Em um mundo em que é constante o avanço da internet, os criminosos digitais se veem em um ambiente livre para que possam planejar e executar atos ilícitos, abusando da ingenuidade ou da carência de conhecimentos de suas vítimas. A internet acaba por facilitar a propagação de diversas ilicitudes, como: perfis falsos e fake news sem que haja prévia permissão do autor da obra. O objetivo geral é trazido a fim de examinar e identificar quais são os tipos mais comuns de infrações virtuais e seu amplo efeito no meio digital, além do cotejo dos limites éticos, bem como a verificação das maneiras para o combate efetivo a esses delitos virtuais. Neste trabalho, a metodologia a ser seguida será a teórico-normativa. Foram desenvolvidos três capítulos, que tiveram como foco a explanação sobre o contexto histórico e suas indagações filosóficas; os princípios oriundos dos direitos fundamentais aplicáveis ao ciberespaço; e as infrações cibernéticas, bem como a explanação do Marco Civil da Internet, as ilicitudes no ambiente cibernético e, para arrematar, a compatibilização dos limites éticos com as condutas ilícitas. No decorrer da pesquisa, o maior obstáculo para que houvesse uma abordagem mais penetrada foi o método de pesquisa escolhido. Assim, faltaram bases empíricas para a comprovação de algumas facetas lançadas ao longo da pesquisa, já que todos os estudos giraram em torno da teoria. A sociedade de forma ampla carece de informações legais sobre as metodologias de aproveitamento da internet e de suas limitações. Por derradeiro, será verificado que o ordenamento jurídico deve se manifestar de forma proporcional à velocidade da evolução tecnológica.

INTRODUÇÃO

A internet é, em relação a muitos pontos de vista, um dos meios mais ricos e poderosos em termos de instrumentos de comunicação, pois proporciona consequências enormes para toda uma sociedade. Com o seu nascimento no final dos anos 50, frente ao seu rápido desenvolvimento, tendo como um fator positivo a facilidade de troca de informações e acessibilidade, também acarretou no surgimento de incontáveis preocupações e questões de cunho ético relacionadas ao uso dessa ferramenta.

Na atualidade, a internet pode ser utilizada com fins científicos, mas também pode abrir portas para atos infracionais. É bem por isso que este artigo tem como finalidade analisar a relação jurídica entre a visão ética de um mundo virtual, na qual a internet atua como uma eficiente ferramenta de pesquisa científica, e, também, por outro lado, por se tornar em diversas oportunidades uma espécie de portal pelo qual facilita atividades ilícitas.

Para melhor demonstrar este estudo, volta-se a princípios de questões relacionadas à origem da internet como ferramenta e opção viável de pesquisa. Em um mundo em que é constante o avanço da internet, os infratores digitais se veem em um ambiente mais ou menos livre para que possam planejar e executar atos ilícitos, abusando da ingenuidade ou da carência de conhecimentos de suas vítimas.

Ainda, verifica-se que a dificuldade aumenta quando se analisa que os transgressores só poderão ser punidos quando as autoridades conseguem comprovar que tal conduta foi de fato prejudicial para outrem. A internet, como há se apurado, facilita a propagação de diversas ilicitudes, quais sejam: perfis falsos, fake news, divulgação a terceiros de conteúdo, imagem ou som sem a permissão do autor da obra, de forma que agrida a honra e dignidade da vítima.

Neste sentido, os limites éticos acabam por ser ignorados, não havendo formas eficazes de evidenciar os princípios intrínsecos a cada usuário e até que ponto são permitidas as condutas que não venham a ferir o direito de outro navegador virtual. Com o acesso relativamente restrito e poucas experiências com o mundo digital, muitas pessoas se tornaram reféns de uma ferramenta que surgiu para facilitar e gerar “aproximação” através de uma interação social com o mundo.

Na maioria das vezes, para fins de benefícios próprios, visando vingança, extorsão e exploração de cidadãos, que por algum motivo ou desejo se expuseram de forma íntima, social ou voluntariamente, os criminosos acabam por se aproveitar de tal situação. Com efeito, este estudo indica ser de grande e significativa relevância, pois no meio social pouco se conhece ou se sabe o que pode caracterizar as transgressões virtuais, assim como as suas formas de ocorrência.

Como há de ser verificado no decorrer das explanações, o Brasil vem se tornando aos poucos cada vez mais proativo nesse campo. Com efeito, este artigo tem como objetivo geral examinar e identificar quais são os tipos mais comuns de infrações virtuais, além do cotejo dos limites éticos.

Como objetivos específicos, restam a investigação dos princípios predominantes aplicáveis ao tema em discussão; a averiguação acerca dos conceitos de ética e moral; a compreensão dos elementos caracterizadores do comportamento ético de potenciais violadores digitais. 

A compreensão irá se basear no tripé Ordenamento Jurídico/Doutrina/Fato Social. Ao final, espera-se encontrar, através da cognição retirada da dialética dos pontos de vistas analisados, o meio mais viável para garantir e conciliar a segurança jurídica dos usuários de boa-fé.

Cumprida a parte que define os objetivos, passa-se às hipóteses que servem de norte ou caminho predeterminado para o alcance da problemática, assim como de sua possível solução. A saber, essas hipóteses são duas: a primeira diz respeito à  expansão constante da internet, que traz consigo o aumento de transgressões na esfera virtual; já a segunda refere-se aos institutos de repreensão, ou seja, a averiguação do ciberespaço e se ele poderá enfim se tornar um ambiente próspero e seguro a todos seus navegadores.

Para tanto, há de se ressaltar quais são os paradigmas e métodos que serão seguidos para a confecção deste artigo. As regras de seguimento metodológicas são antes de tudo subsídios técnicos fundamentais e recomendações práticas para o manuseio de materiais de pesquisa.

