Considerações sobre o Estudo do Direito
I) Introdução
A Lei de Introdução ao Código Civil – Decreto-lei nº 4.657, de 1942, também conhecida como lex legum, é uma sobrenorma do ordenamento jurídico pátrio. Esta norma vem regulamentar as fontes do direito, a aplicação das leis no tempo e no espaço, bem como sua interpretação.
II) Conceito de Direito
Direito é o conjunto das normas estabelecidas pela sociedade que regem as ações humanas e seus efeitos e que têm caráter de sanção.
A essência do direito é a busca do justo e ele se norteia pela:
- justiça comutativa – tem por finalidade a busca da igualdade simples em que um indivíduo confere ao outro aquilo que lhe é devido;
- justiça distributiva – tem por finalidade a busca da igualdade proporcional em que um indivíduo confere ao outro dentro de sua possibilidade aquilo que lhe é devido segundo uma igualdade proporcional à sua necessidade;
- justiça social – tem por finalidade a busca do bem comum da sociedade.
Espécies:
- direito objetivo/norma agendi – norma positivada estática;
- direito subjetivo/facultas agendi – subsunção da norma positivada estática ao caso concreto dinâmico.
O objeto do direito é a norma de conduta, cujos elementos são:
- preceito normativo primário – imposição, proibição e permissão de um comportamento, também conhecido como modais deônticos;
- preceito normativo secundário – sanção em decorrência da violação do preceito primário.
III) Fontes do Direito
No caso de anomia ou ausência de norma o sistema integrativo foi adotado pelo art. 4º LICC pelo qual o intérprete deve fazer uso da analogia, costumes e princípios gerais de direito.
As fontes de Direito são:
1) Lei – fonte primária- preceito jurídico escrito e formal que tem as seguintes características: generalidade/caráter geral, obrigatoriedade, imperatividade/observância é imposta pelo Estado e coersibilidade/imposição de sanção.
No caso de antinomia/conflito de normas adota-se um dos critérios:
- hierarquia – a lei superior revoga a inferir - aplicam-se as normas constitucionais, depois as normas legais (entre a lei ordinária a lei complementar há campos materiais diferenciados de competência) e finalmente as normas infra-legais;
- especialidade – a lei especial revoga a geral – aplicam-se as normas menos amplas e depois as mais amplas;
- cronologia – a lei permanente(tem prazo de vigência indeterminado) posterior revoga a anterior.
2) Analogia – fonte secundária – trata-se de aplicação de uma norma que trata de um caso que tenha um motivo semelhante a outro caso para o qual não há norma que o regule de modo direto.
3) Costume– fonte secundária – norma aceita obrigatoriamente pelo consciente coletivo. Pode ser:
- contra legem – desobediência reiterada de um comando legal com a crença da inefetividade da lei;
- praeter legem – conduta que não prevista e que não é proibida por lei;
- secundum legem – previsão dada pela própria lei em que delega ao costume a solução do caso.
4) Jurisprudência– fonte secundária –decisão do Poder Judiciário reiterada em um mesmo sentido sobre uma mesma matéria. A súmula vinculante deve ser obrigatoriamente observada (art. 103-A CF). Também as decisões em Ação Direta de Constitucionalidade e Ação Direta de Inconstitucionalidade devem ser obrigatoriamente observadas (§ 2º art. 102 CF). Além disso, devem ser obrigatoriamente observadas as resoluções do Senado Federal que suspendam a execução da lei declarada inconstitucional em recurso extraordinário (inc. X art. 52 CF).
5) Doutrina– fonte secundária – conjunto dos estudos dos cientistas do Direito;
6) Princípios gerais de direito - fonte secundária – postulados expostos no ordenamento jurídico implícita e explicitamente;
7) Brocardos Jurídicos – fonte secundária – frases concisas de fácil memorização que encerram uma verdade jurídica.
IV) Aplicação da Lei no Tempo
Princípios:
- obrigatoriedade – uma norma publicada é obrigatória a todos e ninguém pode alegar a sua ignorância;
- continuidade – a norma permanente somente perde sua eficácia se outra vier a modificá-la ou revogá-la expressa ou tacitamente;
- irretroatividade – a lei não pode retroagir para modificar situações jurídicas já consolidadas por lei anterior, tendo em vista a segurança jurídica.
Vacatio Legis
A vacatio legis é o lapso temporal entre a publicação da lei e a sua entrada em vigor. No Brasil adota-se o sistema sincrônico/simultâneo em que a lei entra em vigor na mesma data e em todo território nacional (art. 1º LICC).
Espécies:
- lei com vacatio legis expressa – aquela que tem expressamente dispõe sobre o período (art. 8º da Lei Complementar nº 95 de 1998);
- lei com vacatio legis tácita – aquela começa a vigorar no Brasil 45 dias depois de oficialmente publicada (art. 1º LICC);
- lei sem vacatio legis - aquela que começa a vigorar na data de sua publicação, dispositivo que deve estar expresso no final do seu texto.
Contagem da vacatio legis
A contagem do prazo para a entrada em vigor das leis que estabeleçam período de vacância far-se-á com a inclusão da data da publicação e do último dia do prazo, entrando em vigor no dia subseqüente à sua consumação integral (art. 8º da Lei Complementar nº 107, de 2001).
