Defesa prévia: breves considerações
CONSIDERAÇÕES INICIAIS
Sabe-se que no Processo Penal há várias espécies de procedimentos, cada um deles se constituindo em uma seqüência ordenada de atos, que são a forma como a atividade processual se desenvolve. No procedimento comum ordinário, na fase da instrução criminal, após o interrogatório, temos a defesa prévia (ou alegações preliminares), que se constitui no objeto do presente trabalho de pesquisa.
1. Generalidades
A defesa prévia é uma peça processual, através da qual o réu apresenta suas alegações preliminares. Tal peça pode ser apresentada logo após o interrogatório, ou no prazo de 3 dias. Esse prazo é fatal, pois o não é aceito oferecimento intempestivo. O STJ assim se pronunciou acerca do tema:
“Processual Penal – Defesa Prévia fora do prazo – Indeferimento. Expirado o prazo de três dias, não é de admitir-se a chamada defesa prévia, sendo legal o indeferimento do pedido em relação à mesma. Recurso improvido”. (STJ – RHC – Rel. Anselmo Santiago – RSTJ 55/306).
Este prazo de três dias, conhecido como tríduo, cria divergência na jurisprudência, no que toca à forma de contagem do mesmo. A jurisprudência minoritária considera que o tríduo deve ser contado a partir da intimação do defensor. Já a jurisprudência majoritária entende que o mesmo é contado a partir do interrogatório. É o que se observa abaixo:
“Fluindo os prazos a partir da intimação, salvo casos expressos (art. 798, §5º, a, do CPP), e não existindo ressalva alguma no art. 395 do CPP, segue-se que é necessária a intimação do defensor indicado pelo réu no interrogatório para que se possa ter como iniciado o prazo de defesa prévia”. (TJSP – HC – Rel. Prestes Barra – RT 595/332).
“A defesa prévia é faculdade, alternativamente, do réu ou do seu defensor, e o respectivo prazo se abre independentemente de intimação do réu ou de seu defensor”. (TACRIM-SP – HC – Rel. Ítalo Galli (designado) – JUTACRIM-SP 32/76)
2. Importância da defesa prévia
Através da defesa prévia, o acusado apresenta alegações escritas, requer diligências e apresenta rol de testemunhas. Para tanto, o advogado deve ser intimado a apresentar a defesa prévia, sob pena de cerceamento de defesa e conseqüente nulidade. A jurisprudência versa neste sentido:
“Defesa Prévia – Falta de intimação do defensor ausente ao auto de interrogatório – Cerceamento de defesa – Nulidade – Ocorrência. A falta de intimação do defensor, constituído ou não, ausente ao ato do interrogatório, para cientificá-lo do prazo para oferecimento da defesa prévia, acarreta a nulidade do processo por cerceamento de defesa”. (TACRIM – SP – AP – Rel. José Santana – RJD 13/60).
Assim ocorre nulidade de todos os atos posteriores pois, não obstante a defesa prévia ser uma peça facultativa, o juiz deve notificar o advogado constituído ou dativo para apresentá-la. O que anula o processo é a falta de concessão do prazo para o defensor apresentar a defesa prévia.
2.1. Alegações escritas
As alegações escritas constituem a defesa propriamente dita. É quando o acusado tem a oportunidade de apresentar suas teses de defesa, negar autoria ou materialidade, etc. É corolário dos princípios constitucionais do contraditório e da ampla defesa, pois após o Ministério Público (ou o querelante) apresentar sua peça inaugural, acusatória, tem o acusado a possibilidade de se defender.
O doutrinador Paulo Rangel (RANGEL, Paulo. Direito Processual Penal. Ed. Lumen Juris. 9ª Edição. Rio de Janeiro: 2005, pág.: 478) aconselha que “...a defesa não deve, na defesa prévia, esmiuçar sua tese defensiva, mostrando ao Ministério Público sua bateria de provas, pois o ato de recebimento da denúncia já ocorreu e de nada adianta agora uma profunda contestação...”. Interessante notar que a jurisprudência também versa nesse sentido:
“Defesa Prévia. A defesa é imprescindível resultante do princípio do contraditório; todavia, não se faz necessária prolixidade, podendo, taticamente, o advogado reservar argumentos para argüição a final”. (TJDF – AP 3,072 – Rel. Luiz Vicente Chernicchiaro – DJU 5/04/89, p. 2.646).
2.2. Requerimento de diligências
Outra função desta peça processual é requerer as diligências que serão realizadas no curso do processo, caso o juiz as defira. É fundamental que a defesa requeira tais diligências na defesa prévia, sob pena de operar preclusão temporal. Ou seja, não ser-lhe-á lícito requerer tais diligências após o tríduo para a defesa prévia.