Destarte, são instrumentos confeccionados pela ciência para guarnecer a forma necessária a fim de que a feitura seja reconhecidamente científica. Logo, a não constatação desses métodos acarretaria a desqualificação da obra, que se tornaria especificada como não científica. Assim, estar-se-ia diante de uma obra simplesmente opinativa.

As principais técnicas de inquirição científica são: a empírica e a teórica: a primeira diz respeito à observação, à amostragem, à entrevista, ao questionário, à experimentação, ao estudo de caso e à pesquisa-ação. Já a teórica compreende a histórica, a conceitual e a normativa.

Neste trabalho, a metodologia a ser seguida será a teórico-normativa, tanto na forma dedutiva como na forma indutiva. A dedução e indução são procedimentos racionais que nos levam do já conhecido ao ainda não conhecido, isto é, permitem que se adquira conhecimentos novos graças a conhecimentos já adquiridos.

Para melhor compreensão e organização, esta pesquisa será dividida em três capítulos, que abordarão os seguintes assuntos: o primeiro capítulo versará sobre um breve contexto histórico da internet, além de evidenciar algumas indagações filosóficas; já o segundo capítulo tratará acerca dos princípios oriundos dos direitos fundamentais aplicáveis ao ciberespaço; por fim, o terceiro capítulo ira relatar sobre as infrações cibernéticas, bem como a explanação do Marco Civil da Internet; e, para arrematar, sobre a compatibilização dos limites éticos com as condutas ilícitas.

 

1. CIRCUNSTÂNCIAS HISTÓRICAS E FILOSÓFICAS

1.1 Breve contexto histórico

A medida em que se passam os anos, novas tecnologias de esfera digital são introduzidas ao ambiente virtual, de tal forma que abrem margens para acessibilidade e obtenção de informações compartilhadas entre usuários e internautas que permeiam a rede de internet.

 Vale ressaltar que a comunicação obtida em meio a esse ciberespaço, vem facilitando de certo modo o acesso de usuários de má índole, agindo de forma ilícita a fim de obter qualquer tipo de vantagem ou algo que possam usar em benefício próprio, visando prejudicar outros navegadores.

Assim, temos então uma nova linguagem no ciberespaço, novos prismas para a edificação de relações interpessoais e, consequentemente, as mudanças de valores com suas ressignificações, uma vez que, partindo desse pressuposto, existem usuários de boa e aqueles considerados de má índole convivendo em um mesmo espaço.

No Brasil, a World Wide Web passou a ser operada de forma pública, a começar pelo ano de 1995, no momento em que a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) editou a Norma 004/19952, que define a internet como:

[...]nome genérico que designa o conjunto de redes, os meios de transmissão e comutação, roteadores, equipamentos e protocolos necessários à comunicação entre computadores, bem como o "software" e os dados contidos nestes computadores[...] 

A apresentação constante de mídias e até mesmo ideias compartilhadas, assim como sua rápida transmissão de um país para o outro, tem consigo consequências tanto negativas quanto positivas no desenvolvimento social, moral e psicológico de seus usuários e até mesmo para pessoas off-line de tal sistema, atingindo assim o funcionamento e estrutura social, na partilha de uma tradição e cultura de valores.  Assim, é inegável que o ciberespaço como consequência de recentes tecnologias, como a informática e os meios de comunicação, compõe uma nova diretriz organizacional (IANNI, 1994).  

 

1.2. Indagações filosóficas

No campo filosófico, cabe analisar as questões intrínsecas a cada indivíduo para consigo mesmo e suas ações diante de uma coletividade, principalmente em se tratando de comportamentos. Para tanto, necessário é o discurso dialético entre ética e moral.

Pelo fato de a filosofia basear seus preceitos essencialmente nas ideias advindas de profundas reflexões, o objetivo aqui é buscar compreender, essencialmente em bases filosóficas, o mundo ideológico em que o Direito Digital e seus usuários estão inseridos.

 

1.2.1 Preceitos morais

Embora alguns filósofos e estudiosos utilizem as palavras “ética” e “moral” com uma mesma significação, tais virtudes não possuem a mesma acepção. De acordo com entendimento de Maia (2014, p. 01):

Moral é uma palavra de origem latina, que vem de “moris”, que significa costumes. Moral é o conjunto de costumes, regras, crenças, normas ou valores de um indivíduo ou da sociedade em que ele vive. Estas normas ou regras servem como um guia, para que as pessoas saibam diferenciar o que é certo ou errado, o que é do bem ou é do mau, podendo assim estar sempre agindo da melhor maneira em respeito aos demais e a elas mesmas. 

Em linhas gerais, pode-se dizer que a moral é aquilo que as pessoas não fariam de jeito algum, mesmo que não houvesse ninguém as olhando ou mesmo que tais indivíduos fossem invisíveis. A moral é o certo a se fazer ou não fazer, de acordo com a concepção de cada pessoa. Ou seja, é um conjunto de princípios que cada um segue livremente em sua vida; aquilo que livremente decidem respeitar, pois livremente decidem assim. É uma questão de decisão própria. O ato de dialogar consigo mesmo para encontrar o melhor caminho é a melhor conduta é o núcleo da moral.

 

1.2.2 Preceitos éticos

Todo comportamento humano pode ser avaliado a partir de uma reflexão ética. A ética é uma preocupação que os indivíduos têm para aperfeiçoar a convivência do coletivo a que pertencem. Agora, mais uma vez extraindo os conhecimentos da pesquisadora Maia (2014, p. 1):

A palavra ética significa modo de ser, caráter, e vem do grego “ethos”. Ser ético é ser uma pessoa de acordo com os padrões, que segue o que é determinado por uma sociedade como correto, como justo, é fazer sempre o que será o melhor para todos, o que não irá gerar atritos, assumir seus erros, ser flexível, mantendo assim a harmonia e o bem-estar da sociedade em que se vive. 

