RESUMO
A pesquisa envolve assuntos referentes à sucessão do companheiro no Código Civil de 2002. Aborda os seguintes temas: a união estável na Constituição Federal de 1988 e no Código Civil; os direitos do companheiro na integralidade da herança; abordagem histórica sobre a origem e a evolução histórica da família e da união estável; análise quanto aos direitos do companheiro no ato da sucessão, concorrendo com os descendentes, os ascendentes e os colaterais; como também o direito à totalidade da herança na sucessão; e por fim a inconstitucionalidade do artigo 1790 do Código Civil.
Palavras-chave: união estável. Sucessão. Companheiro. Inconstitucionalidade.
RESUMEN
La investigación implica cuestiones relativas a la sucesión compañero en el Código Civil de 2002. Se ocupa de las siguientes cuestiones : unión estable en la Constitución Federal de 1988 y el Código Civil ; compañeros de derechos en el conjunto de la herencia ; enfoque histórico sobre el origen y la evolución histórica de la familia y el matrimonio ; análisis como a los compañeros de los derechos en el acto de la sucesión compitiendo con los descendientes , los ascendientes y los colaterales ; así como el derecho a la totalidad de la herencia en la sucesión ; y, finalmente, la inconstitucionalidad del artículo 1.790 del Código Civil .
Palabras clave : Unión estable . Sucesión . Compañera. Inconstitucionalidad .
INTRODUÇÃO
O presente trabalho tem por fundamento o estudo do Direito Sucessório na união estável, sendo esta as relações familiares que têm evoluído consideravelmente nas últimas décadas, exigindo assim, que o direito de família siga o mesmo prisma para que se incorpore às mudanças operadas nesse contexto social dos afetos.
Isso porque, a disciplina acerca deste assunto se faz bastante controversa. Uma vez que, a matéria prevista no Código Civil de 2002 não expressa com clareza o seu texto legal, ensejando diversas críticas e opiniões contrarias no que diz respeito à situação do companheiro na sucessão.
O objetivo principal do referido trabalho consiste na busca pela garantia do direito à herança aos companheiros e as controvérsias causadas pela inconstitucionalidade do artigo 1790 do código civil de 2002 alcançando assim de forma ampla, os direitos inerentes ao companheiro, conforme é assegurado pela Constituição Federal de 1988.
Desta forma, o primeiro capítulo reservam-se às obras doutrinárias de juristas renomados no âmbito nacional sobre, entidade familiar, sua evolução histórica, seu conceito, e sua comparação com a união estável na Constituição Federal de 1988. Tendo como objetivo, demonstrar a importância de se entender o conceito de entidade familiar para, assim chegar a união estável.
No capítulo segundo, será realizada uma abordagem acerca da união estável, seu conceito e evolução, sua regulamentação antes do Código Civil de 2002, seus requisitos, os direitos e deveres da união estável, e da conversão de união estável para casamento.
E no terceiro capítulo, será realizada uma análise especifica do artigo 1790 do Código Civil de 2002, sendo feita uma abordagem sobre a concorrência sucessória do companheiro, discutindo-se a inconstitucionalidade do referido artigo.
A referida pesquisa será realizada através da análise de conteúdo, presentes nas doutrinas de Maria Helena Diniz, Roberto Gonçalves, Flávio Tartuce, entre vários outros renomados doutrinadores. Como também, através de website, leis e jurisprudências.
Isto posto, serão levantados diferentes posicionamentos doutrinários com a finalidade de demonstrar os deslizes praticados pelo legislador ao submeter o companheiro a inferioridade, quanto a aplicação do direito sucessório se comparado ao atual direito sucessório do cônjuge.
Sendo assim, o presente trabalho tem como finalidade a realização de uma análise crítica, ou seja, não só demonstrar em que o companheiro foi submetido pela atual legislação, mas também apresentar soluções para o mencionado problema, sendo estas soluções possíveis, somente através de significativas alterações no vigente Código Civil Brasileiro.
Nessa perspectiva, objetiva-se demonstrar, tais assuntos com base na doutrina e legislação pertinentes e decisões existentes.
CAPÍTULO I
FAMÍLIA E ENTIDADE FAMILIAR
1.1. CONCEITO E NOÇÕES BÁSICAS
O seu conceito varia conforme as diferentes épocas, povos, culturas e localidades. Considerando-se todas as pessoas que, estejam de alguma forma ligadas umas às outras pelo sangue ou por afinidade.
A célula básica da família, formada por pais e filhos, não se alterou muito com a sociedade urbana. A família atual, contudo, difere das formas antigas no que concerne a suas finalidades, composição e papel de pais e mães. (VENOSA, 2010, p. 05)
A família, ao longo da evolução história sofreu importantes transformações, sendo considerada por alguns povos antigos como um instituto de ampla importância.
Segundo o autor Venosa (2007, p. 03) nas primeiras civilizações como as assíria, hindu, egípcia, grega e romana, a família era uma entidade ampla e hierarquizada, sendo hoje quase de âmbito exclusivo de pais e filhos.
Com a evolução do instituto da família, confirma-se que os motivos para constituir a família mudaram, e é necessário um amparo jurídico legislativo para acompanhar o processo de evolução do instituto familiar.
Venosa, referindo-se a família de forma mais ampla, afirma:
Deste modo, importa considerar a família em conceito amplo, como parentesco, ou seja, o conjunto de pessoas unidas por vínculo jurídico de natureza familiar. Nesse sentido compreendem-se os ascendentes, descendentes e colaterais de uma linhagem, incluindo-se os ascendentes, descendentes e colaterais do cônjuge, que se denominam parentes por afinidade ou afins. (VENOSA, 2007, p. 2).
Venosa, já em um conceito mais restrito, afirma “Família compreende somente o núcleo formado por pais e filhos que vivem sob o pátrio poder ou poder familiar”, ” ou seja, o conjunto de pessoas unidas por um vínculo jurídico de natureza familiar”. (VENOSA, 2007, p. 2)
A opinião do autor supracitado, é a de que esses filhos ao se casarem, não rompem o vínculo familiar com seus pais e estes continuam fazendo parte da família, os irmãos também, os quais também se casam e trazem os seus filhos para o seio familiar. Dando assim, continuidade a essa família. Já sob outros prismas, a opinião é de que a família é uma entidade familiar, que de início é constituída pela figura do marido e da mulher. Depois se amplia com o surgimento da prole.
Nesse mesmo sentido, o doutrinador, Washington Monteiro de Barros faz a seguinte definição de família:
Num sentido estrito, o vocábulo abrange tão somente o casal e a prole. Num sentido mais largo, cinge o vocábulo a todas as pessoas ligadas pelo vínculo da consangüinidade, cujo alcance ora é mais dilatado, ora mais circunscrito, segundo critério de cada legislação (BARROS, 2007, p. 02).
Esta sociedade dá inicio aos laços de sangue e de afinidade. Os laços de sangue resultam da descendência. A afinidade se dá com a entrada dos cônjuges e seus parentes que se agregam à entidade familiar pelo casamento.
Devido a tais relações, a sociedade familiar percebeu que havia uma necessidade de criar leis para se organizar e com isso surgiu o Direito de Família, regulando as relações familiares e tentando solucionar os conflitos oriundos dela, com o decorrer dos anos o Direito vem regulando e legislando, sempre com intuito de ajudar a manter a família para que o indivíduo possa inclusive sem esta estruturação familiar, onde há um lugar definido para cada membro, existir como cidadão e trabalhar na constituição de si mesmo e das relações interpessoais e sociais.
Assim como afirma Machado:
O Direito protege o organismo familiar, por ser uma sociedade natural anterior ao Estado e ao Direito. Não foi, portanto, nem o Estado nem o Direito que criaram a família, pois foi esta que criou o Estado e o Direito, como sugere a famosa frase de Rui Barbosa: “A pátria é a família amplificada”. (MACHADO, 2000, p.2.)
Destarte, o Direito regula o funcionamento da sociedade e o comportamento de seus membros. Sendo, portanto, um conjunto de normas e princípios.
1.2. EVOLUÇÃO HISTÓRICA
A ideia de família surgiu muito antes do Direito, das leis e da influência da igreja na vida das pessoas. Sendo considerado assim como um assunto um tanto quanto, antigo.
No entanto, a atual família brasileira sofreu influências dos antepassados como da família romana, canônica e germânica.
1.2.1. A Família no Direito Romano
Devido às incessantes modificações sociais, culturais e até mesmo religiosas, a família sempre vem se submetendo a diversas transformações seguindo os ritmos que lhe são impostos pela sociedade.
Por conta disso, é indispensável um retorno aos antepassados, na busca da origem da família, para que se possa compreender as transformações históricas ocorridas. Vale ressaltar que não se verifica nenhum marco que defina o momento em que à família passou a existir.
Alguns estudiosos tentaram ao decorrer dos anos desvendar os mistérios que cercavam as famílias da antiguidade. Como elas eram, como se formavam, quem as compunha. No entanto, poucas conclusões puderam ser realizadas. Porém, em umas dessas, concluíram que a maior parte de sua evolução ou em quase toda, a família foi regida e organizada na forma patriarcal.
Segundo essas conclusões, pode-se perceber que, em Roma, o pai era quem possuía o poder sobre a esposa, os filhos, e as noras, os netos e as respectivas esposas, sendo assim considerava-se a base da família como patriarcal. O paters também era o responsável pelas finanças, pois o patrimônio não era da família, mas sim do “pater familias”.
Este poder era exercido pelo homem mais velho da família, no qual detinha o poder do paters familias, sendo que a família deveria seguir a religião e crenças do pater. Em relação a questão econômica, somente o pater adquiria bens, exercendo a domenica potestas (poder sobre o patrimônio familiar); e na política, o senado romano era composto pela reunião dos chefes de famílias.