Errata:
- erro irrelevante - a lei não precisa ser corrigida;
- erro substancial antes da publicação - a lei pode ser corrigida;
- erro substancial no período da vacatio legis- a lei pode ser corrigida e deve ser contado novo período de vacatio legis em relação à parte alterada;
- erro substancial depois de entrar em vigor – a lei pode ser corrigida mediante a edição de nova lei que a revogue;
Revogação da Norma
1) Formas:
- expressa – a nova norma expressamente determina a revogação da anterior;
- tácita - a nova norma seja incompatível com a anterior;
2) Modalidades
- ab-rogação – revogação total;
- derrogação – revogação parcial;
3)Critérios:
- hierárquico – verificar qual norma é superior: norma constitucional, norma legal e norma infralegal, independentemente da data de vigência;
- cronológico – em sendo do mesmo nível hierárquico, verificar a norma que entrou em vigor por último;
- especialidade – as normas especiais revogam as normas especiais revogam as normas gerais.
A não repristinação da norma é a regra no ordenamento jurídico do Brasil, pois uma vez revogada, a lei não volta a vigorar pela simples revogação de sua norma revogadora. Admite-se, entretanto a restauração da norma revogada, desde que a nova norma o faça expressamente e em sua totalidade.
Conflitos da Lei no Tempo
O direito adquirido – cláusula pétrea - aquele que se incorporou definitivamente ao patrimônio e à personalidade de seu titular – não prevalece sobre normas constitucionais e tem o efeito de retroagir normas administrativas, processuais, de estado, de capacidade e penalmente mais benéficas.
Espécies de Direito Adquirido:
1) Ato Jurídico Perfeito – ato que tem aptidão de produzir efeito:
- instantâneo – aquele que produz efeito no momento do seu nascimento;
- diferido – aquele que produz efeito no momento único e concretiza-se posteriormente;
- de trato sucessivo ou de execução continuada - aquele que produz efeito periodicamente;
- condicional - aquele que para produzir efeito depende de evento futuro e incerto.
- termo - - aquele que para produzir efeito depende de evento futuro e certo.
2) Coisa Julgada – qualidade do efeito da decisão, no sentido de torná-la imutável; a coisa soberanamente julgada é aquela que não mais pode ser alterada por ação rescisória.
V) Aplicação da Lei no Espaço
No Brasil adota-se o sistema sincrônico/simultâneo em que a lei entra em vigor na mesma data e em todo território nacional (art. 1º LICC).
Princípios:
1) Territorialidade - em regra, a norma brasileira tem aplicação no território em razão da soberania do Brasil;
2) Extraterritorialidade moderada – excepcionalmente a norma brasileira pode ser aplicada no estrangeiro, tais como:
- embaixadas e consulados;
- as embarcações e aeronaves brasileiras de natureza pública ou a serviço do governo brasileiro em serviço militar ou oficial onde quer que se encontrem;
- as aeronaves e as embarcações brasileiras, mercantes ou de propriedade privada, que se achem, respectivamente, no espaço aéreo correspondente ao alto-mar ou em alto-mar.
Excepcionalmente a norma estrangeira pode ser aplicada no Brasil, tais como:
- tratados internacionais;
- estatuto pessoal – lei do domicílio - a lei do país em que a pessoa for domiciliada é que determina as regras sobre o começo e o fim da personalidade, o nome a capacidade e os direitos de família (art. 7º LICC).
VI) Hermenêutica Jurídica
A hermenêutica jurídica é a interpretação da norma jurídica por meio dos princípios (valores tutelados pelo ordenamento jurídico) e regras (normas positivadas no ordenamento jurídico). A exegese é a aplicação dos princípios e regras de hermenêutica.
1) Espécies de Interpretação
- gramatical - busca o significado literal da norma;
- lógica – busca o significado da norma no sistema;
- histórica – busca o significado da norma pelo legislador;
- teleológica - busca o significado da norma adaptando-a ao contexto social.
2) Sistemas de Interpretação
- livre pesquisa – busca o bem comum;
- dogmático – busca o significado da lei;
- histórico-evolutivo – busca o sistema jurídico.
3) Passos de Interpretação e Integração
- aplicação das espécies de interpretação;
- aplicação da analogia, costumes, doutrina, jurisprudência e princípios gerais de direito.
4) Resultado da Interpretação
- declarativo – a lei disse exatamente o que pretendia em seu texto;
- restritivo - a lei disse mais do que pretendia em seu texto;
- extensivo - a lei disse menos do que pretendia em seu texto.
VI) Conclusão
A Lei de Introdução ao Código Civil, como lex legum, é aplicável a todo ordenamento jurídico pátrio.
As fontes do Direito são a lei, a analogia, o costume, a jurisprudência, a doutrina, os princípios gerais de direito e os brocardos jurídicos.
A aplicação das leis no tempo tem como princípios a obrigatoriedade, a continuidade e a irretroatividade e deve observar os critérios da vacatio legis. A revogação pode ser expressa, tácita, parcial e total, sendo que a não repistinação é a regra, salvo quando for expressa. No caso de conflito no tempo, deve-se observar o direito adquirido.
A aplicação das leis no espaço segue em regra a territorialidade e como exceção a extraterritorialidade.
As leis podem ser interpretadas pelas espécies gramatical, lógica, histórica e teleológica, tem como sistemas a livre pesquisa, o dogmático e o histórico, e o resultado pode ser declarativo, restritivo e extensivo.
VII) Bibliografia:
GONÇALVES, Carlos Roberto. Sinopses Jurídicas Direito Civil Parte Geral. São Paulo: Saraiva, 2003.
MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de Direito Civil. São Paulo: Saraiva, 2003.
(Elaborado em Fevereiro de 2006)
Carmen Ferreira Saraiva
Bacharel em Direito pela Faculdade Milton Campos/MG; Especialista em Direito Tributário pelo Instituto de Educação Continuada - IEC PUCMINAS - Belo Horizonte/MG.