Assim, o zelo pelo bem estar de todos implica em abrir mão da satisfação de alguns apetites, de algumas vantagens, de alguns prazeres que são particulares de cada um. Simplificando, a ética refere-se às regras de conduta que são preconizadas por uma determinada classe, cultura ou grupo particular; a moral diz respeito aos princípios ou hábitos que dizem respeito a uma conduta que é certa ou errada.

Por fim, uma pessoa seguindo estritamente princípios éticos pode não ter qualquer tipo de moral. Da mesma forma, pode-se violar princípios éticos dentro de um determinado sistema de regras a fim de manter a sua integridade moral. Aqui, é importante trazer o entendimento da historiadora de filosofia Chauí (1996, p. 337):

Para que haja conduta ética é preciso que exista o agente consciente, isto é, aquele que conhece a diferença entre o bem e mal, certo e errado, permitido e proibido, virtude e vício. A consciência moral não só conhece tais diferenças, mas também reconhece-se como capaz de julgar o valor dos atos e das condutas e de agir em conformidade com os valores morais, sendo por isso responsável por suas ações e seus sentimentos e pelas consequências que faz e sente. Consciência e responsabilidade são condições indispensáveis da vida ética. A consciência moral manifesta-se, antes de tudo, na capacidade para deliberar diante de alternativas possíveis, decidindo e escolhendo uma delas antes de lançar-se na ação. Tem a capacidade para avaliar e pesar as motivações pessoais, as exigências feitas pela situação, as consequências para si e para os outros, a conformidade entre meios e fins (empregar meios imorais para alcançar fins morais é impossível), a obrigação de respeitar o estabelecido ou de transgredi-lo. A vontade é esse poder deliberativo e decisório do agente moral. Para que exerça tal poder sobre o sujeito moral, a vontade deve ser livre, isto é, não pode estar submetida à vontade de um outro nem pode estar submetida aos instintos e às paixões, mas, ao contrário, deve ter poder sobre ele e elas. O campo ético é, assim, constituído pelas obrigações que formam o conteúdo das condutas morais, isto é, as virtudes. Estas são realizadas pelo sujeito moral, principal constituinte da existência ética. 

 

Este ponto reside uma das prováveis respostas para a problemática apresentada. Resta perceptível que usuários do ambiente virtual (ciberespaço) seguem as prescrições éticas, ou ao menos devem segui-las. Por outro lado, há os preceitos morais que, por vezes, não se ajustam aos padrões coletivos.

Assim, remanesce patente que a moral do indivíduo conjugada com os princípios interrelacionados – que serão vistos no próximo capítulo – deverá conduzi-lo a uma utilização genuína no mundo digital. Contudo, será verificada que há evidente complexidade em tais comportamentos, podendo ocasionar o cometimento de diversas condutas ilícitas quando os usuários se afastam de tais pressupostos.

 

2. PRINCÍPIOS APLICÁVEIS AO CIBERESPAÇO

Este capítulo possui como finalidade principal a exploração das peculiaridades de princípios que circundam os direitos fundamentais, com o fito de extrair informações e combiná-las com o capítulo posterior. Por ser um conjunto de elementos, advindos da própria convivência em sociedade, com o objetivo de perquirir a paz social, é valoroso averiguar alguns dos aspectos do Direito. 

A modernidade teve seu início num processo histórico estritamente vinculado ao Renascimento Cultural, à Reforma Protestante, às grandes navegações e descoberta da América. São processos históricos que contribuíram para o aniquilamento do sistema feudal e da visão de mundo medieval.

A ideia de modernidade está diretamente ligada à razão e tem como princípio fundamental a subjetividade. Esses ideais vieram a se consolidar com o advento do Iluminismo e da Revolução Francesa. A nova ordem, então, assume seus contornos peculiares:

Defesa da ciência e da razão contra os dogmas e postulados religiosos, crenças e superstições;

Individualismo, significando um homem atuante, que cria, autônomo, com liberdade para agir;

O formalismo jurídico, denotando um sistema jurídico acabado e completo, onde qualquer lacuna da lei seria suprida pelo sistema, recorrendo-se à analogia;

Apenas o legislativo se permite a criação do Direito, vedado absolutamente (ou quase) ao judiciário. (MAIA, 2008, p.19)

Com certa clareza, percebe-se que tais preceitos ainda continuam em constante alteração; o direito é ciência humana viva, mas que geralmente está um passo atrás das situações fáticas e cotidianas. Karl Marx já previa as facetas do pós-modernismo quando citou o seguinte:

O constante revolucionar da produção, a ininterrupta perturbação de todas as relações sociais, a interminável incerteza e agitação distinguem a época burguesa de todas as épocas anteriores, todas as relações fixas, imobilizadas, com a sua aura de idéias e opiniões veneráveis, são descartadas; todas as novas relações, recém formadas, se tornam obsoletas antes que se ossifiquem. Tudo que é sólido desmancha no ar, tudo que é sagrado é profanado, e os homens são finalmente forçados a enfrentar com sentidos mais sóbrios suas reais condições de vida e suas relações com outros homens. (MARX apud BERMAN, 1986, p. 93).

De acordo com as concepções extraídas das ideias de Karl Marx, é possível inferir que o direito, na idade contemporânea, mostra-se de forma diferente se comparado em relação aos outros períodos históricos. Com a decorrência da sociedade estruturada em um modo de produção capitalista, todas (ou quase todas) as relações políticas partem de uma manifestação jurídica.

Logo, com o intuito de elucidar quais preceitos deverão ser levados em conta à resolução do conjunto de questões que foi proposto, parte-se para a averiguação dos Princípios Fundamentais correlatos ao Direito Digital.