Ainda Caio Mario da Silva Pereira leciona:
O pater era, ao mesmo tempo, chefe político, sacerdote e juiz. Comandava, oficiava o culto dos deuses domésticos (penates) e distribuía justiça. Exercia sobre os filhos direito de vida e de morte (ius vitae ac necis), podia impor-lhes pena corporal, vendê-los tirar-lhes a vida. A mulher vivia in locu filiae, totalmente subordinada à autoridade marital (in manu mariti), nunca adquirindo autonomia, pois que passava da condição de filha à de esposa, sem alteração na sua capacidade; não tinha direitos próprios, era atingida por capitis demintuio pérpetua que se justificava propter sexus infirmitatem et ingnoratiam rerum forensium. Podia ser repudiada por ato unilateral do marido. (PEREIRA, 2007, p. 26).
Continua o renomado autor:
Mas, com o tempo, arrefeceram estas regras severas: conheceu-se o casamento sine manu; as necessidades militares estimularam a criação de um patrimônio independente para os filhos, constituídos pelos bens adquiridos como soldado (peculium castrense), pelos que granjeavam no exercício de atividades intelectuais, artísticas ou funcionais (peculium quase) e pelos que lhe vinham por formas diversas desses (peculium adventicium) (PEREIRA, 2007, p. 26).
Desta forma, verificou-se que a família romana era totalmente submissa a figura masculina, ou seja, ao poder do pai sendo que este poderia até mesmo tirar a vida de seus filhos se bem entendesse.
No entanto, com o passar do tempo, a visão da família romana começou a mudar com as influências do direito canônico.
1.2.2. A Família no Direito Canônico
Para o renomado doutrinador Carlos Roberto Gonçalves ( 2014, p. 32):
Durante a Idade Média as relações de família regiam-se exclusivamente pelo direito canônico, sendo o casamento religioso o único conhecido. Embora as normas romanas continuassem a exercer bastante influência no tocante ao pátrio poder e às relações patrimoniais entre os cônjuges, observava-se também a crescente importância de diversas regras.
A figura religiosa teve seu advento como marco, no Direito Canônico, na qual foi construída no Direito Romano, com as cerimônias religiosas as quais formalizavam a constituição de uma família. Em outras palavras, o casamento sofreu grande mudança do que se tinha até aquele momento, diante da inserção da religião em sua constituição e nas concepções familiares. Possibilitando que a religião fosse para o casal, o controle e até mesmo a responsabilidade, na qual iria reger a relação entre homem e mulher inseridos na figura da família.
Assim, o direito canônico teve no casamento uma consagração e os canonistas eram totalmente contrários à dissolução do casamento por entenderem que não podiam os homens dissolver a união realizada por Deus.
Assim, a formação de um matrimônio através do casamento religioso, não seria apenas um contrato, e acordo entre as partes, mas também sacramento.
Conforme Arnoldo Wald:
Na doutrina canônica, o matrimônio é concedido como sacramento, reconhecendo-se a indissolubilidade do vínculo e só se discutindo o problema do divórcio em relação aos infiéis, cujo casamento não se reveste de caráter sagrado. ( WALD, 2005, p. 13)
Desta maneira, percebe-se que não se falava em divórcio, uma vez que o casamento era indissolúvel. No entanto, existia a separação de corpos sem dissolver o vínculo. Como salienta Arnoldo Wald:
A evolução do direito canônico se realizou no sentido da elaboração da teoria das nulidades e da regulamentação da separação de corpos e de patrimônios (divortium quoad thorum et mensam), que extingue a sociedade conjugal, sem todavia dissolver o vínculo. (WALD, 2005, p. 14)
Esta separação de corpos dependia “da autorização do bispo ou do sínodo, só sendo admitido em casos específicos como adultério, a heresia, as tentativas de homicídio ou as sevícias de um cônjuge em relação ao outro”. (WALD, 2005, p.14). E somente após o século XIV, “é que se admite a separação no caso de acordo entre os cônjuges”. (WALD, 2005, p.15)
Desta maneira, o direito Canônico durante a idade média foi conceituado como absoluto e segundo este direito o único casamento reconhecido era o casamento religioso, que era considerado um sacramento, que para ser celebrado deveria ter o consentimento das partes. No entanto, a Igreja passou a estabelecer diversas formas de impedimentos.
Assim como ensina Arnoldo Wald:
O direito canônico fomentou as causas que ensejavam impedimentos para o casamento, incluindo as causas baseadas na incapacidade de um dos nubentes como eram: a idade, casamento anterior, infertilidade, diferença de religião; as causas relacionadas com a falta de consentimento, ou decorrente de uma relação anterior (parentesco, afinidade). (WALD, 2005, p. 14)
Nesses ensinamentos, o casamento tinha caráter de perpetuidade com o dogma da indissolubilidade do vínculo, tendo como finalidade a procriação e criação dos filhos. Mas com desvinculação da Igreja, abriu-se caminho para rever essa dogmática.
Portanto nota-se que a família evoluiu com o passar do tempo, pois veio a tomar por base a família romana.
Com o passar do tempo, algumas atitudes legislativas foram tomadas no sentido de afastar a inferioridade da mulher no âmbito familiar. A primeira se deu com a Reforma de 1962, através do Estatuto da Mulher Casada (Lei nº 4121/62). Entre outras determinações, a mencionada lei determinou nova redação ao art. 233, do Código Civil, que passou estabelecer que “O marido é o chefe da sociedade conjugal, função que exerce com a colaboração da mulher, no interesse comum do casal e dos filhos”. Afirma-se que a partir disso, a mulher deixou de ser absolutamente incapaz. No entanto, somente com a Constituição de 1988, os direitos das mulheres foram reconhecidos.
1.2.3. A família na Constituição Federal de 1988 e no Código Civil de 2002.
O direito de família brasileiro como já dito anteriormente, sofreu influencias do direito romano, canônico e também do germânico, principalmente pelo canônico, pois, segundo Gonçalves (2010, p 32), a principal causa dessa influencia do direito canônico foi a colonização lusa, como o autor disserta em sua obra:
As Ordenações Filipinas foram a principal fonte e traziam a forte influência do aludido direito, que atingiu o direito pátrio. No que tange aos impedimentos matrimoniais, por exemplo, o Código Civil de 1916 seguiu a linha do direito canônico, preferindo mencionar as condições de invalidade. (Gonçalves, 2010, p 32).
Só recentemente, o direito de família passou a seguir rumos próprios, em função das enormes transformações históricas ocorridas.
Entre os Códigos Civis de 1916 e 2002, além da natural evolução dos costumes que determinaram o fim da indissolubilidade do casamento e a extensão do poder familiar à mulher, existe um marco histórico temporal que é a Constituição de 1988 quando se estuda o Direito de Família no Brasil.
Durante todos esses séculos desde criação do direito canônico ao Código Civil de 2002 algumas coisas permaneceram. No entanto, boa parte sofreu modificações. Isto porque o direito caminhou junto às mudanças da sociedade.
A Constituição de 1988 foi o ponto crucial, não havendo distinção na origem da filiação, considerando a mulher também plenamente capaz. Sendo esta,
igualada ao homem, tanto nos direitos como nos deveres, e dentro e fora da sociedade conjugal ou da união estável.
Destarte, tendo essa igualdade entre o homem e a mulher expressamente prevista na Constituição Federal de 1988 em seus artigos 5º, inciso I e 226, parágrafo 5º, os quais prescrevem respectivamente:
Art. 5º [...]
I - homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta Constituição;
Art. 226 [...]
§ 5º Os direitos e deveres referentes à sociedade conjugal são exercidos igualmente pelo homem e pela mulher.
Desta forma, o legislador constituinte visivelmente pretendeu contornar as distinções, preconceitos e desigualdades existentes no Direito familiar brasileiro, assim como, consolidar as conquistas de forma que introduziu o conceito de união estável, reduziu de cinco para dois anos o tempo exigido para o divórcio direto e impediu qualquer discriminação a respeito da origem dos filhos entre outros temas reservados à legislação ordinária agora, tratados pela Constituição Federal.
O texto constitucional também expandiu o instituto jurídico da família, dedicando-se ao planejamento familiar e à assistência à família. Em relação ao planejamento familiar citado, o constituinte enfrentou o problema da limitação da natalidade, fundando-se nos princípios da dignidade da pessoa humana e da paternidade responsável, competindo ao Estado propiciar recursos educacionais e científicos para o exercício desse direito. Entendeu-se também, que cabe ao casal a escolha do critério e do modo de agir, sendo, portanto, vedado qualquer coerção por parte de instituições oficiais ou particulares. (GONÇALVES, 2010)
Quanto à assistência direta à família, foi estabelecido que seria assegurado pelo Estado, à família, ou seja a pessoa de cada um dos que integram, criando formas de coibir a violência no âmbito familiar.
Após o advento da Constituição Federal de 1988 e com todas as mudanças ocorridas até então, levaram à aprovação do Código Civil de 2002 trazidas por esta em nosso país, Assim, a supremacia da igualdade e a queda da discriminação pela Carta Maior fez com que, por exemplo, o papel da mulher dentro da família e da própria sociedade fosse completamente modificado.
Acrescente-se, por fim, que há, na doutrina, uma tendência de ampliar o conceito de família, para abranger situações não mencionadas pela Constituição Federal. Fala-se, assim, em filhos;
a) Família matrimonial: decorrente do casamento;
b) Família informal: decorrente da união estável;
c) Família monoparental: constituída por um dos genitores com seus
d) Família anaparental: constituída somente pelos filhos;
e) Família homoafetiva: formada por pessoas do mesmo sexo;
f) Família eudemonista: caracterizada pelo vínculo afetivo.
