Introdução
A usucapião compreende-se como sendo uma forma de aquisição da propriedade pela posse prolongada, isto é, a Lei permite que aquele indivíduo que esteja em domínio daquele bem por um intervalo de tempo se transforme em proprietário, ou seja, titular do bem. Entretanto, ao longo do artigo, você verá que não é qualquer posse que leva à usucapião.
O procedimento de regularização desse imóvel que sofreu a usucapião pode ser extrajudicial, o que significa que pode ser feito por meio de um cartório, com o tabelião.
Você verá também o que o Novo Código de Processo Civil trouxe de novidade, além de seus requisitos e funcionamento.
1. O que é usucapião extrajudicial?
A usucapião se entende por ser o modo originário de aquisição da propriedade de bens móveis, imóveis dentre outros direitos reais pelo decorrer do tempo desde que sejam atendidos as condições legais.
Ela é originária porque não há relação entre o antigo e o novo proprietário, não existindo nenhum vício ou defeito no ato da aquisição de posse. Além da conquista da propriedade, obtém-se também, os direitos reais, isto é, se tiver ônus, como no caso por exemplo, da hipoteca, recairão sobre o novo proprietário.
Para a usucapião, existem dois fundamentos jurídicos, o primeiro é a função social da posse e o segundo, a regularização ou juridicidade de situações fáticas consolidadas.
Por exemplo, se uma pessoa possui uma propriedade por um período temporal e dá função social daquela propriedade, isto é, se ele habita com sua família, se trabalha ou se habita e trabalha, dependendo do tipo e do tamanho do imóvel, tal situação, este cidadão poderá, por meio da usucapião, vir a regularizar a sua posse.
Em outras palavras, a usucapião é uma forma de adquirir um bem através da posse prolongada. A forma extrajudicial ocorre em virtude de o procedimento ser realizado em cartório.
2. Quais são as modalidades de usucapião?
1. Ordinária
Os possuidores de boa-fé, por sua vez, dotados de justo título, sob o amparo do antigo Código Civil, podiam usucapir imóvel, no prazo de 10 anos entre os presentes e de 20 anos entre ausentes, desde que titulares de posse contínua e incontestada, consoante os termos da norma estabelecida no Art. 551 do CC.
Da mesma forma como ocorreu em relação a usucapião extraordinária, o novo Código Civil, em seu Art. 1.242, reduziu o prazo de 10 anos para a usucapião ordinária.
O prazo só será reduzido se o imóvel tiver sido adquirido onerosamente, com base no registro do cartório, cancelado posteriormente, desde que os possuidores estiverem estabelecidos, no imóvel, a sua moradia ou realizado investimentos de interesse social e econômico.
2. Extraordinária
É denominada extraordinária, pois são dispensados o justo título e a boa-fé. Sendo assim, a origem da posse na violência ou na clandestinidade, quando cessarem, autorizam essa espécie de usucapião.
Para a aquisição, por usucapião extraordinário, o Código Civil exige o prazo de 15 anos. Todavia, se o possuidor tiver utilizado o imóvel para sua moradia habitual ou tiver investido no imóvel realizando obras ou serviços de caráter produtivo, como por exemplo, plantações e construção de uma fábrica, o prazo será reduzido para 10 anos.
3. Rural
Trata-se de uma modalidade de usucapião especial trazida pela Constituição Federal. Nesta modalidade são exigidos os seguintes requisitos: posse mansa e pacífica, sem oposição; período temporal de 5 anos; que o possuidor aja como se dono fosse, mas aqui acrescenta a necessidade de o possuidor ou a sua família torne a propriedade produtiva e que o imóvel rural não ultrapasse a 50 hectares.
O Art. 191 da Constituição Federal dispõe que: “Aquele que, não sendo proprietário de imóvel rural ou urbano, possua como seu, por cinco anos ininterruptos, sem oposição, área de terra, em zona rural, não superior a cinqüenta hectares, tornando-a produtiva por seu trabalho ou de sua família, tendo nela moradia, adquirir-lhe-á a propriedade”.