 

2.1 Princípios oriundos dos direitos fundamentais

Uma vez que os Direitos Fundamentais estão consubstanciados na Constituição Federal de 1988, é de bom tom destacar a seguinte ponderação acerca do Estado Constitucional, realizada pelo Professor Canotilho (1995, p. 43):

[...] o esquema racional da estadualidade encontra expressão jurídico–política adequada num sistema político normativamente conformado por uma constituição e democraticamente legitimado. Por outras palavras: o Estado concebe-se hoje como Estado Constitucional Democrático, porque ele é conformado por uma Lei fundamental escrita (constituição juridicamente constituída das estruturas básicas da justiça) e pressupõe um modelo de legitimação tendencialmente reconduzível à legitimação democrática. 

São, portanto, prerrogativas que os indivíduos têm diante de si mesmos, assim como diante da sociedade. O professor Moraes (2009, p.31) esclarece o seguinte:

A Constituição Federal de 1988 trouxe em seu Título II os direitos e garantias fundamentais, subdividindo-os em cinco capítulos: direitos individuais e coletivos; direitos sociais; nacionalidade; direitos políticos e partidos políticos. Assim, a classificação adotada pelo legislador constituinte estabeleceu cinco espécies ao gênero direitos e garantias fundamentais: direitos e garantias individuais e coletivos; direitos sociais; direitos de nacionalidade; direitos políticos; e direitos relacionados à existência, organização e participação em partidos políticos. Modernamente, a doutrina apresenta-nos a classificação de direitos fundamentais de primeira, segunda e terceira gerações, baseando-se na ordem histórica cronológica em que passaram a ser constitucionalmente reconhecidos. 

Ainda, a despeito do exposto, alguns doutrinadores criaram a expressão “dimensão” para designar a valorização de certo direito em determinado momento da história, uma vez que um não contrapõe o outro, mas se interagem em perspectivas diferentes. Assim, há de se considerar as palavras do grande jurista Hesse (1988, p. 235):

Como direitos do homem e do cidadão, os direitos fundamentais são, uma vez, direitos de defesa contra os poderes estatais. Eles tornam possível ao particular defender-se contra prejuízos não autorizados em seu status jurídico-constitucional pelos poderes estatais no caminho do direito. Em uma ordem liberal constitucional são necessários tais direitos de defesa, porque também a democracia é domínio de pessoas sobre pessoas, que está sujeito às tentações do abuso de poder, e porque poderes estatais, também no estado de direito, podem fazer injustiça. Asseguramento eficaz da liberdade e igualdade do particular torna, por conseguinte, mais além da configuração das ordens objetivas da democracia e do estado de direito, necessária a garantia de direitos subjetivos à liberdade e igualdade. 

 

No excerto acima, Hesse deixa claro que, pelo fato de a democracia ser caracterizada pelo domínio de pessoas sobre pessoas, poderá haver injustiças. Sendo assim, este artigo optou por dar ênfase aos princípios fundamentais de terceira geração, por serem eles justamente aqueles que asseguram de maneira mais incisiva o direito à comunicação em nível global.

 

2.1.1 Princípios fundamentais

A definição de um princípio jurídico é deveras complexa, sendo que os princípios, por vezes, são considerados normas legais e, por vezes, normas jurídicas gerais. Qualquer tentativa de definir a noção de um princípio legal envolve uma série de análises e questões a serem consideradas antes de chegar a qualquer definição.

No entanto, a maneira mais fácil de definir um princípio jurídico é entender primeiro seu significado linguístico da palavra. Neste caso, o significado da palavra como um substantivo seria, de acordo com o Dicionário Larousse, “um substantivo derivado do latim principium que quer dizer início, um momento inicial, um conceito fundamental de uma doutrina ou lei”.

A seguir, serão abordados alguns direitos revertidos de cargas principiológicas, uma vez que não se pode considerá-los como simples regras que podem ser resolvidas na base do tudo ou nada, mas, de maneira diferente, pois dependem de uma enorme incumbência e responsabilidade por parte dos julgadores para qualificá-los.

Partindo dessa premissa, serão investigados o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana, o Princípio da garantia da liberdade de expressão, comunicação e manifestação de pensamento, Princípio da proteção da privacidade, Princípio da proteção dos dados pessoais.

 

2.2.1 Princípio da dignidade da pessoa humana

A análise do Princípio da Dignidade da Pessoa Humana e como ele se projeta na sociedade brasileira é de suma importância para a compreensão de sua amplitude. Essa norma consta do artigo primeiro da Constituição Federal de 1988. Mais uma vez, servindo-se dos dizeres de Moraes (2009, p. 21-22), é possível compreender que:

A dignidade da pessoa humana: concede unidade aos direitos e garantias fundamentais, sendo inerente às personalidades humanas. Esse fundamento afasta a ideia de predomínio das concepções transpessoalistas de Estado e Nação, em detrimento da liberdade individual. A dignidade é um valor espiritual e moral inerente à pessoa, que se manifesta singularmente na autodeterminação consciente e responsável da própria vida e que traz consigo a pretensão ao respeito por parte das demais pessoas, constituindo-se um mínimo invulnerável que todo estatuto jurídico deve assegurar, de modo que, somente excepcionalmente, possam ser feitas limitações ao exercício dos direitos fundamentais, mas sempre sem menosprezar a necessária estima que merecem todas as pessoas enquanto seres humanos. 

Reconhecer tal princípio significa dizer que a pessoa humana tem valor superior ao objeto, tem valor central no sistema de direitos. Com efeito, por ser fonte de múltiplas potencialidades, o humano não pode ser equiparado a uma coisa. Os usuários de má índole representam perigo real ao bom e pleno dinamismo dos direitos fundamentais, caracterizando assim uma atemorização frente ao Princípio da Dignidade da Pessoa Humana em seu sentido global.