A proteção à união estável se estabeleceu como uma figura importante trazida pela Magna Carta. Na medida em que várias famílias foram sendo criadas sem a existência fática de um matrimônio, o Direito Civil teve que se adaptar à realidade social, e fugir do Código Civil de 1916. Juntamente a isso, foi introduzida a ideia da autossuficiência, ao comportamento do ser humano na sociedade moderna e retornando aos antepassados de uma maneira muito mais complexa. Em outras palavras, muitas pessoas entendem que a figura da relação entre o homem e a mulher não é mais necessária. Há, ainda, aqueles que entendem não ser importante o matrimônio e a união, necessitando um do outro apenas para satisfações pessoais. Ou seja, tem se deixado de lado valores religiosos, regras sociais em prol da adaptação legislativa.
No atual diploma do Código Civil, além de enfatizar a igualdade dos cônjuges, este proíbe a interferência das pessoas jurídicas de direito público na comunhão de vida instituída pelo casamento, como também disciplina o regime do casamento religioso e seus efeitos.
O novo Código Civil amplia, ainda, o conceito de família, regulando a união estável como entidade familiar; revendo os preceitos pertinentes a contestação da figura do marido, pela legitimidade do filho; confirma a igualdade entre os filhos em direitos e qualificações; enfraquece o principio da imutabilidade do regime de bens; entre tantas outras ampliações.
Essas alterações ocorridas no direito de família, advindas da Constituição Federal de 1988 e do Código Civil de 2002, comprovam e acentuam a função social da família no direito brasileiro.
1.3. DO CONCUBINATO A UNIÃO ESTÁVEL
Durante longo período histórico, a união duradoura entre homem e mulher que não fossem casados, era chamada de concubinato. No entanto, seu conceito tem sido considerado, o de vida prolongada em comum sob o mesmo teto, com aparência de casamento.
Destarte, a união livre se distingue do casamento, sobretudo pela liberdade de descumprir os deveres a estes inerentes. Algumas doutrinas esclarece que o estado de concubinato pode ser desfeito a qualquer instante.
Assim, a finalidade desta união livre significa a deliberação de rejeitar o vínculo matrimonial, não assumindo compromissos recíprocos. Ou seja, nenhum dos amantes pode queixar, se o outro tiver sido beneficiado dessa liberdade.
As restrições existentes no Código Civil passaram a ser aplicadas apenas aos casos de concubinato adulterino, em que o homem vivia com a esposa e, simultaneamente, mantinha concubina. Contudo, quando este homem se encontrava separado de fato da esposa e estabelecia com a concubina um relacionamento de marido e mulher, tais restrições não eram aplicadas, a mulher passava-se então a ser chamada de companheira.
Por um longo período o instituto foi tratado somente dentro da seara do direito civil, até que a Constituição de 1988 trouxe avanços significativos para o concubinato, estabelecendo em seu artigo 226, §3º : "[...] para efeito de proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher, como entidade familiar, devendo a lei facilitar a sua conversão em casamento".Com tal previsão o concubinato deixou de ser discutido no ramo do Direito Obrigacional e passou a ser tratado dentro do Direito de Família, pois a Magna Carta o enquadrou como uma das formas entidade familiar.
Como ensina Caio Mário da Silva Pereira:
Num primeiro plano, o Constituinte de 1988 passou a considerar as uniões extraconjugais como realidade jurídica, e não apenas como um fato social. Retirou-lhes todo o aspecto estigmatizante, no momento em que as colocou sob a proteção do Estado. Não se pode eliminá-la do âmbito do Direito Civil. Eis que a Constituição as insere no artigo 226, no Capítulo destinado à Família. (PEREIRA, 2010, p. 578)
Desta forma, a Constituição Federal de 1988 expandiu o conceito de família, permitindo o reconhecimento de entidades familiares mesmo que duas pessoas não fossem casadas, com a mesma proteção jurídica dedicada aquelas que se submetessem ao casamento, modificando de forma inovadora a compreensão do direito de família, que até então se fundava necessariamente no matrimônio.
O reconhecimento da união estável como entidade familiar (art.226, § 7º) representou um grande passo jurídico e sociológico no meio social.
Conforme o que salienta Gonçalves (2010, p. 582):
O Supremo Tribunal Federal assentou, a propósito, que o cônjuge adúltero pode manter convívio no lar com a esposa e, fora, com outra mulher, como pode também separar-se de fato da esposa, ou desfazer desse modo a sociedade conjugal, para viver more uxório com a outra .
Na primeira hipótese é o considerado concubinato, segundo o conceito moderno. Já na segunda hipótese seria a união de fato, merecendo a mulher ser havida de companheira.
Similarmente começou a ser utilizada as expressões concubinato impuro , fazendo referência ao adulterino, envolvendo pessoa casada e com ligação amorosa com terceiro, ou apontando que mantêm mais de uma união de fato. E também concubinato puro ou companheirismo, que seria a convivência duradoura, como marido e mulher, sem impedimentos resultante de outra união. Convém ressaltar que nem todos os impedidos de se casarem são concubinos, como no caso de separação de fato.
No momento em que a Constituição Federal proclamou, no artigo 226, § 3º: “Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher, como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento”. A partir disso se deu o grande passo no direito de família. Ou seja, aquela relação familiar que deu origem fora do casamento passou a ser denominada de união estável, ganhando assim lugar novo no ordenamento jurídico.
Desta maneira, pode-se dizer que se deu a evolução histórica do concubinato no Brasil, no Direito de Família, especialmente a partir da Constituição 1988, que incorporou em seu texto expressamente o concubinato, reconhecendo a união estável como uma das formas de família; a Lei n. 8.971, de 29/12/1994, regulando o direito dos companheiros a alimentos e a sucessões; a Lei n.9.278, de 13/05/1996, procurando regulamentar o §3° do art.226 da Constituição Federal; e em 2002 a incorporar ao texto do Novo Código Civil, a compreensão da união estável como forma de constituição de família.
CAPÍTULO II
DA UNIÃO ESTÁVEL
2.1. CONCEITO E EVOLUÇÃO HISTÓRICA
A união estável é considerada uma entidade familiar protegida pelo Estado através da Constituição Federal e leis próprias que a regulam. Surgiu através de um anseio popular e uma evolução histórica.
Assim, a legislação veio para regular fato que já existiam e estavam gerando constantes conflitos perante o judiciário.
São vários os conceitos de ilustres doutrinadores acerca da união estável: Para Álvaro Villaça de Azevedo, a união estável é:
A convivência não adulterina nem incestuosa, duradoura, pública e contínua, de um homem e de uma mulher, sem vínculo matrimonial, convivendo como se casados fossem, sob o mesmo teto ou não, constituindo, assim, sua família de fato.( AZEVEDO, 2000 ).
Já a Lei n.º 9.278/1996, regula o parágrafo 3º do artigo 226 da Constituição Federal, “Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento.” No qual, reconhece como união estável, a convivência duradoura, pública e contínua, de um homem e de uma mulher, estabelecida com objetivo de constituição de família.
Washington de Barros Monteiro por sua vez, tem um conceito generalizado do concubinato, conhecido também por “união livre”, que é entendido como “ o de vida prolongada em comum, sob o mesmo teto, com a aparência de casamento”.
Silvio Rodrigues complementa, ensinando que “é fundamental para que se caracterize a união estável a fidelidade recíproca entre os companheiros”.
Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho (p. 420, 2011), já considerando a possibilidade de união homoafetiva, afirma que “podemos conceituar a união estável como uma relação afetiva de convivência pública e duradoura entre duas pessoas, do mesmo sexo ou não, com o objetivo imediato de constituir família”.
Dessa forma, entende-se por união estável, a união entre um homem e uma mulher, ou entre duas pessoas do mesmo sexo, que não estão ligados por um casamento civil, mas que possuem um relacionamento afetivo contínuo e duradouro, de conhecimento público e com o objetivo de constituir família.
No entanto, a primeira regulamentação constitucional que trata da união estável adveio da Lei n. 8.971 de 29 de dezembro de 1994, na qual estabeleceu como “companheiros” o homem e a mulher que comprovadamente tenham uma união, na qualidade de solteiros, separados judicialmente, divorciados ou viúvos, por mais de cinco anos, ou com prole (concubinato puro).
Destarte, a Lei n. 9.278 de 10 de maio de 1996, modificou o requisito do prazo mínimo de cinco anos de duração e da existência de filhos para caracterização da união estável, ao estabelecer o direito a alimentos. Assim, a mencionada lei preceituava em seu art. 1º que “É reconhecida como entidade familiar a convivência duradoura, pública e contínua, de um homem e uma mulher, estabelecida com objetivo de constituição de família". Sendo, portanto, utilizada a expressão de “convivente” e não mais “companheiros”.
Ainda que, o referido artigo não aludisse expressamente à união estável pura, ou seja, não incestuosa e não adulterina, evidentemente era aplicada a ela. Não obstante, mesmo o art. 226, § 3º da Constituição Federal, não trazendo expresso acerca do assunto, os mencionados dispositivos apontavam o objetivo da constituição familiar, quais seja o impedimento de concubinato impuro ou desleal.
Concluindo-se assim, com a referida lei, que não era possível a simultaneidade de casamento e união estável, ou de mais de uma união estável.
Assim, com a inclusão desta matéria no âmbito do Código Civil de 2002, foram revogadas as mencionadas Leis n.º 8.971/94 e 9.278/96, sendo feita mudanças significativas, inserindo o título referente a união estável no Livro de Família e incorporando os princípios básicos das aludidas leis em cinco artigos (1.723 a 1.727), bem como inserindo disposições em outros capítulos quanto a certos efeitos, como nos casos de obrigação alimentar (CC, art. 1.694).
Art. 1.694. Podem os parentes, os cônjuges ou companheiros pedir uns aos outros os alimentos de que necessitem para viver de modo compatível com a sua condição social, inclusive para atender às necessidades de sua educação.
