A eficácia da aplicação da justiça restaurativa na medida socioeducativa

Introdução

Com o advento do Estatuto da Criança e do Adolescente em 1990 e posteriormente do Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo em 2012, houve uma maior preocupação com a garantia de direitos à este segmento da sociedade, tendo como base o princípio do melhor interesse da criança e do adolescente. O Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo, desde 2012 regula a execução de medidas socioeducativas aplicadas ao adolescente infrator, e através dele houve a inserção de medidas restaurativas na ação socioeducativa, considerando ser o adolescente pessoa em desenvolvimento, o qual necessita de maior atenção devido a sua situação de vulnerabilidade social.

A justiça restaurativa, demonstrada através das medidas restaurativas, não busca tão somente a punição do adolescente, mas que ele seja conscientizado do seu ato e das consequências que gerou tanto para a vítima, como para a coletividade. Neste trabalho busca-se compreender a aplicação de tais medidas restaurativas na reeducação de adolescentes infratores.

 

Justificativa

Com este trabalho, apresenta-se as vantagens e a viabilidade da aplicação da justiça restaurativa aos adolescentes em conflito com a lei, de forma que a possibilitar à sociedade maior consciência de que a aplicação de meios de solução de conflitos que, por hora, possam parecer brandos e impunes, talvez sejam a maneira mais eficaz de socioeducar e também combater a reincidência, desconstruindo a cultura social de que a punição em forma de restrição de liberdade é a única solução para o infrator e demonstrando a possibilidade de inserção da justiça restaurativa ao processo penal brasileiro.

 

Objetivo geral

Identificar as vantagens e a viabilidade da aplicação da justiça restaurativa às medidas socioeducativas.

 

Metodologia

Para este resumo foi adotado a abordagem qualitativa, com fins comparativos, onde os resultados e os meio empregados para a aplicação da justiça restaurativa às medidas socioeducativas foram estudados. Quanto ao método utilizado, foi de natureza básica, através de materiais bibliográficos, documentos jurídicos e jurisprudências, correlatas com o tema.

 

Resultados e discussão

Desde o advento do Estatuto da Criança e do Adolescente em 1990, os atos infracionais praticados pelos adolescentes passaram a ser apurados em um procedimento próprio, inserido nos artigos 171 a 190 deste Estatuto, denominado processo de apuração de ato infracional. Após toda a apuração do ato, se restar comprovado que o adolescente foi realmente o autor do ato infracional, aplica-se a ele uma das medidas socioeducativas previstas no artigo 112 do Estatuto da Criança e do Adolescente.

Tais medidas que vão desde uma mera advertência até a privação total de liberdade do adolescente por meio da internação, tem um prazo máximo de 03 (três) anos. Comumente a medida que mais é aplicada na prática é a prestação de serviços à comunidade, a qual, ainda que de forma indireta, priva o adolescente da liberdade nos momentos em que ele deve estar presente no local de cumprimento da medida. Com isso, resta evidenciado os nítidos sinais da justiça retributiva aplicada neste procedimento, sendo que o fim buscado é apenas a punição, não havendo uma preocupação com a real mudança daquele adolescente.

Outrossim, de acordo com último Levantamento Anual do Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (2018, pg. 15), que considerou os dados levantados no ano 2016 publicados em 2018 pela Secretaria Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente do Ministério dos Direitos Humanos (SNDCA/MDH), apurou-se que há cerca de 26.450 adolescentes em atendimento socioeducativo em todo o país. A possibilidade de aplicação da justiça restaurativa ao processo de apuração de ato infracional deve ser realizada porque mostra-se como uma alternativa para a diminuição dos índices de reincidência na prática dos atos infracionais, os quais como visto acima são alarmantes, evidenciando a fragilidade do sistema que atualmente vem sendo seguido.

A sugestão de aplicação da justiça restaurativa para os adolescentes, se justifica por estes serem indivíduos em condição peculiar de desenvolvimento, sendo assim, como ainda estão em processo de identificação e formação da sua personalidade, as chances da educação social ser mais efetiva é incontavelmente maior se comparado a indivíduos que já atingiram a maioridade civil e possuem a personalidade completamente formada. A justiça restaurativa tem por foco a reparação do dano, com o envolvimento daqueles que foram lesionados, sendo eles a vítima e a comunidade.