 

2.2.2 Princípio da garantia da liberdade de expressão, comunicação e manifestação de pensamento

A liberdade de expressão pode também ser interpretada e considerada como um conjunto de direitos que estão diretamente relacionados à liberdade de comunicação. Tendo em vista que são diversas as formas de expressão humana, o livre direito de se expressar abrange divergentes meios como, nas palavras do jurisconsulto José Luiz Quadros de Magalhães, as “liberdades fundamentais que devem ser asseguradas conjuntamente para se garantir a liberdade de expressão no seu sentido total” (MAGALHÃES, 2008, p. 74). Tal agrupamento de direitos aponta à acolhimento daqueles que exibem e recebem informações, críticas e opiniões.

Pelo exposto, verifica-se que o presente princípio diz respeito à liberdade de expressão, comunicação e manifestação de pensamento no âmbito do direito digital, uma vez que o referido postulado torna-se essencial para uma livre navegação, exploração, busca por acessibilidade, comunicação, ampliação de conhecimentos, entre outros, a fim de tornar o ambiente uma ferramenta de auxílio para o autodesenvolvimento.

 

2.2.3 Princípio da proteção da privacidade

Tem sido intitulado por algum dos autores brasileiros como direito à intimidade, bem como o direito ao resguardo, à decência, ao anonimato, à vida ou à esfera de natureza privada ou íntima. O conceito do ilustre José Serpa, equiparando a privacidade à intimidade lato sensu, ou vida privada, parece ser o mais completo:

[...] é finalmente um modo específico de vivência pessoal, isolada, numa esfera reservada, consoante escolha espontânea do interessado, primacialmente dentro do grupo familiar efetivo, ou com maior insulamento, mas sempre sem uma notória forma de participação de terceiros, seja pelo resguardo contra a ingerência ou molestamento malévolo alheio, seja pela utilização da faculdade que se lhe é atribuída para razoável exclusão do conhecimento público, de dados, ações, idéias e emoções que lhe são peculiares. (SERPA, 1987. p. 55)

 

O exponencial crescimento tecnológico da esfera virtual tem impressionado toda a composição do direito à privacidade e mostrado como os sistemas de proteção à privacidade são instáveis. O referido poder jurídico concedido à pessoa consiste, em tese, em opor-se à divulgação de sua vida privada e a uma averiguação desta, ou seja, é um direito de reprimir a influência ou o conhecimento alheio.

 

2.2.4 Princípio da proteção dos dados pessoais.

O princípio de proteção de dados pessoais faz menção a uma ideologia própria da informática e corresponde a lógica da busca por arquétipos jurídicos mais ricos e íntegros. Não o suficiente essa mudança de perfil com através do tempo, é válido associar materialmente seus objetivos e vertentes de atuação principais por meio de alguns princípios comuns.

No ordenamento brasileiro, a averiguação da proteção de dados como um direito independente e primordial não deriva de uma dicção explícita e literal, mas, sim, da compreensão dos riscos que o método mecanizado traz para proteção da personalidade.

Conforme supracitado, pode-se revelar uma referência ao direito primordial da proteção de dados pessoais na Declaração de Santa Cruz de La Sierra, final documento da XIII Cumbre Ibero-Americana, estabelecida pelo Governo Brasileiro em 15 de novembro de 2003. Da referida declaração lê-se no item 45:

Estamos também conscientes de que a proteção de dados pessoais é um direito fundamental das pessoas e destacamos a importância das iniciativas reguladoras ibero-americanas para proteger a privacidade dos cidadãos, contidas na Declaração de Antigua, pela qual se cria a Rede Ibero-Americana de Proteção de Dados, aberta a todos os países da nossa Comunidade.

O presente princípio aqui tratado versa sobre a proteção de dados dos usuários que dispõem de suas informações no ambiente virtual. Vale ressaltar que tal medida visa não só à proteção do usuário especificamente, mas de todos aqueles que acessam ou estão imersos neste mesmo ambiente de constante troca de informações e dados.

Pelo que foi exposto neste capítulo, verifica-se que a harmonização dos princípios aqui relatados bem como sua conjugação com as novas tecnologias virtuais tende a demonstrar uma melhor garantia aos direitos dos usuários, que, eventualmente, poderão ter suas informações utilizadas de maneira indevida por outrem. E bem por isso que, o próximo capítulo irá dispor sobre as normas que foram criadas com base em tais postulados, a fim de garantir uma navegação neutra e segura.

 

3. INFRAÇÕES CIBERNÉTICAS

Possui como principal norte o exame de como se sucedem as infrações cometidas no ambiente virtual, bem como a compatibilização dos limites éticos com as condutas ilícitas. Ademais, para fins de melhor entendimento, serão feitas as conjugações dos capítulos anteriores com o presente, com o fito de se aproximar ao objetivo principal proposto. Para tanto, é de bom alvitre, a priori, analisar o Marco Civil da Internet, que advém da Lei 12.965, de 23 abril de 2014, ou seja, uma norma deveras recente.

Assim, o dilema nestes momentos consiste em verificar se a Lei 12.965/2014, a bem da verdade, chega a dificultar ou, de alguma forma, a inibir os atos virtuais transgressores. De acordo com o professor Túlio Lima Vianna, de forma subjetiva, os sujeitos que se aproximam da ilicitude e/ou aqueles que as cometem no ambiente virtual, podem ser designados como:

1- CURIOSOS – agem por curiosidade e para aprender novas técnicas. Não causam danos materiais à vítima. Lêem os dados armazenados, mas não modificam nem apagam nada. Muitos seguem códigos de ética próprios ou de um grupo ao qual são filiados.