§ 1o Os alimentos devem ser fixados na proporção das necessidades do reclamante e dos recursos da pessoa obrigada.
§ 2o Os alimentos serão apenas os indispensáveis à subsistência, quando a situação de necessidade resultar de culpa de quem os pleiteia.
E também, tratou nesses dispositivos, dos aspectos pessoais e patrimoniais, deixando para o ramo das sucessões o efeito patrimonial sucessório.
2.2. REQUISITOS PARA A CONFIGURAÇÃO DE UNIÃO ESTÁVEL
A ausência de formalismo é umas das características para a constituição da união estável. Enquanto o casamento é um ato formal, precedido de um processo de habilitação, com publicação dos proclamas e de inúmeras outras formalidades, a união estável independe de qualquer solenidade, bastando o fato de vida em comum.
Os requisitos de ordem subjetiva são: a convivência more uxorio e o affectio maritalis. O primeiro consiste na “comunhão de vidas, no sentido material e imaterial, em situação similar à de pessoas casadas”. Este requisito envolve a mútua assistência moral, material e espiritual, caracterizada pelos interesses e atos comuns, inerentes à entidade familiar. (GONÇALVES, 2008. p. 551-552).
Embora o art 1.723 do Código Civil não explicita a coabitação ou vida em comum sob o mesmo teto, este se faz como a característica principal da união estável.
Já o affectio maritalis consiste no ânimo ou objetivo de constituir família, isto é, que além do afeto, o ânimo, propósito comum de formação de uma entidade familiar.
Não configura união estável, os encontros amorosos mesmo constantes, relações sexuais continuas, viagens realizadas a dois, ou comparecimento juntos à festas, ou qualquer outro evento publico e notório. Se não houver em nenhum momento a intenção de constituir família.
Os requisitos objetivos para a constituição da união estável, na lição de Carlos Roberto Gonçalves (2014, p. 622) são: “a notoriedade, a estabilidade ou duração prolongada, a continuidade, a inexistência de impedimentos matrimoniais, a relação monogâmica e a diversidade de sexos”.
A notoriedade não consiste necessariamente na publicidade do relacionamento, mas também não pode a união permanecer em sigilo, em segredo, desconhecida do meio social. Ou seja, para a configuração desse requisito basta que os companheiros tratem-se socialmente como marido e mulher, revelando sua intenção de constituir família.
O requisito da estabilidade ou duração prolongada não exige um tempo mínimo de convivência para a configuração da união estável, mas sim o suficiente para que possa que se reconheça a estabilidade da relação que pode ser de meses ou de anos, desde que nesse período fique comprovada a intenção de constituir uma família.
Desse modo, em cada caso deverá verificar se a união perdura, por tempo suficiente, ou não, para o reconhecimento da estabilidade familiar.
Ademais, faz-se necessário para a configuração da união estável a existência de continuidade no relacionamento, sem interrupções, como desavenças, desentendimentos que ocorre com todos os casais. Todavia, se este rompimento for sério, e durar por muito tempo caracterizando quebra da vida em comum, então estará se rompendo um dos requisitos próprios da união estável. Sendo que, a instabilidade causada por constantes rupturas no relacionamento pode provocar insegurança jurídica.
A inexistência de impedimentos matrimoniais que está previsto no §1º do artigo 1.723 do Código Civil, onde estão vedadas as uniões estáveis quando presentes os impedimentos matrimoniais do artigo 1.521.
Art. 1.521. Não podem casar:
I - os ascendentes com os descendentes, seja o parentesco natural ou civil; II - os afins em linha reta;
III - o adotante com quem foi cônjuge do adotado e o adotado com quem o foi do adotante;
IV - os irmãos, unilaterais ou bilaterais, e demais colaterais, até o terceiro grau inclusive;
V - o adotado com o filho do adotante; VI - as pessoas casadas;
VII - o cônjuge sobrevivente com o condenado por homicídio ou tentativa de homicídio contra o seu consorte.
A única exceção trazida pelo Código é em relação às pessoas casadas, separadas de fato ou judicialmente que, ainda que impedidas de contrair matrimônio, podem conviver em união estável.
Pela mesma razão, é necessária para a caracterização da união estável que ambos os companheiros tenham relação monogâmica, isto é, não se admite que pessoa casada, não separada de fato, venha constituir união estável, nem que aquela que convive com um companheiro venha constituir outra união estável.
Por fim, era requisito para a caracterização da união estável a diversidade de sexo entre os companheiros, conforme preceitua o artigo 226, §3º da Constituição Federal e o artigo 1.723 do Código Civil. Na lição de Carlos Roberto Gonçalves, “por se tratar de modo de constituição de família que se assemelha ao casamento, apenas com a diferença de não exigir a formalidade da celebração, a união estável só pode decorrer de relacionamento de pessoas de sexo diferente”. (GONÇALVES, 2014, p. 635 )
No entanto, eminentes doutrinadores viram a necessidade de colocar em evidência, com absoluta correção, e atribuir o verdadeiro estatuto de cidadania às uniões estáveis homoafetivas. Ressaltando o exposto é o entendimento do Tribunal de Justiça do Rio Grande do sul na apelação cível nº 70038506176:
AÇÃO DECLARATÓRIA DE RECONHECIMENTO DE UNIÃO ESTÁVEL
HOMOAFETIVA. Há possibilidade jurídica na ação declaratória de união estável mantida entre pessoas do mesmo sexo, uma vez preenchidos os demais requisitos exigidos em lei. Precedentes desta Corte e do Superior Tribunal de Justiça. Configurada a continuidade e a publicidade da união pelas partes, com o intuito de constituir família, é de ser reconhecida a união estável homoafetiva. Sentença de procedência confirmada. (Acesso em 07 jun. 2016)
Assim, no dia 05 de maio de 2011, o Supremo Tribunal Federal, ao julgar a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADIn) 4.277 e a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 132, reconheceu a união homoafetiva como entidade familiar, regida pelas mesmas regras que se aplicam à união estável dos casais heterossexuais.
2.3. EFEITOS JURÍDICOS DA UNIÃO ESTÁVEL
A união estável e um fato jurídico gerando efeitos no direito de família. Assim, podemos dizer que se trata de um casamento informal e que a tendência será de equipara-la a um casamento oficial.
Sendo assim, embora a união estável não devesse gerar consequências idênticas às do matrimonio (a lei somente a equiparou a entidade familiar), o novo Código Civil, a legislação extravagante e a jurisprudência têm evoluído no sentido de possibilitar que, além dos deveres de lealdade, respeito e assistência mútua material e imaterial, haja responsabilidade pela guarda, pelo sustento e pela educação dos filhos, dentre outros. Eis alguns efeitos jurídicos:
2.3.1. Dos direitos dos companheiros
2.3.1.1. Relações Patrimoniais
Para que tal direito fosse conquistado/reconhecido a contribuição da jurisprudência foi decisiva, pois foi a partir dela que surgiram leis regulamentando o assunto. Arnoldo Wald faz interessante observação sobre o problema:
[...] houve na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal uma evolução dialética. Inicialmente, os tribunais negavam qualquer direito à concubina. Em seguida, considerou-se que o concubinato, por si só, justificava o direito da companheira à meação com base na teoria do enriquecimento sem causa. Com a Súmula 380, temos a síntese na qual se distinguem as relações pessoais e patrimoniais, considerando que somente a prova da efetiva contribuição da concubina na formação do patrimônio comum justificaria o seu direito à meação ou a outra fração do patrimônio comum. ( WALD, 2005, p. 295)
A questão da partilha do patrimônio comum na união estável gerou muita discussão e, durante muito tempo as decisões jurisprudências basearam-se em Súmulas do STF16, até que surgissem as Leis 8.971/94 e 9.278/96. Existiam vários posicionamentos sobre o assunto, todavia, constatamos que a opinião dominante e atual é a no sentido de que a contribuição dos companheiros não precisa ser necessariamente financeira, entendendo-se que a expressão "esforço comum" (presente na Súmula 380 do STF) pode englobar também a colaboração indireta, como o suporte doméstico. Esse é o posicionamento sustentado nos julgados seguintes:
[...] O trabalho desenvolvido no lar pela concubina, propiciando tranqüilidade e alento ao companheiro para os seus negócios, autoriza, em caso de dissolução de sociedade de fato, a partilha do patrimônio adquirido pelo esforço comum. (Acesso em 07 de jun.2016).
Assim, a contribuição da companheira deve ser valorizada na união estável, todavia, entendemos não valer tal proteção para os casos de concubinato adulterino/impuro. Ressaltamos, também, que não são em todas as uniões estáveis que surge a necessidade de se partilhar o patrimônio, pois, há casos em que existe
sim uma relação afetiva, mas não há relação patrimonial comum, ou seja, os patrimônios dos companheiros não estão coligados, assim como nos casamentos com separação de bens. O julgado abaixo exemplifica tal situação:
O simples concubinato não pressupõe a existência de sociedade de fato. A prova dos autos autoriza a conclusão de que, não obstante o longo tempo de união, cada patrimônio se conservava separado, visto que não basta a convivência more uxório para gerar meação. (Acesso em 07 de jun.2016)
Os tribunais, antes da previsão constitucional de que as uniões estáveis são espécies de entidades familiares, baseavam-se na teoria da sociedade de fato e, diante da dificuldade de se mensurar a contribuição de cada um, faziam a partilha meio a meio. Com a Constituição de 1988 incluindo as uniões estáveis entre as formas de entidade familiar, os companheiros passaram a receber tratamento semelhante aos casados sob o regime da comunhão parcial de bens. As leis 8.971/94 e 9.278/96, bem como o NCC confirmaram tal entendimento, porém este último previu a possibilidade dos conviventes, por meio de contrato escrito, convencionarem outra forma de divisão patrimonial (artigo 1725, NCC).