Para Zehr (2008, pg. 9), ao conceituar o crime na justiça restaurativa, o crime é apresentado como “[...] uma violação de pessoas e relacionamentos. Ele cria a obrigação de corrigir os erros. A justiça envolve a vítima, o ofensor e a comunidade na busca de soluções que promovam reparação, reconciliação e segurança”. Todavia, não se busca deixar o adolescente infrator impune, sendo extremamente necessário que ele seja responsabilizado por seus atos, até mesmo para a efetividade do processo de restauração.

Durante a adolescência os indivíduos ainda não possuem uma personalidade completamente formada, sendo que se identificam de acordo com o meio social em que vivem. Exatamente pela condição de vulnerabilidade social é que tais indivíduos tornam-se suscetíveis a prática de atos infracionais, e por essa mesma condição há uma presunção de que a aplicação da justiça restaurativa para esses indivíduos será mais eficaz. Com a justiça restaurativa buscar-se-á mostrar ao adolescente que ele tem um papel social e conscientizá-lo que não é praticando atos infracionais que ele alcançará sua independência.

No estado de São Paulo, especificamente no município de São Caetano do Sul, já se aplica a justiça restaurativa no âmbito do Juizado da Infância e Juventude e, inclusive já é possível visualizar os resultados. Através de um estudo realizado quanto a aplicação desta forma de justiça em São Caetano do Sul e publicado em 2008 pela Coordenadoria da Infância e Juventude foram elencadas os resultados adquiridos com a implantação do projeto, quais sejam: a integração e articulação interinstitucional fundada em missão, valores e objetivos; mobilização e envolvimento comunitário; empoderamento dos envolvidos em situação de conflito, da comunidade em geral e da comunidade escolar, propiciando condições de aprendizagem autônoma na resolução de conflitos; alta porcentagem de acordos; alta porcentagem de acordos cumpridos; maior satisfação dos envolvidos; reincidência quase nula (2008, pg. 108).

Ressalta-se que a iniciativa de aplicação da justiça restaurativa naquela comarca se deu em 2005 e, após somente 03 (três anos) já foi possível identificar os resultados.

 

Conclusão

Podemos concluir que a justiça restaurativa é hoje a medida mais viável para a reeducação dos adolescentes infratores. É de conhecimento geral que a política de encarceramento aplicada no Brasil não funciona desde sempre, sendo conhecida popularmente como “a escola do crime”.

Indivíduos que cometeram crimes de menor potencial ofensivo, quando encarcerados, saem como grandes criminosos e, na maioria dos casos, filiados a alguma organização criminosa. Em contrapartida, a justiça restaurativa busca que a mudança ocorra através do próprio adolescente infrator, tendo um viés mais psicológico e restaurador do que punitivo, acredita-se que se a mudança partir do próprio indivíduo as chances dele voltar para o crime são infinitamente menores.

Do mesmo modo, na comarca de São Caetano do Sul/SP, esse modelo já foi aplicado e os resultados práticos já puderam ser visualizados na reincidência quase nula daqueles que participaram do projeto restaurativo. Ademais, como também visualizado em São Caetano do Sul, houve uma participação efetiva da comunidade, demonstrando a importância de conscientizar o adolescente de que ele faz parte de um conjunto social, para que suas bases de criação de personalidade sejam edificadas dentro dos limites sociais. Sendo assim, comprovada a efetividade prática da justiça restaurativa quando aplicada aos adolescentes infratores, prova-se também a viabilidade de sua aplicação, sugerindo que este modelo seja aplicado em todo o país para o combate da criminalidade infanto-juvenil.

 

Referências

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Data da conclusão/última revisão: 6/11/2019

 

 

 

Isabelly Borges Chiamulera e Teófilo Lourenço de Lima

Isabelly Borges Chiamulera: acadêmica do 8° período do curso de Direito no UniSL/Ji-Paraná;

Teófilo Lourenço de Lima: Professor orientador, especialista em Administração e Planejamento para Docentes, licenciado em Pedagogia.