2- PICHADORES DIGITAIS – agem principalmente com o objetivo de serem reconhecidos. Desejam tornar-se famosos no universo cyberpunk e para tanto alteram páginas da Internet, num comportamento muito semelhante aos pichadores de muro, deixando sempre assinado seus pseudônimos. Alguns deixam mensagens de conteúdo político, o que não deve ser confundido com o ciberterrorismo.

3- REVANCHISTA – funcionário ou ex-funcionário de uma empresa que decide sabotá-la com objetivo claro de vingança. Geralmente trabalharam no setor de informática da empresa, o que facilita enormemente a sua ação, já que estão bem informados das fragilidades do sistema.

4-VÂNDALOS – agem pelo simples prazer de causar danos à vítima. Este dano pode consistir na simples queda do servidor (deixando a máquina momentaneamente desconectada da Internet) ou até mesmo a destruição total dos dados armazenados.

5- ESPIÕES – agem para adquirirem informações confidenciais armazenadas no computador da vítima. Os dados podem ter conteúdo comercial (uma fórmula de um produto químico), político (e mails entre consulados) ou militar (programas militares).

6- CIBERTERRORISTAS – são terroristas digitais. Suas motivações são em geral políticas e suas armas são muitas, desde o furto de informações confidenciais até a queda do sistema telefônico local ou outras ações do gênero

7- LADRÕES – têm objetivos financeiros claros e em regra atacam bancos com a finalidade de desviar dinheiro para suas contas.

8- ESTELIONATÁRIOS – também com objetivos financeiros; em geral, procuram adquirir números de cartões de créditos armazenados em grandes sites comerciais. (VIANNA, 2001, p. 64/65)

 

Além da caracterização dos diversos tipos de sujeitos que podem cometer as infrações virtuais, é de bom tom a persecução do verdadeiro sentido de tais ilicitudes. Com efeito, pode-se verificar que:

Para Higor Vinicius Nogueira Jorge (2012) e Emerson Wendt (2012), existem as ações prejudiciais atípicas e os crimes cibernéticos. As ações prejudiciais atípicas, são aquelas condutas que causam prejuízo ou transtorno para vítima através da rede mundial de computadores, mas não são tipificados em lei. Por sua vez os crimes cibernéticos se dividem em “crimes cibernéticos abertos” e “crimes exclusivamente cibernéticos”. Os “crimes exclusivamente cibernéticos” são aqueles que necessariamente precisam do meio da informática para cometer tal crime (como é o caso do crime de invasão de dispositivo informático, artigos 154-A e 154-B do código penal, introduzido pela Lei 12.735/2012, conhecido como Lei Carolina Dieckmann). Portanto os crimes cibernéticos abertos são aqueles que podem ou não ser praticados pelo meio informático, como é o caso de estudo os crimes de violação de direito do autor, pode ser praticado tanto no ambiente virtual como no analógico. (Apud. Tateoki, Victor Augusto 2016).

 

Aqui, para este trabalho, muito mais importam as infrações exclusivamente cibernéticos, já que aquelas que podem ser realizadas pelos meios analógicos fogem às hipóteses apresentadas pelo presente artigo. É com base nesse pensamento que se buscará a realização de um exame pormenorizado de determinados conteúdos da norma que institui o Marco Civil da internet no Brasil.

 

3.1 Lei do marco civil da internet

A já citada Lei do Marco Civil da Internet adveio com a finalidade de regulamentar o uso da internet no Brasil. Para tanto, deixou consignado em seu artigo 2º que:

A disciplina do uso da internet no Brasil tem como fundamento o respeito à liberdade de expressão, bem como:

I - O reconhecimento da escala mundial da rede;

II - Os direitos humanos, o desenvolvimento da personalidade e o exercício da cidadania em meios digitais;

III - A pluralidade e a diversidade;

IV - A abertura e a colaboração;

V - A livre iniciativa, a livre concorrência e a defesa do consumidor e.

VI - A finalidade social da rede.

 

Assim, para além dos fundamentos supracitados, também foram discorridos acerca de certos princípios que se encontram nessa norma, como é o caso de alguns dos princípios relatados no capítulo anterior, sendo eles o Princípio da garantia da liberdade de expressão, comunicação e manifestação de pensamento, o Princípio da proteção da privacidade e, por fim, o Princípio da proteção dos dados pessoais.

O que se verifica é que o Marco Civil da Internet veio para estreitar os laços entre o Direito e a Tecnologia de comunicação, ou seja, aqueles que são voltados para o ambiente virtual. Segundo os juristas Jesus e Milagre (2016, p. 01):

O marco Civil da Internet é considerado a “Constituição da Internet”, garantindo direitos e deveres a todos os autores da Internet brasileira [...]. Fruto de um projeto nascido em 29 de outubro de 2009, [...] o Marco Civil foi uma construção colaborativa, disponível para consulta pública entre novembro de 2009 e junho de 2010, tendo recebido mais de duas mil contribuições.

Com efeito, em razão das peculiaridades surgidas na internet, manifesta-se também o Direito Digital para tratar especificamente das relações nesse ambiente virtual. Para tanto, surgiu o instituto da Neutralidade de Rede, de modo que é deveras importante para garantir os melhores meios de comunicação ao seu navegador, como, por exemplo, ligações internacionais, utilizando-se o usuário de maneiras mais baratas do que aquelas empregadas pelos meios convencionais.

É nesse ponto que a problemática se mostra a lume, já que as facilidades de comunicações também podem vir com a celeuma de interferências de outros usuários, que estão mal intencionados. Assim, o uso constante de e-mails, sites e redes sociais tem gerado uma superexposição de seus utilizadores.