2.3.1.2. Alimentos Entre Companheiros
O direito à alimentos entre companheiros gerou muitas discussões, e até o advento da Lei 8.971/1994, os conviventes apenas obtinham o direito a alimentos por meios indiretos, como por exemplo, através de ações pleiteando indenização por serviços prestados. O ilustre jurista Yussef Cahali (1995, p. 10) resume a situação anterior a Constituição de 1988 da seguinte maneira:
Antes da Constituição de 1988, exauria-se o direito da companheira no simples direito à meação dos bens da sociedade de fato (Súmula 380). A seu turno, a jurisprudência vinha decidindo sistematicamente pela inexistência de obrigação legal de alimentos em favor da companheira: simples concubinato não confere à mulher o direito de pleitear alimentos do amásio; a obrigação alimentar é condicionada por leis às relações de parentesco ou à existência de vínculo conjugal.
Com a Constituição de 1988 criando a figura da entidade familiar, que engloba as uniões estáveis, a polêmica acirrou-se ainda mais. Decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo, em julgado de 1990, entendeu que:
A nova Carta Constitucional evitou a equiparação do concubinato ao casamento, pela proeminência que deu a este instituto. Assim, a obrigação alimentar entre os concubinos escapa ao âmbito da norma do artigo 226,
§3o . da CF. O dispositivo cria função de assistência para o estado, não para o companheiro frente à companheira e vice-versa. (Acesso em 07 de jun.2016)
Outra corrente caminhava em sentido contrário e acreditava que os companheiros deveriam receber alimentos, um grande defensor dessa corrente foi o jurista gaúcho — Sérgio Gischkow Pereira - que argumentava ter a Constituição enquadrado o concubinato entre as formas de entidade familiar, sendo assim uma espécie de família à qual o estado devia proteção e, se a existência de uma relação concubinária provocava a perda de alimentos percebidos em decorrência de anterior casamento, podia-se presumir um dever alimentar entre os concubinos.
Da análise dos variados posicionamentos sobre o assunto, podemos constatar que o maior empecilho para a aceitação do direito a alimentos entre companheiros residia na dificuldade de se compreender a ampliação das formas de família, com a instituição da entidade familiar.
Gradativamente os tribunais passaram a reconhecer a proteção jurídica ao concubinato, inicialmente os julgados referiam-se à questões previdenciárias e, com o passar do tempo foram sendo concedidos alimentos em ações de dissolução de união estável, com a edição da Lei 8.971/94 acabou a polêmica em torno da concessão ou não de alimentos aos companheiros. E, a Lei 9.278/96 reforçou o disposto na lei anterior ao estabelecer entre os direitos e deveres dos companheiros a "assistência moral e material recíproca".
O Novo Código Civil consagrou o disposto nas Leis 8.971/94 e 9.278/96, mantendo os requisitos de necessidade do alimentado e possibilidade do alimentante. E, quanto à questão da culpa dispôs no §2º do artigo 1694: "Os alimentos serão apenas os indispensáveis à subsistência, quando a situação de necessidade resultar de culpa de quem os pleiteia"
2.3.2. Dos deveres dos companheiros
No que se refere aos deveres de guarda, sustento, educação dos filhos, é possível de ser percebido no Estatuto da Criança e do Adolescente, assim, independentemente de haver casamento, não irá diminuir a responsabilidade daqueles que são responsáveis pelo crescimento e desenvolvimento da criança.
Destarte, encontramos certos regulamentos no Código Civil, os quais são relativos aos deveres, como por exemplo, o art. 1724 que assim expressa: “As relações pessoais entre os companheiros obedecerão aos deveres de lealdade, respeito e assistência, e de guarda, sustento e educação dos filhos.”
Os três primeiros são direitos e deveres recíprocos, dando seguimento os de guarda, sustento e educação dos filhos. O dever de fidelidade recíproca está implícito nos de lealdade e respeito. Embora o Código Civil não fale em adultério entre companheiros, a lealdade é gênero de que a fidelidade é espécie. E o dispositivo em apreço exige que eles sejam leais
Nesse sentido, temos o entendimento do ilustre Guilherme Calmon Nogueira da Gama, que assim dispõe:
[...] ao lado do casamento, o companheiro também impõe o dever de fidelidade a ambos os partícipes, e não apenas a um deles, ante a regra constitucional já analisada. Tal conclusão se afigura coerente com os contornos traçados pela doutrina e pela jurisprudência na caracterização do companheirismo que, repita-se, deve ser único vínculo que une o casal em perfeito clima de harmonia e estabilidade. Não haveria a configuração do companheirismo na hipótese de prática desleal perpetrada por um dos companheiros, mantendo conjunção carnal com terceiro, inexistindo a denominada affectio maritalis no caso específico. (GAMA, 2001, p. 232)
O dever de respeito consiste basicamente em não ofender os direitos e personalidades do companheiro, considerando a individualidade do outro. Bem como, os concernentes à liberdade, à honra, à intimidade, e à dignidade. Será estes rompidos quando um dos companheiros cometer injúria grave contra o outro, atingindo desta forma, a honra ou a imagem mediante o emprego de palavras e gestos ofensivos.
Quanto a assistência, esta também deverá ser mútua, como bem expressa o art. 1.566,III do Código Civil: “III- mútua assistência”
Por sua vez, o dever de assistência recai sobre a ideia do mútuo auxílio, em qualquer circunstância, tanto na parte financeira e alimentar, quanto na esfera moral e também espiritual, especialmente em situações difíceis.
Quanto ao dever de guarda, sustento e educação dos filhos, decorre não em razão da união estável em si, mas do próprio vínculo parental, onde os pais devem zelar pelos filhos, independente da relação afetiva.
Interessante notar que nem no rol dos direitos e deveres dos conviventes o legislador mencionou o dever de coabitação do casal, isto é, que vivam sob o mesmo teto. Concluindo assim, que a coabitação é dispensável.
2.4. UNIÃO ESTÁVEL E CASAMENTO
2.4.1. Diferenças e semelhanças
Antes da vigente Constituição Federal, o casamento era a única forma de legitimação da família (CC/16, art. 229). Não é mais assim. A Constituição passou a reconhecer também outras formas de entidade familiar, como a união estável e a comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes (art. 226,§§ 3º e 4º).
O casamento civil é ato solene em que o Estado intervém desde a habilitação, para controle da inexistência de impedimentos, até a celebração por autoridade competente. Caracteriza-se como contrato, porque resultante do necessário consentimento dos contraentes, mas depende, ainda, da final declaração do celebrante, de que se acham casados na forma da lei. Para ter eficácia “erga omnes”, efetua-se o registro de casamento no Cartório de Registro Civil das Pessoas Naturais, extraindo-se a certidão que constitui prova do ato.
Feito este esclarecimento, agora serão estudadas as principais diferenças entre estas duas formas de entidade familiar, que consistem essencialmente na maneira como são formadas, como são extintas e nos efeitos após a morte.
Quanto à sua formação, o casamento civil é formalizado por meio de uma celebração realizada por um juiz de paz. Finalizada a celebração, o casamento será registrado em um cartório de registro civil, sendo expedida uma certidão de casamento devidamente registrada. Trata-se, portanto, de um ato formal. Já a união estável se forma "no plano dos fatos", ou seja, duas pessoas passam a viver juntas, por determinado período de tempo, com a intenção de constituir entidade familiar; isso basta para que exista a união estável. A lei não exige formalidade, conforme visto anteriormente.
No tocante a extinção do casamento civil, também deverão ser observadas algumas formalidades, por exemplo: no caso do casal possuir filhos menores, o casamento terá que ser extinto perante o Poder Judiciário, na presença de um juiz de direito. Já no caso de não haver filhos menores e existir um acordo entre as partes, a extinção poderá ser feita por escritura pública em um tabelionato de notas. No caso da união estável, sua extinção se dá no “plano dos fatos”, assim como é sua formação, ou seja, se os companheiros deixaram de morar juntos a união será considerada extinta. A única exigência é provar que a união não existe mais. Como meio de prova aceita-se, por exemplo, um contrato de locação que estava no nome dos dois companheiros e agora está apenas no nome de um; uma conta conjunta que não existe mais e, principalmente, com testemunhas, que comprovem o término da união.
Finalmente, no que tange os efeitos após a morte, para o casamento civil deverá ser observado o regime de bens estabelecido pelas partes no ato do casamento, permitindo assim, fazer a partilha de acordo com o regime matrimonial adotado pelos cônjuges. Por exemplo, na hipótese do casamento ter adotado o regime da comunhão parcial, só os bens adquiridos onerosamente durante o curso do casamento é que se comunicarão ao outro cônjuge, ou seja, somente os bens comuns. Isso é a chamada meação. Mas caso a pessoa tenha bens exclusivos, ou seja, adquiridos antes do casamento, o cônjuge receberá a sua quota de direito através de herança, por ser um herdeiro necessário sobre os bens exclusivos do falecido, onde ele concorre com os filhos do falecido. Já na hipótese de o casamento ter adotado o regime da separação total eletiva, o cônjuge não terá direito à meação, porém será herdeiro sobre todos os bens do falecido, concorrendo com os filhos do falecido.
Na união estável, por sua vez, não existem os mesmos direitos sucessórios. O companheiro ou companheira vai atingir somente os bens que foram adquiridos onerosamente na vigência da união estável (o que não inclui os bens exclusivos). E, mais do que isso, os companheiros não são considerados herdeiros necessários.
Além destas diferenças, cumpre ressaltar a segurança jurídica trazida pelo casamento, pois o estado civil de casado é adquirido apenas após o casamento civil. Se o casal está em uma relação de união estável, os respectivos companheiros terão estado civil de solteiro, divorciado, separado ou viúvo. Não pode ser atribuído um estado civil para uma relação que não possui qualquer tipo de formalidade.