4. Especial urbana
O art. 183 da Constituição Federal, o art. 9º do Estatuto da Cidade e o art. 1.240 do Código Civil em vigor disciplinaram tal modalidade de usucapião, estabelecendo este último que: “Aquele que possuir como sua área urbana até duzentos e cinqüenta metros quadrados, por cinco anos ininterruptamente e sem oposição, utilizando-a para sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o domínio, desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural”.
Os requisitos para a usucapião especial urbana são, portanto, área urbana máxima de 250m², à utilização como moradia, a posse tranquila e sem oposição e não possuir o requerente outro imóvel.
A área a que se refere a norma abrange o terreno e eventual construção sobre ele erguida, ante o conteúdo do art. 9º. do Estatuto da Cidade.
Quando a posse é exercida sobre área superior a 250m², não é possível a aquisição da propriedade através da usucapião especial urbana, ainda que o pedido restrinja a dimensão do que se quer usucapir.
3. Como funciona a usucapião extrajudicial no Novo CPC?
O Novo Código de Processo Civil trouxe como novidade a possibilidade de processar a usucapião através da via extrajudicial, seguindo a tendência de desjudicialização presente no direito brasileiro.
Além de outros procedimentos extrajudiciais, como o divórcio e o inventário, por exemplo, abrindo dessa forma, oportunidade para um novo tipo de advocacia, desprendida do aspecto litigioso, que é a advocacia extrajudicial.
O Artigo 1.071 do Novo Código de Processo Civil adicionou à Lei de Registros Públicos (Lei 6.015/73) o artigo 216-A, como mencionado acima.
Esta diretriz criou a possibilidade do reconhecimento extrajudicial da usucapião, isto é, sem precisar de um processo judicial, que geralmente é demorado. Vale ressaltar que este procedimento é opcional e, se a parte quiser, pode optar pela via judicial.
O procedimento será processado diretamente perante o cartório do registro de imóveis da comarca em que estiver situado o imóvel usucapiendo, a requerimento do interessado, representado por um advogado, este que é obrigatória sua presença.
Esse procedimento, por sua vez, seguirá as normas extrajudiciais de cada tribunal, podendo ter mais ou menos etapas. Normalmente, os documentos são protocolados fisicamente nos cartórios, e o procedimento segue internamente, por meio de softwares jurídicos ou de gestão, próprios para esses órgãos.
4. Quem pode requerer a usucapião extrajudicial?
A usucapião extrajudicial pode requerer tanto as pessoas naturais, como as pessoas jurídicas. Existe uma observação importante que é: o espólio não pode postular o reconhecimento extrajudicial da usucapião.
Já em relação ao falecido, ou seja, o possuidor, seus herdeiros o sucedem na posse, cabendo a eles alegar a “sucessio possessionis”, ou seja, a aquisição da posse pelo direito hereditário.
Nesse sentido, a lei diz que o pedido de reconhecimento da usucapião pode ser feito pelo “interessado”. Entretanto, nem sempre o interessado será o possuidor atual, porque a aquisição pode ter ocorrido anteriormente, quando do preenchimento dos requisitos legais, a despeito de, na atualidade do requerimento, o interessado não ter a posse do imóvel.
5. Quais os requisitos para a usucapião extrajudicial?
Para a consumação da usucapião, constituem alguns requisitos, que são:
- a coisa hábil ou suscetível de usucapião: Inicialmente, deve ser verificado se a coisa é suscetível de usucapião, posto que os bens fora do comércio e os bens públicos não se sujeitam a esta forma de aquisição de propriedade.
- a posse: A posse é fundamental para a caracterização da prescrição aquisitiva, entretanto, não é qualquer posse que a configura, pois a Lei, nos artigos 1.238 a 1.242 do CC, exige que a mesma seja revestida de algumas características, isto é, deverá ser revestida com o ânimo de dono, ser mansa e pacífica, ou seja, sem oposição, cabendo ressaltar que a defesa desta posse em juízo contra terceiros não retira essa característica, desde que fique configurado o ânimo de dono e, por fim, deverá ser contínua, sem interrupção, ficando proibida a posse em intervalos, sendo que ela deve estar conservada durante todo o tempo que antecede o ajuizamento da ação de usucapião.