É bem por isso que a discussão acerca dos perigos que circundam a segurança do acesso à internet sujeita-se a uma robusta contribuição entre os diferentes integrantes, como os próprios usuários e das entidades estatais. Seguindo o mesmo entendimento, o professor jurisconsulto Souza (2015, p. 398-399) esclarece:

O desenho do regime de responsabilidade civil por ato de terceiros no Marco Civil da Internet visa a assegurar que a liberdade de expressão não sofra restrições indevidas, sendo a mesma alçada a parâmetro de interpretação teológica de todo o sistema de responsabilização previsto na Lei nº 12.965/14.

Vale ressaltar que, como referido acima, a nova norma foi editada para salvaguardar e preservar o fluxo de informações privadas que trafegam na internet. Para tanto, necessária se faz à verificação de como tem se dado as infrações virtuais dentro do ciberespaço brasileiro.

 

3.2 Ilicitudes no âmbito digital

Neste ponto em específico, esta obra busca abordar, de maneira não exauriente, as infrações virtuais mais comuns realizadas pelos usuários de má índole. A grande quantidade de ocorrência de tais infrações se deve à mobilidade dos dados nos sistemas digitais. Por esse motivo, a necessidade de proteção dos dados deve se tornar internacionalizada, com a cooperação e ajudas mútuas entre governos, estados e sociedades.

Muito embora haja à nível internacional uma enorme preocupação com a proteção dos dados que trafegam no meio cibernético, a verdade é que a constante alteração tecnológica, as constantes mudanças de paradigma no ambiente virtual e a profissionalização de diversos usuários com conhecimento em informática, dentre eles alguns de má índole, chega-se à provável conclusão de que as infrações cometidas estão (quase) sempre um passo à frente das devidas punições.

Embora esta obra trate sobre as “infrações”, é certo que o conceito de crime está ali inserido, sendo que aquele termo é mais amplo que este. Nesta toada, convém o relato dos jurisconsultos Jesus e Milagre (2016, p. 01):

[...]a progressiva mutação tecnológica dificulta o combate a esses crimes, que estão em constante alinhamento com as novas tecnologias. Assim, com o uso incontido e indiscriminado da internet, alguns indivíduos com conhecimento em informática passaram a se aprimorar e utilizar esses conhecimentos roubar informações criptografadas, como já havia sendo feito há muito tempo, para obter proveito econômico ou ainda, por mera diversão. 

 

Como já bastante relatado alhures, a Lei que criou o Marco Civil da chegou a estabelecer penalidades para aqueles que não observam suas normas, contudo, não dispõe sobre as infrações virtuais propriamente ditas. Com efeito, pode-se anunciar que o Brasil, embora tenha evoluído muito nos últimos anos no que diz respeito a esse âmbito, ainda se encontra desprovido de normas pertinentes, pois, nesse aspecto, a legislação brasileira não acompanha as necessidades sociais.

Tem-se, portanto, que as principais infrações cibernéticas (inclusive os crimes virtuais) são: o racismo, a pornografia infantil, a apologia e incitação a crimes contra à vida, a xenofobia, o neonazismo, sem contar a apropriação indevida de dados bancários, financeiros, etc. A catedrática Ivette Senise Ferreira entende que tais infrações cibernéticas podem ser consideradas como:

Atos dirigidos contra um sistema de informática, tendo como subespécies atos contra o computador e atos contra os dados ou programas de computador. Atos cometidos por intermédio de um sistema de informática e dentro deles incluídos infrações contra o patrimônio; as infrações contra a liberdade individual e as infrações contra a propriedade imaterial. (FERREIRA, 2005, p.261)

 

Conclui-se, consequentemente, que os infratores cibernéticos se utilizam dos mais variados estratagemas para a implementação de seus atos indevidos. Destarte, é claramente perceptível que o sujeito que realiza tais atos de maneira virtual, atua na via estreita de condutas tomadas como típicas, ilícitas (ou antijurídicas) e, via de regra, culpável.

A verdade é que a divulgação, o tráfego e a guarda das informações, sendo muitas delas sigilosas, são caracterizadas como recursos de valor. De acordo com o mestre Gustavo Têsta Correa “A internet é um paraíso de informações, e, pelo fato de essas serem riqueza, inevitavelmente atraem o crime. Onde há riqueza, há crime."

Pelo fato de a internet ser relativamente recente, dada a história da evolução da tecnologia desde os primórdios, muito se tinha em mente que os infratores seriam pessoas mais jovens, com conhecimentos virtuais mais apurados.

Entretanto, se tem percebido que as infrações cometidas, em sentido lato sensu, não têm relação direta com a idade do infrator, sendo que uma simples divulgação de notícia falsa (fake news) é perfeitamente caracterizada como uma infração virtual. Logo, não há como estigmatizar quaisquer tipos de perfis para os referidos infratores, não havendo em se falar em idade, condição social ou gênero, dentre outros atributos.

 

3.3 Compatibilização dos limites éticos com as condutas ilícitas

Com o fito de conjugar e sintetizar as explanações ofertadas ao longo desta obra e com o intuito de arrematar a problemática sob o prisma das hipóteses apresentadas, é de bom alvitre correlacionar os limites éticos que envolve o mundo virtual com os limites morais e individuais de cada usuário.

Conforme já relatado, a ética refere-se às regras de conduta que são preconizadas por uma determinada classe, cultura ou grupo particular, e aqui pode-se perfeitamente ser aplicada ao ambiente virtual, que pode ser considerado um mundo em que as fronteiras são facilmente ultrapassadas, que se dá mediante uma troca de mensagem instantânea entre um remetente do Brasil à um destinatário da Nova Zelândia, ou entre um bate-papo realizado por um americano com um europeu. Sobre isso, Corrêa (2010, p. 79) discorre:

“O grande problema relacionado aos “crimes” digitais é a quase ausência de evidências que provem contra o autor, a inexistência da arma no local do crime. Uma gloriosa invasão a sistema alheio não deixaria nenhum vestígio, arquivos seriam alterados e copiados, e nenhum dano seria prontamente identificado. Um crime perfeito, sem traços, e, portanto, sem evidências. Justamente por essa qualidade da perfeição há a dificuldade em presumir o provável número desses “crimes”. 