2.4.2. Conversão da união estável em casamento
O tema referente à conversão da união estável em casamento é tratado no art. 1.726 do Código Civil, porém sem maior aprofundamento, não apresentando qualquer facilidade para esse procedimento. O Código Civil, por omissão, contraria expressamente a previsão do art. 226, § 3º, da Constituição Federal, que reza: “Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento.” Na verdade, o que tem se notado é uma verdadeira dificuldade da inadequada referência a pedido dos companheiros ao juiz, pois não se sabe ao certo
qual é o juiz competente para essa conversão, nem qual é o procedimento correto.
Assinala Marco Túlio Murano Garcia que o sentido que o novo Código Civil quis dar à conversão, mormente ao condicionar o seu aperfeiçoamento à chancela jurisdicional, o que a Lei nº. 9.278/96 não fazia,
[...] foi de que, por força da conversão, o casamento englobasse o tempo já vivido em união estável, protraindo os seus efeitos no tempo. Porque do contrário seria mais simples que os conviventes simplesmente se casassem ao invés de converter a união estável em casamento. Com a conversão, seria como se o casamento tivesse ocorrido quando surgiu a união estável. Daí que no tal pedido judicial os conviventes teriam que demonstrar a união e o seu termo inicial, requerendo, então, que a união comprovada fosse convertida em casamento. De outro modo a norma fica sem sentido. E as normas, por princípio de hermenêutica, não devem conter disposições inúteis. (GARCIA, apud GONÇAVES, 2014, 39)
É evidente que o oficial devera exigir todas as providências que o Código Civil prevê para a habilitação ao casamento, especialmente para fins de verificação da existência de impedimentos, sob pena de restar frustrada a figura do casamento civil.
A determinação para que a conversão seja judicial e não administrativa dificultará o procedimento, ao invés de facilitá-lo, como recomenda a norma constitucional. Na prática continuará sendo mais simples as pessoas casarem diretamente do que converterem sua união estável em casamento.
CAPÍTULO III INCONSTITUCIONALIDADE DO ARTIGO 1790
3.1. SUCESSÃO DO COMPANHEIRO SUPÉRSTITE
Os preceitos compreendidos no art. 1.790 do Código Civil diferem a sucessão dos companheiros, da sucessão dos cônjuges, sendo clara a evidência de inconstitucionalidade.
A diferenciação no atual Código Civil é bem explícita, uma vez que, o companheiro só tem direito hereditário, em concorrência com os descendentes, em relação aos bens adquiridos onerosamente na constância da união estável, ou seja sobre os aquestos, bens sobre os quais já tem direito a meação.
Art. 1.790. A companheira ou o companheiro participará da sucessão do outro, quanto aos bens adquiridos onerosamente na vigência da união estável, nas condições seguintes:
I - se concorrer com filhos comuns, terá direito a uma quota equivalente à que por lei for atribuída ao filho;
II - se concorrer com descendentes só do autor da herança, tocar-lhe-á a metade do que couber a cada um daqueles;
III - se concorrer com outros parentes sucessíveis, terá direito a um terço da herança;
IV - não havendo parentes sucessíveis, terá direito à totalidade da herança.
Enquanto, o art. 1.829 só admite a cota hereditária do cônjuge supérstite, quando concorre com descendentes, nos bens particulares, em relação aos quais não tem meação.
Art. 1.829. A sucessão legítima defere-se na ordem seguinte:
I - aos descendentes, em concorrência com o cônjuge sobrevivente, salvo se casado este com o falecido no regime da comunhão universal, ou no da separação obrigatória de bens (art. 1.640, parágrafo único); ou se, no regime da comunhão parcial, o autor da herança não houver deixado bens particulares;
II - aos ascendentes, em concorrência com o cônjuge;
III - ao cônjuge sobrevivente;
IV - aos colaterais.
Antes de vigorar o Código Civil de 2002, as legislações que tratavam da sucessão dos companheiros eram as Leis de nº 8971/94 e 9278/96, que garantiam amplos direitos e prevalecia o tratamento quase que igualitário entre o companheiro e o cônjuge. Essas Leis vieram para completar a normatividade do art. 226, §3° da Constituição Federal.
No entanto, ao preparar o atual Código Civil, o legislador retrocedeu no tratamento que o companheiro recebia, conforme a aplicação das referidas leis, elaboradas para completar o art. 226, §3° da CF.
Nesse sentido, ao analisar o caput do art. 1.790, “A companheira ou o companheiro participará da sucessão do outro, quanto aos bens adquiridos onerosamente na vigência da união estável”, verifica-se a limitação ao estabelecer que comunicam-se os bens havidos pelo trabalho de um ou de ambos de forma onerosa durante a existência da união estável. Desta forma, nota-se que, em relação ao companheiro, não há que se falar em sucessão de bens particulares, ou seja, aqueles obtidos anteriormente à união estável, ou recebidos a título gratuito, por doação ou sucessão.
Ressalta-se que a norma não está tratando de meação, mas de sucessão ou herança, independentemente do regime de bens adotado. Deste modo, pode-se afirmar que, o companheiro é meeiro e herdeiro, assim esta união estável é conduzida pelo regime da comunhão parcial de bens (art. 1.725 do CC).
O artigo mencionado é claro em seus incisos, e não deixa margem a dúvidas de quando o companheiro terá direito a participação na sucessão do outro.
O art. 1.790 do Código Civil de 2002, do qual inovou o regime sucessório dos conviventes em união estável, tem despertado realmente debates doutrinário e jurisprudencial.
Segundo Francisco José Cahali, por exemplo, a assertiva é de que:
[...] a nova lei força caminho na contramão da evolução doutrinária, legislativa e jurisprudencial elaborada à luz da Constituição Federal de 1988[...]
houve um reprovável retrocesso, privando os partícipes da união estável de várias conquistas alcançadas com muito esforço da sociedade [...] (CAHALI, 2003, p. 228).
No mesmo sentido se manifestou Zeno Veloso, para quem o art. 1.790 deve ser censurado por ser claramente deficiente e falho. Significa um retrocesso
evidente. Pois, o artigo 1790 é extremamente injusto e diminuiu a importância da figura dos companheiros e da união estável frente a outras entidades familiares. (VELOSO, 2010)
Ao acusar a inconstitucionalidade do art. 1.790 do Código Civil, Fábio Ulhoa entende que a união estável possui a mesma proteção que o Estado confere a famílias fundadas no casamento.
Desta forma, conclui-se que os Tribunais receiam em reconhecer a suposta inconstitucionalidade do art. 1790 do Código Civil de 2002, entretanto, apontam a injustiça que tal dispositivo legal ocasiona aos conviventes.
Entretanto, este entendimento injusto aos companheiros vem se modificando ao longo dos últimos anos.
Nota-se assim que, esta é uma grande revolução por parte deste Tribunal, uma vez que deixou de aplicar o texto da lei civil para adequar o caso concreto ao que é realmente justo, inclusive, declarando a inconstitucionalidade do art. 1790 do Código Civil.
Caso seja entendido que o artigo 1.790 é realmente inconstitucional e que o companheiro deve receber tratamento equiparado ao do cônjuge, ou seja, o companheiro passará a ter o direito real de habitação por força do artigo 1.831.
Art. 1.831. Ao cônjuge sobrevivente, qualquer que seja o regime de bens, será assegurado, sem prejuízo da participação que lhe caiba na herança, o direito real de habitação relativamente ao imóvel destinado à residência da família, desde que seja o único daquela natureza a inventariar.
Sílvio Venosa e alguns outros autores também defendem o direito real de habitação para o companheiro sendo essa a posição majoritária. Maria Helena Diniz ensina que:
Além disso, urge lembrar que o companheiro sobrevivente, por força da Lei nº 9278/96, art. 7º, parágrafo único, e, analogicamente, pelo disposto nos arts. 1831 do CC e 6º da CF (...), também terá direito real de habitação, enquanto viver ou não constituir nova união ou casamento, relativamente ao imóvel destinado à residência da família; mas pelo Código Civil tal direito só é deferido ao cônjuge sobrevivente. Diante da omissão do Código Civil (norma geral), o art. 7º, parágrafo único daquela Lei estaria vigente, no nosso entender, por ser norma especial. (Diniz apud Venosa 2004, p 117)
Nesse sentido, corroborando esse pensamento, há ainda o Enunciado n. 117 da Jornada de Direito Civil promovida pelo Centro de Estudos Judiciários do Conselho de Justiça Federal com a seguinte redação:
O direito real de habitação deve ser estendido ao companheiro, seja por não ter sido revogada a previsão da Lei n. 9.278/96, seja em razão da interpretação analógica do artigo 1.831, informado pelo artigo 6°, caput, da Constituição Federal de 1988”.(CASSETTARI, 2011, p. 575)
Ademais, o Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, compartilham do mesmo entendimento:
FAMÍLIA - UNIÃO ESTÁVEL - RECONHECIMENTO - EFEITOS PATRIMONIAIS - DIREITO A MEAÇÃO - DIREITO REAL DE
HABITAÇÃO. Havendo prova forte nos autos suficiente a comprovar que, até a data do óbito, o falecido e a apelada viveram como marido e mulher, forçoso reconhecer a existência de união estável. Os efeitos patrimoniais da sociedade de fato são semelhantes aos do casamento em comunhão parcial de bens (Art. 1.725 do novo Código Civil), decorrendo daí o direito a meação dos bens adquiridos na constância da união. Assim como, direito real de habitação à companheira sobrevivente, relativamente ao imóvel destinado à residência da família (art. 7º, parágrafo único, Lei nº. 9.278/96 e art. 1.831, CC). (Acesso em 07 de jun.2016)
Desta forma, no entender dos renomados autores mencionados acima, o companheiro enquanto não constituir nova união, gozará do direito real de habitação.