Cabe ressaltar que a referida preclusão ocorre somente em relação às diligências, pois documentos podem ser oferecidos em qualquer fase do procedimento (art.400 CPP).
Sobre o deferimento ou não das diligências requeridas, é o juiz que aquilata se elas realmente são necessárias. Portanto, o indeferimento das diligências requeridas não significa, em regra, cerceamento de defesa. A propósito, diz a jurisprudência:
“Cerceamento de defesa – indeferimento de diligência na fase do art. 499 do CPP – Livre arbítrio do juiz para deferir ou não a prova requerida - Inexistência de prejuízo para o réu. Indeferimento de diligência na fase do art. 499 do CPP não é molde a configurar o cerceamento de defesa, pois o julgador tem o livre deferimento para deferir a prova requerida. Se assim não fosse, a instrução prolongar-se-ia no tempo, indefinidamente”. (TRF 3ª Reg. – AP – Rel. Roberto Haddad – RT 739/707).
2.3. Rol de testemunhas
No procedimento comum ordinário, a defesa apresenta, na defesa prévia, o rol de testemunhas que pretenda que sejam ouvidas. O art. 398 do CPP estatui que, na fase instrutória, serão inquiridas no máximo 8 testemunhas, não se compreendendo neste número as que não prestarem compromisso e as referidas.
No procedimento sumário, a defesa pode arrolar até 5 testemunhas. No procedimento da lei de entorpecentes (Lei 6.368/76) também pode-se arrolar até 5 testemunhas.
3. Dispensabilidade da defesa prévia
Ponto a ser ressaltado é a dispensabilidade da apresentação da defesa prévia. O art. 395 do CPP é claro ao afirmar que o réu ou seu defensor poderá apresentar defesa prévia.
Desta feita, se a referida peça processual não for oferecida oportuno tempore, ocorrerá preclusão (objetivamente é o impedimento de que o procedimento retorne a fases já ultrapassadas; subjetivamente é a perda da possibilidade de praticar determinado ato após o prazo) e o juiz procederá ao próximo ato, que é a oitiva das testemunhas de acusação.
Indispensável é que a defesa seja intimada a apresentar a defesa prévia. Se tal não ocorre, estar-se-á diante de cerceamento à defesa, havendo nulidade dos atos posteriores. Cabe ressaltar, que as alegações finais, estas sim, são obrigatórias, conforme a jurisprudência nos mostra, acarretando, inclusive, na nomeação de outro advogado, para oferta-las:
“Alegações finais – Ausência de apresentação – Efeitos – Intimação do réu para constituição de novo defensor – Necessidade. A ausência de apresentação das alegações finais dá ensejo à intimação do réu, com o fim de constituir novo defensor e, quando não atendida essa providência, é de rigor a nomeação do advogado para prática do artigo sob pena de violação do direito ao exercício da ampla defesa, constitucionalmente assegurado”. (TACRIM-SP – Rel. Ubiratan de Arruda – Rolo-flash 869/324).
“A falta de alegações finais constitui cerceamento de defesa, pois trata-se de termo essencial do processo. Se o defensor constituído se omite, cumpre ao Juiz designar advogado que as apresente”.(TACRIM-SP – AP – Rel. Valentim Silva – JUTACRIM-SP – 56/220).
Tal obrigatoriedade não ocorre com a defesa prévia. Caso não seja oferecida em tempo, opera preclusão temporal.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Por tudo que foi dito, pode-se afirmar que a defesa prévia (alegações preliminares) se constitui em uma peça fundamental, pois é oportunidade para apresentação de defesa técnica, arrolamento de testemunhas e requerimento de diligências. É decorrência dos princípios do contraditório e da ampla defesa (CF, art. 5º, LV).
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Código de Processo Penal Brasileiro – Decreto-lei 3.689/41
Constituição da República Federativa do Brasil - 1988
CÓDIGO de Processo Penal e sua interpretação jurisprudencial / coordenação Alberto Silva Franco, Rui Stoco. Revista dos Tribunais: São Paulo, 1999.
CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal. 10ª Ed., ver. E atual. Ed. Saraiva: São Paulo, 2003
RANGEL, Paulo. Direito Processual Penal. Ed. Lumen Juris.9ª Edição. Rio de Janeiro: 2005
(Concluído em maio/2005)
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Thiago Xavier Bento
Funcionário Público Federal – Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos. Acadêmico do Curso de Graduação em Direito – 4º Ano – Faculdade de Direito de Cachoeiro de Itapemirim.Email: thiago.fdci@bol.com.br