 

É nesse viés que, muito embora haja, sim, diversas normas que se traduzam na eticidade em determinados ambientes virtuais, por outro lado, não se pode deixar de lado a moral individual de cada usuário, podendo, ela sim, a depender da corrupção do caráter e da personalidade, interferir a ponto de o internauta da má índole causar diversas infrações. Assim, a título de exemplo, palavras que nunca se diriam podem ser facilmente digitadas e furtos que nunca ocorreriam no ambiente físico podem se dar de maneira acobertada pelo manto do anonimato. 

“Protegidos pelo anonimato, pessoas com estímulos verdadeiramente escusos movem-se pelos extensos caminhos dos órgãos encarregados da defesa do interesse público, obviando o desempenho efetivo das funções constitucionais” (FERNANDES, 2004, v. 3, n. 27).

O que se tem percebido é que, à despeito das normas de conduta na internet, tem ocorrido uma crescente onda de infrações cibernéticas, pois, ao passo que as riquezas do mundo informático crescem, também aumentam as ilicitudes por pessoas que buscam vantagens indevidas.

Logo, enquanto não houverem normas que sejam mais incisivas e taxativas em consignar as diversas infrações que possam ocorrer no âmbito cibernético, bem como enquanto o próprio usuário (de má índole) não se desvencilhar das máscaras do anonimato na rede,  ainda haverá diversificadas máculas que aos Princípios da dignidade da pessoa humana, da garantia da liberdade de expressão, comunicação e manifestação de pensamento, da proteção da privacidade e, por fim, do sigilo dos dados.

 

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

O presente trabalho teve por escopo analisar o reconhecimento jurídico da eticidade, bem como acerca das infrações em âmbito virtual por meio do ciberespaço. Foram desenvolvidos três capítulos, que tiveram como foco a explanação sobre o contexto histórico e suas indagações filosóficas; os princípios oriundos dos direitos fundamentais aplicáveis ao ciberespaço; e as infrações cibernéticas, bem como a explanação do Marco Civil da Internet, as ilicitudes no ambiente cibernético e, para arrematar, a compatibilização dos limites éticos com as condutas ilícitas.

No decorrer da pesquisa, o maior obstáculo para que houvesse uma abordagem mais penetrada foi o método de pesquisa escolhido, qual seja, o teórico/normativo. Assim, faltaram bases empíricas para a comprovação de algumas facetas lançadas ao longo da pesquisa, já que todos os estudos giraram em torno da teoria.

Contudo, o método de pesquisa constituído foi eficiente para culminar em prováveis soluções para as problemáticas que circundam o polêmico tema dos limites éticos no ciberespaço e suas infrações virtuais, como é o caso de novas legislações mais taxativas. As averiguações foram feitas através de artigos, doutrinas, livros e pela internet.

O objetivo geral lançado à baila neste trabalho foi alcançado com êxito, uma vez que não faltaram documentos capazes de esclarecer os preceitos que circundam cada posicionamento averiguado. De igual forma, os objetivos específicos também obtiveram sucesso na localização de suas prováveis respostas.

Assim, cabe neste ponto uma breve exposição das principais conclusões extraídas ao longo da pesquisa. A verdade é que o simples fato de ter colhido variados dados para esta obra, não é reservado o direito a este acadêmico de trazer julgamentos sobre esses acontecimentos, mas tão somente de descrevê-los.

Identifica-se também a ausência de qualificação e saber específicos por parte de investigadores, legisladores e até mesmo das autoridades legais, para só então assim obter e discernir, formar leis mais específicas e punir os infratores virtuais. A sociedade de forma ampla carece de informações legais sobre as metodologias de aproveitamento da internet e de suas limitações. O ordenamento jurídico deve se manifestar de forma proporcional à velocidade de evolução tecnológica.

A inovação contínua do nosso sistema jurídico, acrescido aos recursos de precaução e por último os de contenção dispõe que a criação de um direito próprio não se faz necessário, mas sim uma classificação específica a fim de tratar tais condutas infracionais.

Vale ressaltar que os bens de natureza jurídica tutelados pelo Estado não podem ser prejudicados, portanto, o próprio Estado não pode permitir que isso ocorra. Logo, o Governo pode contrapesar, sempre que necessário para manter a ordem social, acompanhar o crescimento da internet, bem como criar instrumentos normativos que evitem o avanço das infrações virtuais.

É imperioso destacar que é de suma importância haver denúncias em combate aos crimes virtuais. Atualmente, é possível realizar denúncias por meio do uso através da própria internet. Assim, conclui-se que feitura deste trabalho foi de grande valia, uma vez que instigou a pesquisa e a busca de informações adquiridas ao longo dos anos de graduação. Destarte, serviu para quebrar paradigmas e preconceitos do acadêmico no que diz respeito a alguns conceitos sobre as relações tratadas aqui.

 

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Como citar o texto:

CARNEIRO, Raike Peres; MIRANDA, Wellington Gomes; CARDOSO, Ila Raquel Mello..Limites éticos no ciberespaço: infrações virtuais. Boletim Jurídico, Uberaba/MG, a. 18, nº 981. Disponível em https://www.boletimjuridico.com.br/artigos/direito-e-internet/10207/limites-eticos-ciberespaco-infracoes-virtuais. Acesso em 5 jun. 2020.

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