- o decurso do tempo: Com relação ao decurso do tempo, frisa-se que este é contado por dias e não por horas, iniciando-se ao dia seguinte ao da posse. Sendo assim, não conta o primeiro dia, mas conta o último.
- o justo título e a boa-fé: O justo título é aquele que seria hábil para transmitir o domínio e a posse se não existir nenhum vício que impeça tal transmissão e a boa-fé ocorre quando o possuidor não tem conhecimento de que a coisa é viciada, ou seja, possui obstáculo que impede a sua aquisição, devendo a mesma existir desde o começo da posse até o fim do decurso do prazo prescricional aquisitivo.
Sendo que os três primeiros itens são requisitos necessários para todas as espécies, enquanto o justo título e a boa-fé são requisitos somente da usucapião ordinário.
6. Quais os documentos necessários no procedimento de usucapião extrajudicial?
Segundo o Art. 216-A da Lei de Registros Públicos, para que seja processado um pedido de usucapião extrajudicial os documentos que são necessários são:
- Ata notarial de posse: Esta ata, lavrada por tabelião, atesta qual é o tempo de posse da pessoa no imóvel. Pode ser acrescentado, para completar o tempo necessário, em alguns casos, o tempo de posse dos antecessores.
- Planta e Memorial descritivo: Esses documentos são necessários para mensurar a dimensão do imóvel. A Planta representa uma vista superior da base do imóvel e no seu entorno e o memorial descritivo mostra as medidas e coordenadas geográficas do imóvel, além de outros dados técnicos.
- Certidões negativas: Deverão ser obtidas na comarca do imóvel.
- Justo título: O justo título é aquele que comprova a posse do imóvel. Podemos citar como exemplos, um contrato de compra e venda, uma declaração de posse, o pagamento de taxas e impostos do imóvel, bem como outros diversos documentos que liguem o possuidor ao imóvel.
7. Quando optar pela usucapião extrajudicial?
Quando o requerente reúne todos os documentos elencados nos inciso do Art 216-A, é possível optar pelo usucapião extrajudicial.
Segundo o § 15 do Art. 216-A, caso não exista justo título, a posse e os demais dados necessários poderão ser comprovados através de um procedimento de Justificação Administrativa perante o próprio cartório.
8. Conclusão
A usucapião extrajudicial veio para diminuir a quantidade ações judiciais, além de contribuir para desafogar o Judiciário, evita que advogados e clientes esperem anos e anos pela solução do seu problema jurídico. Afinal, sabemos quanto tempo demora um processo na via judicial.
A redução dos prazos e da rigidez dos requisitos de todas as modalidades de usucapião encontra-se em harmonia com o princípio constitucional da função social da propriedade, beneficiando aquele que nela instala sua moradia ou implanta obras ou serviços.
Na verdade, a própria natureza do instituto tem finalidade social, destinando-se a legitimar o patrimônio dos economicamente excluídos e, assim, estabelecer um equilíbrio coletivo.
Entretanto o processo de usucapião ainda é excessivamente moroso e não reflete os efetivos anseios da sociedade e do legislador, cabendo ao Poder Judiciário e ao Ministério Público a implementação da eficácia de tais normas, a fim de que efetivamente garantam a paz social.
Data da conclusão/última revisão: 15/03/2021
Tiago Fachini
Gestão de Marketing Estratégico na Univille (2006 a 2008); MBA em Marketing na Sustentare Escola de Negócios (2011 a 2012). Gerente de marketing e colunista do Blog ProJuris, palestrante, professor, podcaster jurídico e, acima de tudo, um apaixonado por tecnologia e pelo mundo jurídico com mais de uma década de atuação dedicada ao mundo digital.
Código da publicação: 10987
Como citar o texto:
FACHINI, Tiago..Usucapião Extrajudicial no Novo CPC: Funcionamento e requisitos. Boletim Jurídico, Uberaba/MG, a. 19, nº 1024. Disponível em https://www.boletimjuridico.com.br/artigos/direito-notarial-e-registral/10987/usucapiao-extrajudicial-novo-cpc-funcionamento-requisitos. Acesso em 31 mar. 2021.
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