3.2. DO PATRIMÔNIO ADQUIRIDO PELO AUTOR DA HERANÇA ANTES DA UNIÃO OU A TÍTULO GRATUITO
Partindo de uma análise literal do caput do dispositivo acima mencionado, pode-se chegar à conclusão, segundo a qual o Código excluiu da sucessão em favor do companheiro ou companheira os bens não adquiridos onerosamente na vigência da união. Significa dizer que, em relação aos demais bens, o companheiro não participaria da sucessão, sendo, então, convocados os outros herdeiros, conforme a ordem sucessória arrolada no próprio diploma civil (FIUZA, 2003).
Primeira crítica digna de nota a esse dispositivo é da lavra do professor Euclides de Oliveira apud Carlos Gonçalves (2014, p. 625, ao aduzir que:
Demais disso, considere-se a hipótese de o falecido ter deixado apenas bens adquiridos antes da união estável, ou havidos por doação ou herança. Então, o companheiro nada herdará, mesmo que não haja parentes sucessíveis, ficando a herança vacante para o ente público beneficiário.
Essa posição não destoa do pensamento de César Fiúza (2003,p. 867), quando afirma:
Em minha opinião, seria absurdo interpretar a norma no sentido de colocar o companheiro em situação inferior à Administração Pública. A se
interpretar o art. 1.790 apenas de acordo com seu caput, poderá ocorrer o caso em que o companheiro nada herdará, por não haver patrimônio adquirido a título oneroso durante a união estável. Supondo que haja outro patrimônio, este seria incorporado aos cofres municipais. Tal situação iria muito além das raias do absurdo.
Adotamos essa linha de crítica. Deveras, entendemos que o dispositivo não é razoável, tampouco guarda consonância com a Constituição Federal, uma vez que a própria Lei Maior reconhece a união estável como entidade familiar, e sendo um dos objetivos dos direitos das sucessões a perpetuidade do patrimônio na família do de cujus , não deve prosperar a interpretação literal do caput do art. 1.790, que afasta do patrimônio hereditário do companheiro os bens individuais deixados pelo autor herança.
Nelson Nery (2003, p. 784), com clareza, perfilhando desta cognição, preleciona que:
É de se indagar se, em face da limitação do C.C. 1.790 caput, o legislador ordinário quis excluir o companheiro da sucessão desses bens, fazendo com que a sucessão deles fosse deferida ao poder público. Parece-nos que não, por três motivos: a) o CC 1844 manda que seja devolvida ao ente público, apenas na hipótese de o de cujus não ter deixado cônjuge, companheiro ou parente sucessível; b) quando o companheiro não concorre com parente sucessível, a lei se apressa em mencionar que o companheiro terá direito à totalidade da herança (CC 1790 IV), fugindo do comando do caput, ainda que sem muita técnica legislativa; c) a abertura de herança jacente dá-se quando não há herdeiro legítimo (CC 1819) e, apesar de não constar do rol do CC 1829, a qualidade sucessória do companheiro é de sucessor legítimo e não de testamenteiro.
3.3. DA INCONSTITUCIONALIDADE DO ARTIGO 1.790
A primeira observação a ser feita é que o caput do artigo 1790 limita à sucessão do companheiro aos bens adquiridos onerosamente na constância da união estável.
Dessa forma, o companheiro não possui nenhum direito em relação aos bens particulares do falecido, nem a herança e nem a meação. Sobre esta, regula os direitos patrimoniais da união estável o artigo 1725 do Código Civil, que prevê que na união estável, salvo contrato escrito entre os companheiros, aplica-se às relações patrimoniais, no que couber, o regime da comunhão parcial de bens.
O companheiro só será herdeiro dos aquestos, ou seja, os bens adquiridos a título oneroso durante a união estável. Essa restrição quanto à participação sucessória do companheiro do falecido, não existia na legislação anterior ao Código Civil de 2002. Isso porque, a Lei 8.971/94, em seu artigo 2º, caput, dispunha que “as pessoas referidas no artigo anterior participarão da sucessão do(a) companheiro(a) nas seguintes condições”.
Portanto, durante a vigência da lei em questão, o companheiro era herdeiro de todo e qualquer bem do falecido, não importando o título da aquisição (gratuito ou oneroso), nem sua época (se anterior ou posterior ao início da união). Nesse sentido, com relação ao cônjuge, nada se alterou: o cônjuge já era herdeiro (art. 1611 do CC/16) e continua sendo herdeiro (art. 1829 do CC/02), com relação á totalidade dos bens do falecido, não se distinguindo se os bens são anteriores ou posteriores ao casamento, nem o título de sua aquisição. O regime de bens apenas influencia a concorrência com os descendentes, mas não o fato de o cônjuge ser herdeiro dos bens.
3.3.1. Da concorrência com os descendentes
Artigo 1.790. [...] I - se concorrer com filhos comuns, terá direito a uma quota equivalente à que por lei for atribuída ao filho;
II - se concorrer com descendentes só do autor da herança, tocar-lhe-á a metade do que couber a cada um daqueles;
Situação não descrita na norma refere-se à sucessão híbrida, este termo foi utilizado por Giselda Maria Fernandes Novaes Hironaka, professora titular da Universidade de São Paulo. Ou seja, trata-se da utilização concomitante dos incisos I e II do artigo 1.790, pela qual o companheiro ou companheira do falecido concorrerá ao mesmo tempo, com os descendentes comuns (inciso I) e com os descendentes exclusivos do autor da herança (inciso II).
Sobre tal problemática, existem algumas correntes fundamentais bem definidas:
1ª Corrente – Em casos de sucessão híbrida, deve-se aplicar o inciso I do art. 1.790, tratando-se todos os descendentes como se fossem comuns, já que filhos comuns estão presentes. Esse entendimento é o majoritário na tabela doutrinária de Cahali: Caio Mário da Silva Pereira, Christiano Cassettari, Francisco Cahali, Inácio de Carvalho Neto, Jorge Fujita, José Fernando Simão, Luiz Paulo Vieira de Carvalho, Maria Berenice Dias, Maria Helena Daneluzzi, Mário Delgado, Rodrigo da Cunha Pereira, Rolf Madaleno e Silvio de Salvo Venosa.
2ª Corrente – Presente a sucessão híbrida, subsume-se o inciso II do art. 1.790, tratando-se todos os descendentes como se fossem exclusivos (só do autor da herança). Este autor está filiado a tal corrente, assim como Gustavo René Nicolau, Maria Helena Diniz, Sebastião Amorim, Euclides de Oliveira e Zeno Veloso. Ora, como a sucessão é do falecido, em havendo dúvida por omissão legislativa, os descendentes devem ser tratados como sendo dele, do falecido. (HIRONAKA, 2007, p. 237)
A seguinte discussão envolve a aplicação dos incisos I e II do mencionado artigo. De acordo com o inciso I, divide-se a herança em partes iguais, incluindo o convivente sobrevivente. A dificuldade para solucionar como será feita a partilha do patrimônio no caso de haver filhos da união estável e filho exclusivos do de cujus, a dúvida surge em razão do tratamento diferenciado dado quando o convivente sobrevivente concorre com os filhos nascidos da união, visto que se aplica o estabelecido no inciso I, bem como quando o companheiro que sobrevive concorre com os descendentes só do autor da herança, de forma simultânea, posto que nessa última hipótese aplica-se a norma contida no inciso II, do art. 1.790, do sobredito diploma.
A mais correta solução oferecida por Cezar Fiúza que prestigia os descendentes, não esquecendo da parte condigna que compete à companheira. Apontando que a solução seria, considerar todos os filhos como exclusivos do de cujus, independentemente da realidade fática, criando assim uma ficção jurídica (FIÚZA, 2003). De conseguinte, aos filhos caberia o quinhão proporcional e à convivente metade do conferido a cada um dos filhos, na esteira do inciso II, do art. 1.790, do Estatuto Civil.
A propósito, vale transcrever as palavras do citado autor:
Sendo assim, por pior que seja, a mim parece mais adequada a última solução, que, fictamente, insere todos os descendentes na categoria de filhos exclusivos do autor da herança, cabendo ao companheiro a metade do quinhão que tocar a cada um deles. É a solução mais favorável aos descendentes, dentro do espírito do Código [...](FIUZA, 2003, p. 871).
3.3.2. Da concorrência com outros parentes e a garantia integral do acervo hereditário
O Inciso III do artigo 1790 do código civil de 2002 prevê que “se concorrer com outros parentes sucessíveis, terá direito a um terço da herança”. Esse inciso inclui ao mencionar “outros parentes sucessíveis” os ascendentes sem considerar o grau e os colaterais até o quarto grau. Pelas palavras do Ministro Luis Felipe Salomão relator do AI no RECURSO ESPECIAL Nº 1.135.354 – PB o companheiro sobrevivente concorreria nesse caso com os irmãos, entre outros colaterais como primos e os chamados "tio-avô" e "sobrinho-neto" do companheiro falecido. Mesmo possuindo sequer grau de afinidade com o de cujus.
Baseando-se nessa concorrência são alguns argumentos do Ministro Luis Felipe Salomão relator do AI no RECURSO ESPECIAL Nº 1.135.354 – PB:
O primeiro deles é que ambas as famílias originadas pelo casamento, quanto pela união estável possuem proteção constitucional equiparadas, não podendo ser tratadas de maneira discricionária. Impedindo que o legislador conferisse menos direito para uma do que para a outra.
O segundo argumento utilizado pelo Excelentíssimo Ministro é que foram violados os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade além do direito fundamental à herança e a dignidade da pessoa humana ao ser permitido que parentes distantes do companheiro falecido concorressem com o companheiro na partilha de bens em que o companheiro sobrevivo partilhava com o de cujus em vida.
