problemas ambientais já na sua origem. Nesse sentido, Paulo Affonso Leme Machado organiza em cinco itens a aplicação do princípio da prevenção: “1º) identificação e inventário das espécies animais e vegetais de um território, quanto à conservação da natureza e identificação das fontes contaminantes das águas do mar, quanto ao controle da poluição; 2º) identificação e inventário dos ecossistemas, com a elaboração de um mapa ecológico; 3º) planejamentos ambiental e econômico integrados; 4º) ordenamento territorial ambiental para a valorização das áreas de acordo com a sua aptidão; e 5º) Estudo de Impacto Ambiental”[3].
Constata-se, portanto, que a noção de prevenção diz respeito ao conhecimento antecipado dos sérios danos que podem ser causados ao bem ambiental em determinada situação e a realização de providências para evitá-los. Já se verifica um nexo de causalidade cientificamente demonstrável entre uma ação e a concretização de prejuízos ao meio ambiente.
Encontram-se, no sistema normativo brasileiro, alguns instrumentos de tutela ambiental, seja para pesquisa, seja para ação de prevenir, no âmbito administrativo, como o licenciamento ambiental e respectivo estudo prévio de impacto ambiental, zoneamento administrativo, tombamento e as sanções administrativas. Especialmente nesta hipótese de sanções administrativas, o Direito Ambiental, ramo do Direito Público, permite ao Estado impor multas ao poluidor que inibem futuras agressões ao meio ambiente. Conforme ressalva Celso Antonio Pacheco Fiorillo, “não se quer com isso inviabilizar a atividade econômica, mas tão-somente excluir do mercado o poluidor que ainda não constatou que os recursos ambientais são escassos, que não pertencem a uma ou algumas pessoas e que sua utilização encontra-se limitada na utilização do próximo, porquanto o bem ambiental é um bem de uso comum do povo”.[4]
Ainda, junto ao Poder Judiciário, o ajuizamento de remédios heróicos como ação civil pública e ação popular, permite a tutela mais adequada a esses direitos difusos, visando impedir danos ao bem ambiental, sem excluir a possibilidade de utilização de instrumentos de tutela de urgência, como liminares antecipatórias e medidas cautelares.
Conclui-se que a aplicação do princípio da prevenção configura um complexo sistema de conhecimento e vigilância da biota, em que a atualização constante de informações permite a implementação e modernização das políticas ambientais.
Notas:
[1] “O Direito não é mero somatório de regras avulsas, produto de actos de vontade, ou mera concatenação de fórmulas verbais articuladas entre si. O Direito é ordenamento ou conjunto significativo e não conjunção resultante de vigência simultânea; implica coerência ou, talvez mais rigorosamente, consistência; projecta-se em sistema; é unidade de sentido, é valor incorporado em regra. E esse ordenamento, esse conjunto, essa unidade, esse valor projecta-se ou traduz-se em princípios, logicamente anteriores aos preceitos”. MIRANDA, Jorge. Teoria do Estado e da Constituição. Rio de Janeiro: Forense, 2003, p. 431.
[2] RODRIGUES, Marcelo Abelha. Elementos de direito ambiental:Parte Geral. 2. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2005. p. 203.
[3] MACHADO, Paulo Affonso Leme. Estudos de Direito Ambiental. São Paulo, Malheiros Editores, 1994, p.36.
[4] FIORILLO, Celso Antonio Pacheco. Curso de direito ambiental brasileiro. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 40.
Marcus Vinicius Corrêa Bittencourt
Advogado da União;Mestre em Direito do Estado pela UFPR;
Professor de Direito Administrativo da Faculdade de Direito de Curitiba, da Escola da Magistratura Federal do Paraná e do Curso Jurídico;
Autor do Livro “Manual de Direito Administrativo”, 1ªed., 2ª Tiragem - Editora Fórum – 2005;
Advogado da União (AGU).
Website: www.marcusbittencourt.com.br.
Código da publicação: 1166
Como citar o texto:
BITTENCOURT, Marcus Vinicius Corrêa..Princípio da Prevenção no Direito Ambiental. Boletim Jurídico, Uberaba/MG, a. 3, nº 173. Disponível em https://www.boletimjuridico.com.br/artigos/direito-ambiental/1166/principio-prevencao-direito-ambiental. Acesso em 10 abr. 2006.
Importante:
As opiniões retratadas neste artigo são expressões pessoais dos seus respectivos autores e não refletem a posição dos órgãos públicos ou demais instituições aos quais estejam ligados, tampouco do próprio BOLETIM JURÍDICO. As expressões baseiam-se no exercício do direito à manifestação do pensamento e de expressão, tendo por primordial função o fomento de atividades didáticas e acadêmicas, com vistas à produção e à disseminação do conhecimento jurídico.
Pedido de reconsideração no processo civil: hipóteses de cabimento
Flávia Moreira Guimarães PessoaOs Juizados Especiais Cíveis e o momento para entrega da contestação
Ana Raquel Colares dos Santos LinardPublique seus artigos ou modelos de petição no Boletim Jurídico.
PublicarO Boletim Jurídico é uma publicação periódica registrada sob o ISSN nº 1807-9008 voltada para os profissionais e acadêmicos do Direito, com conteúdo totalmente gratuito.