O terceiro argumento seria que a lei 8.971 de 1994 que deu um grande passo ao reconhecer direitos aos companheiros em uma união estável previu a concorrência do companheiro não com qualquer parente sucessível e sim somente com os descendentes e ascendentes e que na falta destes teria o direito à totalidade da herança. Após o silêncio a esse respeito na lei 9.278/96 o artigo 1.790 do código civil de 2002 teria violado o princípio da proibição de retrocesso em matéria de direitos fundamentais ao diminuir o direito à sucessão do companheiro supérstite trazido pela Lei 8.971/94, mais precisamente o do artigo 2º, inciso III.
Art. 2º da Lei 8.971 de 1994: As pessoas referidas no artigo anterior participarão da sucessão do(a) companheiro(a) nas seguintes condições: III
- na falta de descendentes e de ascendentes, o(a) companheiro(a) sobrevivente terá direito à totalidade da herança.
Nesse sentido é o entendimento do Tribunal de Justiça do Paraná:
INCIDENTE DE INCONSTITUCIONALIDADE. SUCESSÃO DA COMPANHEIRA. ART. 1.790, III, DO CÓDIGO CIVIL. INQUINADA AFRONTA AO ART. 226, § 3º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL, QUE CONFERE TRATAMENTO PARITÁRIO AO INSTITUTO DA UNIÃO ESTÁVEL EM RELAÇÃO AO CASAMENTO. NECESSIDADE DE MANIFESTAÇÃO DO COLENDO ÓRGÃO ESPECIAL. IMPOSSIBILIDADE DE LEI INFRACONSTITUCIONAL DISCIPLINAR DE FORMA DIVERSA O DIREITO SUCESSÓRIO DO CÔNJUGE E DO COMPANHEIRO. OBSERVÂNCIA DO PRINCÍPIO DA IGUALDADE. ELEVAÇÃO DA UNIÃO ESTÁVEL AO STATUS DE ENTIDADE FAMILIAR. INCONSTITUCIONALIDADE RECONHECIDA. CONHECIMENTO DO
INCIDENTE, DECLARADO PROCEDENTE. 1. Inconstitucionalidade do art. 1.790, III, do Código Civil por afronta ao princípio da igualdade, já que o art. 226, § 3º, da Constituição Federal conferiu tratamento similar aos institutos da união estável e do casamento, ambos abrangidos pelo conceito de entidade familiar e ensejadores de proteção estatal. 2. A distinção relativa aos direitos sucessórios dos companheiros viola frontalmente o princípio da igualdade material, uma vez que confere tratamento desigual àqueles que, casados ou não, mantiveram relação de afeto e companheirismo durante certo período de tempo, tendo contribuído diretamente para o desenvolvimento econômico da entidade familiar." (Acesso em 07 de jun. 2016)
Entende Carlos Roberto Gonçalves que essa disciplina de direitos sucessórios
[...] é um evidente retrocesso no sistema protetivo da união estável, pois no regime da Lei n. 8.971/94 o companheiro recebia toda a herança na falta de descendentes ou ascendentes. No sistema do aludido art. 1.790, todavia, só receberá a totalidade dos bens adquiridos onerosamente na vigência da união estável se não houver nenhum parente, descendente, ascendente ou colateral ate o quarto grau. Se houver, concorrerá com eles, recebendo apenas um terço da herança se concorrer com ascendentes e colaterais. Gonçalves apud Francisco José Cahali ( 2014, p. 283).
Ademais, não deixa de render maiores críticas o disposto no inciso III, do art. 1.790, o qual impõe a concorrência do companheiro “com outros parentes sucessíveis”, tendo “direito a 1/3 (um terço) da herança”.
Salienta-se que, inexiste um argumento plausível para essa admissão da concorrência de companheiro com colaterais, que, na maioria das vezes, não tiveram sequer contato com o de cujus em vida. Inclusive, não é difícil imaginar que essa poderia não ser a vontade do morto, participar parte de sua herança a um primo distante, em detrimento do direito do convivente, o qual passou os últimos dias de sua vida ao seu lado.
O próprio concurso com parentes colaterais, ademais, nem deveria existir. Seria preferível que se concedesse em favor do convivente a prevalência sobre os colaterais, para os fins da sucessão, fincando estes excluídos da sucessão.
3.3.3. Totalidade da herança na falta de parentes sucessíveis
Finalmente, conforme o artigo 1.790, IV não havendo nem descendentes nem ascendentes nem colaterais, o companheiro herda todo o acervo hereditário, e não só o adquirido onerosamente durante a união estável. Esta a interpretação mais correta, segundo a visão de César Fiuza, da qual também perfilhamos.
Explica ainda o referido autor (FIUZA, 2003, p. 872), que “na hipótese de se admitir outra interpretação, o companheiro terá direito a todos os bens adquiridos onerosamente, durante a união estável, incorporando-se os demais bens ao patrimônio do Município em que se acharem.”
Nesse caso Christiano Cassettari (2011, p. 583), entende que a regra é injusta, pois se há concorrência do companheiro com os ascendentes do de cujus, ele irá receber somente um terço dos bens adquiridos onerosamente na constância da união estável, enquanto os outros dois terços restantes, juntamente com os 100% dos bens adquiridos na antes da união estável e na forma gratuita, irão para os ascendentes. Sendo o mesmo raciocínio em relação ao colateral.
Assim, por tal motivo é que há vários julgados reconhecendo a inconstitucionalidade deste dispositivo, pois este coloca o companheiro em concorrência com o colateral, colocando-o em desigualdade com o cônjuge, por afrontar o principio da igualdade entre o cônjuge e o companheiro, já que este não concorre com o colateral, e sim o exclui da sucessão se houver somente ambos.
CONCLUSÃO
Diante o exposto, nota-se que apesar de reconhecida a união estável como entidade familiar, ainda existem diferenças entre companheiros e cônjuges, por considerar que o companheiro ainda é tratado com inferioridade e desrespeito, principalmente no que se refere a matéria de sucessões.
Outrossim, compreende-se que o companheiro não deveria ser submetido a concorrência com parentes colaterais do falecido. Ressaltando-se que, talvez esta não fosse à vontade do cônjuge falecido, ter como concorrência de seus bens, primos distantes que, nem sequer teve contato com o de cujus, em vida. Ou seja, esta concorrência com colaterais nem deveria existir, visto que, seria preferível conceder tal direito de forma ampla ao convivente, o qual passou os últimos anos ao seu lado.
Nota-se que o legislador condicionou a concorrência do cônjuge com os companheiros, no inciso III do art. 1.790 do Código Civil, acerca dos bens adquiridos onerosamente na constância da união estável, em que os parentes colaterais recebem 2/3 da herança e o companheiro apenas 1/3. Tornando difícil o entendimento quanto às diversas interpretações contraditórias.
Todavia, o fato de a lei dever facilitar a união estável em casamento significa, para alguns, que o casamento é instituto hierarquicamente superior à união estável e, portanto, qualquer vantagem que a lei ordinária atribua à união estável, que supere as vantagens do casamento, seria considerada inconstitucional.
Isto posto, ressalta-se que o artigo 1.790 do Código Civil de 2002, afronta a Carta Magna do Estado Democrático de Direito, e também a união estável como entidade familiar, conforme artigo 226, §3º e demais normas que regulam este instituto, sugerindo-se a inserção do companheiro em todos os dispositivos legais referentes ao cônjuge.
Deste modo, defende-se a inconstitucionalidade do artigo 1790 do Código Civil brasileiro, em virtude de este proporcionar tratamento desigual aos conviventes, imposta por este artigo.
Destarte, nota-se que a partilha de bens, no caso do falecimento de um dos companheiros, deve preservar o direito do companheiro sobrevivente, observando o regime de comunhão parcial de bens, cabendo o direito a meação acerca do patrimônio adquirido na constância da união, sendo a outra metade dividida entre os descendentes e ou ascendentes, em não havendo estes, caberá ao sobrevivente à totalidade dos bens.
Por tudo exposto, conclui-se de forma clara e objetiva, que após a análise exaustiva da legislação brasileira acerca da sucessão dos cônjuges e dos companheiros, verificaram-se grandes evoluções, mas, também, grandes desigualdades que ferem a norma máxima deste país, a Magna Carta de 1988. Assim, mostra-se claro os deslizes cometidos pelo atual Código Civil, requisitando- se assim, sua reforma, com a alteração dos dispositivos que se referem à ordem da vocação hereditária, com o intuito de adequar o direito sucessório à realidade que se apresenta na atual composição familiar, visando o objetivo do direito de forma ampla, que somente alcançará seus fins se for capaz de evoluir juntamente com a sociedade.
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Data da conclusão/última revisão: 10/8/2018
Marêssa Cordeiro Domiciano e Rodrigo da Paixão Pacheco
Rodrigo da Paixão Pacheco: Advogado. Membro das Comissões de Direito do Consumidor, Família e Sucessões e Advocacia Jovem da OAB seccional Goiás. Mestrando em Serviço Social pela PUC Goiás. Graduado em Direito e Administração pela PUC Goiás. Pós-graduando em Direito Civil,Direito Processual Civil ,Direito Penal e Direito Processual Penal pela UCAM/RJ;
Marêssa Cordeiro Domiciano: Graduada em Direito pela PUC-GO;
Código da publicação: 4167
Como citar o texto:
DOMICIANO,Marêssa Cordeiro; PACHECO, Rodrigo da Paixão.A garantia do direito à integralidade/igualdade da herança aos companheiros supérstites. Boletim Jurídico, Uberaba/MG, a. 30, nº 1563. Disponível em https://www.boletimjuridico.com.br/artigos/direito-civil-familia-e-sucessoes/4167/a-garantia-direito-integralidadeigualdade-heranca-aos-companheiros-superstites. Acesso em 25 set. 2018.
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